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Audiência pública discute licença para empreendimento no Morro da Guaibura

Integrante da Enseada Azul, praia abriga comunidade pesqueira que protege fauna, flora e um pequeno manguezal

A proteção dos ambientes naturais e da comunidade pesqueira que vive no Pontal da Guaibura, diante de um empreendimento imobiliário de 76 unidades, será discutida na audiência pública que a Prefeitura de Guarapari realiza no próximo dia 25, às 18h.

O comunicado oficial sobre o evento, emitido pela Secretaria Municipal de Análise e Aprovação de Projetos de Guarapari, parece dar o fato como consumado, ao convidar a população para debater o Estudo de Impacto de Vizinhança (EIV) referente ao pedido de licenciamento do Condomínio Residencial Guaibura, “a ser implantado’ em um terreno na Rua Lúcio Rocha de Almeida, Guaibura, Nova Guarapari, através do processo administrativo nº 25.269/2022”. 

A fala dos moradores e amigos do lugar ouvidos por Século Diário, por outro lado, tem tom bem diferente. “Já conseguimos embargar uma vez, tendo em vista que a legislação contemplava o Pontal de Guaibura como APP [Área de Preservação Permanente]. Com o passar dos anos, não entendemos por que a legislação regrediu, a ponto de estarem confiantes de que vão construir um empreendimento daquele tamanho lá”, relata a jovem artesã Thaís de Almeida Santos, moradora da Guaiuba.

Flavio de Almeida Santos

Da história do lugar, que se conhece de seus antepassados, a ocupação do local teve início da década de 1930, por pescadores artesanais, que mantiveram sua cultura de convivência com a natureza e de uso comunitário e não intensivo do ambiente. “Naquele morro havia uma roça comunitária. Era de onde a gente tirava o nosso sustento. Também sempre teve os poços, onde até lavava a roupa. É o Poço da Piquira”, conta.

As espécies que vivem no pequeno hábitat, que ganha volume significativo nas temporadas de chuvas, tão conhecidas dos moradores, no entanto, não constam nos levantamentos oficiais feitos sobre a biodiversidade local. “É onde ficam as pererequinhas e rãs, mas elas não foram listadas pelo Iphan [Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional]. Também não fala do manguezal, do pica-pau (…) A gente nunca habitou lá por isso”, explica, com naturalidade.

Os mais velhos, recita, sempre dizem: “Quer subir no morro, suba, mas não suje, não mate os animais, não desmate”. O desmatamento e explosão de rochas são previstos para levar a cabo as 76 residências, caso o empreendimento seja licenciado. “A gente pode perder espécies de plantas e bichos que podem não existir em outro lugar”, alerta.

O manguezal, descreve a artesã, se formou a partir da água dos poços da Piquira que se encontram com o mar, após percorrerem a extensão de pedra do Morro da Guaibura. “Mesmo na ausência da chuva, o poço consegue manter umidade propícia para os goiamuns e para alimentar os pássaros”, testemunha, citando espécies como maçaricos, pirupiru, garça branca e pato-do-mar (pato preto).

Primo de Thaís e antigo morador da Guaibura, o jornalista Flavio de Almeida Santos destaca trechos do EIV para salientar o impacto demográfico do projeto imobiliário. O pedido de licença feito à prefeitura, diz, é para a construção de um conjunto de 76 residências, distribuídas em seis torres com dois a três pavimentos cada, o que envolve cerca de 530 pessoas, entre proprietários e trabalhadores, o que mais que triplicaria a população atual, estimada hoje em 150 moradores fixos. “Está explícito no documento [EIV] que haverá supressão de vegetação e, caso seja necessário, a explosão de rochas”, acrescenta.

Patrimônio natural tombado

A Associação de Moradores da Enseada Azul (Ameazul) – a Guaibura integra a Enseada do Suá junto com Piracanga e Bacutia – tem uma reunião já agendada no próximo sábado (19) para discutir o assunto e construir como a entidade irá se posicionar durante a audiência do dia 25. “Estamos analisando a documentação e vamos nos reunir com a comunidade e tomar as medidas”, conta o presidente da Ameazul, Sérvulo Clermont.

O objetivo, afirma, é “resolver os equívocos” que resultaram, por exemplo, na mudança da classificação da região no Plano Diretor Municipal (PDM). Em 2007, tratava-se de uma Zona Especial, ou seja, com restrições de ocupação em decorrência da proteção ambiental. Em 2016, passou a ser “Zona de Uso Turístico, que permite construções de residências multifamiliares até dois pavimentos”, cita Sérvulo.

Outro equívoco foi a retirada do Conselho Estadual de Cultura (CEC) da lista de órgãos que obrigatoriamente devem ser consultados em licenciamentos ambientais de empreendimentos que queiram se instalar em áreas prioritárias de conservação dentro da Reserva da Biosfera da Mata Atlântica, como é o caso do morro da Guaibura. “A gente está acompanhando com tristeza o que acontece nas Três Praias com o Alphaville“, contextualiza.

Flavio de Almeida Santos

APP

A defesa feita pelos moradores e amigos da Guaibura tem respaldo no parecer técnico emitido pelo Instituto Estadual de Meio Ambiente e Recursos Hídricos (Iema) em 2007, que afirmou: “o Pontal da Guaibura possui alto valor paisagístico, bem como importantíssimo para a reprodução de aves migratórias (constituindo-se em uma Área de Preservação Permanente – APP), sendo incompatível a utilização desta área para fins residenciais e comerciais”.

O parecer segue afirmando que, “devido à sua relevância local, sugerimos encaminhamento deste à Prefeitura Municipal de Guarapari para que a mesma faça proposição e execução de medidas que garantam uma maior proteção desta APP, sendo estas inclusive estabelecidas no seu Plano Diretor Municipal”. Medidas, sublinham, que “devem ser comunicadas e elaboradas junto à Gerência Regional do Patrimônio da União (GRPU), por se tratar, parcialmente, de área da União”.


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https://www.seculodiario.com.br/meio-ambiente/devastacao-ambiental-do-alphaville-em-tres-praias-continua-denunciam-moradores

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