A Polícia Civil terá que permitir o acesso de advogados ao inquérito policial que apura os atos de vandalismo registrados durante os protestos populares em Vitória, no mês de junho. A decisão é do juiz da Vara da Central de Inquéritos da Capital, Marcelo Menezes Loureiro, que atendeu ao pedido de habeas corpus impetrado pela defesa de uma das pessoas convocadas para depor sobre os incidentes. A medida deve abrir caminho para o retorno ao devido processo legal nas investigações, que já foram alvo de polêmicas até mesmo entre os delegados de polícia.
Na decisão assinada nessa terça-feira (1º), o juiz Marcelo Loureiro negou o pedido de liminar para suspender todo o inquérito, porém, ele recorreu a um precedente no Supremo Tribunal Federal (STF) para garantir o acesso dos advogados ao teor das investigações, que seria a verdadeira pretensão do processo: ???A violação em evidência não enseja a suspensão do inquérito policial, uma vez que o Código de Processo Penal não autoriza a suspensão das diligências investigativas. […] Entretanto, valho-me de recente decisão liminar, a qual tratou do mesmo tema e saneou [resolveu] essa problemática???.
Nos autos do processo (0037515-47.2013.8.08.0024), o advogado André Luiz Moreira narra que o delegado da Divisão de Crimes contra o Patrimônio ??? onde correm as investigações ??? teria negado o acesso ao inquérito policial antes do depoimento de seu cliente. Ele justifica o pedido pelo fato de seu cliente ter sido intimado duas vezes, o que poderia colocá-lo sob risco de uma eventual condução coercitiva (quando o depoente é transportado pela autoridade policial) ou até mesmo um pedido de prisão cautelar sob fundamento de ter se negado a colaborar com as investigações.
Para o juiz, a ???insistência??? do delegado em manter a defesa à mercê do conteúdo do inquérito policial merece desagravo. Ele afirmou que não cabe à autoridade policial decidir sobre o que se encontra ou não em segredo de justiça. Marcelo Loureiro criticou o fato de que o inquérito nunca chegou ao Poder Judiciário, ???de sorte que impossível depreender, pelos alfarrábios ou até mesmo em pesquisas nos sistemas virtuais internos desta Corte, do que se trata a referida investigação ou se mesmo a autoridade coatora está em iminência de conduzir coercitivamente o suspeito à prisão???.
Essa foi a primeira decisão desse tipo relacionada às investigações sobre as manifestações populares de junho. O advogado André Moreira comemorou o posicionamento do juiz Marcelo Loureiro, que também buscou uma conciliação no episódio da ocupação da sede da Assembleia Legislativa em julho, por ocasião da votação do projeto que pleiteava o fim do pedágio da Terceira Ponte.
???O juiz havia mostrado sensibilidade naquele episódio e repete o ato de respeito às manifestações populares. Ao antecipar a ordem final [exame do pedido principal] ele garante o restabelecimento do processo legal e vai dar segurança àqueles que vão depor, já que vão saber sobre o quê ou se há qualquer tipo de acusação contra eles???, declarou o causídico, que defende outros quatro militantes.
Polêmicas
Desde o início do inquérito policial ??? identificado como 175/2013 ???, as investigações para apurar os “atos de vandalismo” durante as manifestações do dia 17 de junho é alvo de divergências até mesmo dentro da Polícia Civil. Inicialmente, o caso era conduzido pela Delegacia Patrimonial, porém, a polêmica teve início após a transferência das apurações para o Núcleo de Repressão às Organizações Criminosas (Nuroc), grupo especializado de combate ao crime de colarinho branco.
Segundo reportagens publicadas com exclusividade por Século Diário, fontes ligadas à polícia revelaram que a decisão de levar o caso para o Nuroc foi do secretário estadual de Segurança Pública, André Garcia. A medida teria causado insatisfação entre os delegados do núcleo, que alegavam que este tipo de investigação não se enquadrava nas atribuições do núcleo, voltado a apuração de organizações criminosas e não de pessoas engajadas em movimentos sociais.
Depois da grande repercussão do caso nas redes sociais, a condução do inquérito foi novamente mudada, retornando para a Delegacia Patrimonial, que passou a proceder à oitiva de todas as pessoas suspeitas de terem cometido o crime de depredação de patrimônio público durante os protestos.