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Eucalipto transgênico da Suzano é alvo de mobilização internacional

Mais de 60 organizações já assinaram denúncia. Variedade aprovada pela CTNBio é mais resistente ao glifosato

Está aberta a adesões até o próximo dia 19, uma carta pública de denúncia contra a liberação para uso comercial de mais um eucalipto transgênico da Suzano Papel e Celulose. O documento já conta com a assinatura de mais de 60 organizações brasileiras e internacionais (veja lista ao final) e pede pela “imediata suspensão da liberação” da variedade 751K032, desenvolvida pela FuturaGene e autorizada em novembro passado pela Comissão Técnica Nacional de Biossegurança (CTNBio). 

“Este eucalipto transgênico resistente ao glifosato, identificado como 751K032, é uma grave ameaça à vida, à sociedade e à natureza. Sua liberação exige maior precaução”, alertam as organizações. O novo transgênico, explicam, contém um gene que o tornou tolerante a aplicações do veneno glifosato, o herbicida mais conhecido no Brasil, pelo nome comercial de Roundup, fabricado pela multinacional Monsanto, atual Bayer, que “tem em sua composição um princípio ativo comprovadamente carcinogênico”.

Endereçada ao presidente da CTNBio, Paulo Augusto Viana Barroso, e ao Ministério Público Federal (MPF), a carta denuncia a forma, “apressada e imprevidente” como se deu a liberação e os efeitos nocivos sobre o meio ambiente e as comunidades tradicionais que vivem em meio aos monocultivos de eucalipto da empresa em vários estados, incluindo o Espírito Santo, visando “apenas os interesses comerciais da Suzano Papel e Celulose” e “ampliar a riqueza de sua principal acionista: a família Feffer em São Paulo, bilionária há muitos anos e uma das mais ricas do país”.

“A aprovação ocorreu em tempo recorde de cinco meses, ignorando a consulta livre, prévia e informada das comunidades que já vivem sob o impacto dos monocultivos de eucalipto. A empresa realizou testes de campo em Açailândia (MA), Caravelas (BA), Angatuba (SP) e Araraquara (SP), sem informar amplamente as comunidades locais sobre os testes e impactos desta atividade”, relatam.

Com isso, sublinha, houve “desrespeito ao princípio da precaução enfatizado nas conferências internacionais sobre biodiversidade, das quais o Brasil participa”. A CTNBio, denunciam, “deu celeridade à aprovação do pedido da empresa Suzano, apenas com base nos estudos apresentados pela própria empresa”.

No Espírito Santo, onde a Suzano (ex-Fibria e ex-Aracruz Celulose) atua com seus extensos eucaliptais, ainda não há informações se o uso dessa variedade já começou a ser implementado e sobre como esse uso foi ou será regularizado. “A Suzano precisa nominar que é transgênico o eucalipto que ela vai plantar no Estado para obter licença no Iema [Instituto Estadual de Meio Ambiente e Recursos Hídricos]? Nos preocupa a falta de transparência. Talvez a variedade transgênica já esteja sendo plantada no Espírito Santo, nos territórios quilombola e campesinos, sem que nem eles mesmos saibam”, questiona Beto Loureiro, educador da Federação dos Órgãos de Assistência Social e Educacional (Fase), uma das entidades que assina a carta-denúncia.

O documento destaca a Resolução 32/2021, da CTNBio, “que flexibiliza as medidas de segurança ao meio ambiente” e que foi aplicada pela Comissão para desobrigar a realização de um plano de monitoramento dos impactos da variedade sobre o meio ambiente. E isso, justamente num momento em que “o país que está ‘secando’ em função do desmatamento sem parar” e que o mundo vive um “caos climático”. Ambos, “fenômenos para as quais também a expansão da Suzano contribui”. 

Sobre a expansão dos eucaliptais, a carta ressalta ainda que esta é a segunda aprovação de variedade transgênica de eucalipto da multinacional pela CTNBio. O primeiro, H421, foi aprovado em 2015 e tinha objetivo de “garantir o aumento de 20% da produtividade”. 

