Domingo, 05 Mai 2024

Penduricalhos do Ministério Público Estadual foram ilegais, conclui MP de Contas

Penduricalhos do Ministério Público Estadual foram ilegais, conclui MP de Contas

Após mais de um ano de análise pelo órgão, o Ministério Público de Contas (MPC) pediu a devolução de R$ 4 milhões em valores pagos pelo Ministério Público Estadual (MPES) a seus membros de forma ilegal. O procurador de Contas, Heron Carlos Gomes de Oliveira, concluiu que o pagamento dos supostos “penduricalhos legais” – sob a justificativa de restituição de contribuição previdenciária sobre o abono variável – não atendeu à legislação.



No parecer apresentado nessa segunda-feira (14), o procurador indica que o pagamento das restituições, feito em 2006, sequer foi relacionado ao abono variável. O texto aponta que os penduricalhos resultaram da soma de uma série de benefícios, como a incorporação do 11,98% (compensação de perdas da URV), diferença de vencimentos e até de vantagens pessoais – como verbas de representação e gratificações por tempo de serviço.



“O Ministério Público não restituiu as contribuições previdenciárias incidentes sobre o abono variável, pois sobre essa verba indenizatória não incidiram tributos. O MPES, em verdade – com recursos financeiros próprios – antecipou a seus membros valores que não possuem relação com o abono variável, haja vista que, até prova em contrário, as contribuições previdenciárias recolhidas normalmente ao IPAJM, entre outubro de 1998 e junho de 2002, ainda se encontram sob a guarda dessa autarquia”, concluiu.



Entre janeiro de 2003 e dezembro de 2004, o Ministério Público capixaba efetuou o pagamento de R$ 43,68 milhões a título de abono variável aos seus membros ativos, aposentados e pensionistas. Esses valores tinham sido disciplinados pela Resolução nº 245 do Supremo Tribunal Federal (STF), que não previu a incidência de qualquer tributo. No entanto, o órgão deu um jeitinho para a continuidade dos benefícios.



No ano seguinte, o então chefe do MPES, o hoje desembargador José Paulo Calmon Nogueira da Gama, iniciou a movimentação nos bastidores para a suposta restituição da contribuição previdenciária – comprovadamente inexistente no pagamento do abono variável. O total dos desembolsos atingiu a marca de R$ 4,052 milhões no dia 30 de março de 2006, na véspera das eleições internas no MPES.



De acordo com o procurador, o valor teria saído dos cofres da instituição, mesmo após o acordo entre a cúpula do MPES com o então governador Paulo Hartung (PMDB) para a liberação de recursos extra-orçamentários para o MP estadual: “Como não houve restituição por parte da autarquia previdenciária, que, inclusive indeferiu o requerimento formulado pelo parquet estadual, conclui-se que o valor repassado pelo Poder Executivo ao MPES não se referiu à devolução do indigitado tributo”, disse Heron.



Judiciário deu vazão às ilegalidades 



No parecer do órgão auxiliar do Tribunal de Contas do Estado (TCE), o procurador Heron de Oliveira também relata fatos que demonstram que o Poder Judiciário local deu suporte para as ilegalidades, inclusive, com a concessão de medidas liminares de última hora. Um dos casos mais expressivos ocorreu logo após o pagamento dos R$ 4 milhões de uma só tacada para os membros do MPES.



Mesmo sem citar expressamente a ligação entre os episódios, o procurador demonstra que os envolvidos na transação – o ex-procurador-geral José Paulo Calmon Nogueira da Gama e a ex-sub-procuradora Heloísa Malta Carpi – utilizaram de uma decisão judicial para ratificar os pagamentos ilegais. Fato que levanta dúvidas sobre a existência de uma manobra para a criação de novos penduricalhos.



No dia 19 de abril daquele ano, a procuradora Heloísa Carpi determinou a adoção de providências para que os membros do MPES devolvessem os valores recebidos há duas semanas antes por ordem dela própria.



Contudo, a juíza da 1ª Vara dos Feitos da Fazenda Pública Estadual, Heloísa Cariello, concedeu uma medida liminar – em um processo ajuizado pela Associação Espírito-Santense do Ministério Publico (Aesmp) em dezembro de 2004, mas que sequer tinha qualquer movimento processual até aquele momento – que permitiu a suspensão do ato que pedia a devolução do dinheiro.



Da mesma forma que o Ministério Público, os membros do Poder Judiciário também gozaram dos mesmos benefícios. Entretanto, a única “prestação de contas” que havia ficado pendente envolvia o hoje desembargador José Paulo Calmon Nogueira da Gama, que não deve ser implicado nas fraudes.



Apesar de concluir pela ilegalidade dos pagamentos e sugerir que o plenário do TCE determina a devolução dos recursos ao atual procurador-geral de Justiça, o parecer não prevê a responsabilização do ex-procurador e hoje magistrado. No texto, Heron de Oliveira afirma que os atos praticados pelo então chefe do Ministério Público não permitiriam concluir pela sua implicação pelos pagamentos indevidos.



Melhor sorte não teve a sua subprocuradora Heloísa Carpi, que assinou o ato de pagamento dos “penduricalhos ilegais” e o mal fadado pedido de providência para a devolução dos recursos, que obviamente nunca ocorreu. Sobre a conduta da chefe do MPES em exercício no período em que antecedeu a reeleição de Nogueira da Gama, o procurador de Contas recomendou a aplicação de multa em função da antecipação de valores sem o devido respaldo legal. 



Impedimento de conselheiro fica de fora 



Segundo informações do TCE, o parecer será encaminhado para o relator do caso, conselheiro Sérgio Aboudib, que não teve o possível impedimento de atuar no processo analisado dentro do texto. “Apesar do nome do conselheiro figurar na liberação de valores ao Ministério Público [na época em que era secretário da Casa Civil no governo Hartung], não há qualquer menção neste processo. Por isso, não poderia me manifestar sobre o assunto”, afirmou o procurador de Contas.



Heron de Oliveira também justificou a demora de quase um ano na elaboração do longo parecer – com 142 páginas ao todo. Na avaliação do procurador, o texto foi um grande desafio não só pelo volume do processo – com mais de 23 volumes e cinco mil páginas – como pelo amplo debate jurídico. “Tive que aprender uma matéria complexa com pontos de vista altamente questionáveis”, afirmou.

 

Apesar da caracterização da ilegalidade dos pagamentos, a palavra final sobre a devolução dos recursos ao erário e a responsabilização dos envolvidos ficará com os conselheiros. Não há uma previsão do retorno do processo TC 1574/2006 à pauta de julgamentos do TCE. O processo começou a tramitar no ano de 2006.



Dos atuais 315 membros ativos da instituição, pouco mais de 200 tiverem acesso aos benefícios que ainda não foram considerados legais pelos conselheiros. O processo foi a julgamento em março de 2008, quando o então relator, conselheiro Mário Alves Moreira, entendeu que os repasses eram irregulares. Após um intenso debate entre os conselheiros da época, o caso foi retirado de pauta para a realização de novas diligências.

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