O Ministério Público Eleitoral (MPE) opinou pela continuidade da ação de investigação movida pelo Partido Socialismo e Liberdade (PSOL), que pede a impugnação da candidatura do governador eleito Paulo Hartung (PMDB) por suposto abuso de poder econômico e omissão do patrimônio real na declaração de bens entregue à Justiça Eleitoral. No parecer assinado na última semana, o procurador regional eleitoral, Flávio Bhering, se manifestou pela rejeição das preliminares – espécie de defesa processual prévia – levantadas pelos advogados de Hartung. As questões serão enfrentadas agora pelo relator do caso.
De acordo com informações do Tribunal Regional Eleitoral (TRE-ES), os autos do processo (196412.2014.608.0000) foram encaminhados para o vice-presidente e corregedor-geral da corte, desembargador Sérgio Luiz Teixeira Gama, que vai decidir se aceita ou não as preliminares levantadas pela defesa de Hartung. Caso decida pela manutenção do processo, o relator deverá se pronunciar sobre a produção de provas solicitadas pelo partido político, entre elas, a quebra do sigilo fiscal de Hartung e da mulher, a psicóloga Cristina Gomes, além da abertura das contas da empresa de consultoria Éconos para apurar a suspeita de formação de “caixa dois” eleitoral.
Apesar do processo não ter chegado à fase de instrução, o governador eleito já vem enfrentando desgastes por conta da ação. No parecer do MPE, Flávio Bhering entendeu que a ação movida pelo PSOL como adequada, refutando as alegações do peemedebista que teria questionado a possibilidade jurídica do pedido. No último debate televisivo na campanha, no final de setembro, Hartung declarou que havia tido acesso ao documento – mesmo antes de ser regularmente intimado da ação protocolada no fim do dia anterior – e que a “ação era até equivocada do ponto de vista jurídico”.
No entanto, o procurador regional se manifestou no sentido oposto: “In casu, verifica-se que a [petição] inicial imputa ao candidato prática de conduta vedada pela legislação eleitoral, a omissão dos bens na declaração entregue à Justiça Eleitoral por ocasião da formalização do registro de candidatura e, por fim, a arrecadação antecipada de recursos para a campanha, afetando a igualdade de condição entre os candidatos. Portanto, todos os fatos narrados podem, em tese, ser apurados no bojo da ação de investigação judicial eleitoral. Evidentemente que não se examina, neste momento, a procedência ou improcedência dos fatos articulados pelos autores, mas apenas a adequação dos fatos narrados”, concluiu.
O chefe do MPE também rechaçou a alegação de Hartung de que a ação do PSOL era baseada exclusivamente em reportagens jornalistas – no caso, as denúncias feitas pelo jornal Século Diário ao longo da campanha. “A aferição efetiva e real do interesse de agir levantado implica forçosamente o exame do mérito. Desse modo, as alegações expendidas a título de preliminar devem ser apreciadas quando do exame do mérito, se a ele se chegar”, considerou Flávio Bhering, que solicitou ao relator do caso que o órgão ministerial se manifeste após qualquer decisão futura.
Na defesa prévia, o governador eleito também alegou a suposta inépcia da ação (quando o processo perde efeito) em decorrência da falta de inclusão no caso do ex-secretário da Fazenda, José Teófilo de Oliveira, que também é ex-sócio de Hartung na consultoria Éconos. A defesa entendeu que o ex-secretário deveria ser citado em função de várias imputações ao longo da ação de que ele seria beneficiado direto das práticas supostamente ilícitas. No entanto, o procurador eleitoral citou a jurisprudência do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) que não exige a formação do litisconsorte necessário (partes interessadas ou relacionadas ao fato).
PSOL quer cassação de diploma de eleito
Na petição inicial, o partido pediu a quebra do sigilo fiscal de Hartung e da mulher, Cristina Gomes, para apurar a omissão do patrimônio real do candidato. Também foi solicitada a quebra do sigilo bancário da empresa de consultoria Éconos para apurar a suspeita de formação de uma “caixa dois” eleitoral. No entendimento do partido, a omissão dolosa (intencional) dos bens teve o objetivo de enganar os eleitores, além de provocar um desequilíbrio na disputa com os demais candidatos.
Os representantes do PSOL entendem que Hartung seria obrigado a declarar o patrimônio em nome da ex-primeira-dama – tanto no episódio da “mansão secreta” em Pedra Azul, que foi adquirida pelo casal, mas que não consta na lista de bens do ex-governador, como no caso da empresa familiar (PPG Empreendimentos Imobiliários), aberta no final do governo passado para “gerir” os bens herdados pelo peemedebista. As denúncias foram noticiadas com exclusividade por Século Diário e ganharam repercussão na mídia local e nacional.
No caso da “mansão secreta”, o partido concluiu que o imóvel de luxo foi registrado em cartório por R$ 160 mil, mas que “vale visivelmente milhões de reais”. No entendimento dos autores da ação, a reputação de Hartung seria colocada em xeque, caso o patrimônio fosse declarado pelo peemedebista, podendo influenciar assim na disputa. “Pois é impossível alguém cujos bens declarados não chegam a um milhão de reais, e que ocupou cargo de governador, adquirir uma mansão como essa”, afirmam os representantes do PSOL.
Sobre a participação de Hartung no escritório de consultoria Éconos – em parceria com o ex-secretário José Teófilo –, a sigla denuncia o abuso do poder político e econômico pelo suposto tráfico de influência na defesa de empresas favorecidas pelo governo do Estado, bem como a suspeita de arrecadação antecipada de recursos para campanha eleitoral. Eles citam a revelação da lista de clientes da Éconos, que rendeu R$ 5,8 milhões em pouco mais de três anos de atuação.
Entre os pedidos da ação, o PSOL cobra a declaração da inelegibilidade de Hartung com base em violação à legislação eleitoral. Como o processo será julgado após a eleição, realizado no último dia 5, a sigla pede o imediato afastamento do cargo e/ou a cassação do diploma. O vice-governador eleito César Colnago (PSDB) também figura no processo.