Na ocasião, sublinham os signatários da denúncia, “a empresa alegou que a medida elevaria ‘a competitividade e os ganhos ambientais e socioeconômicos por meio de maior produtividade, usando menos terra e, portanto, menos insumos químicos em geral, com menor liberação de carbono, bem como tornando a terra disponível para a produção ou a conservação de alimentos'”.

A alegação, no entanto, não foi cumprida. Em 2015, “a Suzano tinha 524 mil hectares plantados com monocultura de eucalipto no Brasil para abastecer suas fábricas de celulose”. Em 2020, eram 1,3 milhão de hectares, quase o triplo. 

Mortandades de abelhas 

Uma das localidades vizinhas a uma área de teste de transgênicos da Suzano é a comunidade quilombola de Volta Miúda, em Caravelas, extremo sul da Bahia. Presidente da Associação Quilombola de volta Miúda Caravelas (APRVM) e da Cooperativa Quilombola do Extremo Sul da Bahia (Coopqes), Célio Leocádio conta que a comunidade credita ao eucalipto transgênico H421 as mortandades de abelhas que começaram a acontecer a partir de 2018 na região. 

“As nossas UBMs [Unidade Beneficiamento do Mel] estão criando morcego, barata e rato, sem uso, paradas, porque não tem mais abelha! As empresas faziam pulverização aérea e no solo [de agrotóxicos]. Uma associação teve que fechar as portas, faliu”. A tragédia começou depois de cinco anos do projeto de apicultura, feito com apoio do governo baiano e das próprias papeleiras. “A empresa chegou a medir a região, com GPS, para instalar as caixas de abelhas nos lugares onde ela queria, no meio do eucalipto, depois matou tudo com veneno”, conta. 

Além da apicultura, também a agricultura sofre com a presença dos monocultivos. “A gente não tem mais água, não consegue mais produzir, muitas pessoas estão ficando doentes. Estão descaracterizando nosso território. E o Inema [Instituto do Meio Ambiente e Recursos Hídricos da Bahia] e os municípios entregam licença para as empresas, sem consultar as comunidades. Para irrigar eucalipto e até molhar rua eles dão licença, enquanto a gente não tem água nas comunidades”. 

Na última terça-feira (7), Célio conta que o MPF fez uma visita em campo em Volta Miúda e perguntou se há algum protocolo de consulta prévia das empresas de celulose junto à comunidade. “O promotor orientou que essa consulta prévia pode ser construída junto com a Defensoria Pública. Estamos tentando fazer e as audiências públicas que o MPF fez vão ajudar nisso. Nós nunca fomos consultados sobre nada em relação ao eucalipto”. 

O MPF-BA já realizou duas audiências públicas sobre impacto dos monocultivos de eucaliptos sobre os territórios quilombolas, o último nessa quarta e quinta feira (8 e 9), e o primeiro, no final de março, quando uma delegação capixaba se fez presente, para unificar as lutas quilombolas dos dois estados

Signatários da carta-denúncia

Organizações brasileiras

Rede Alerta Contra o Deserto Verde; Campanha Permanente Contra os Agrotóxicos e Pela Vida Acesso Cidadania e Direitos Humanos; Associação de Meliponicultores do Estado do Espirito Santo (AMES-ES); Amigos da Terra Brasil; Associação Quilombola de Volta Miúda – Caravelas Bahia; Baía Viva; Coletivo Raízes do Sapê; Comissão Nacional de Fortalecimento das Reservas Extrativistas e dos Povos e Comunidades Tradicionais Costeiros e Marinhos do Brasil (CONFREM); Coordenação Nacional de Articulação das Comunidades Negras Rurais Quilombolas (CONAQ); Comissão Pastoral da Terra (CPT); FASE-ES; Fórum Carajás; Fórum da Amazônia Oriental (FAOR); Fórum Mudanças Climáticas e Justiça Socioambiental (FMCJS); Fórum Permanente em Defesa da Vida; Fóruns e Redes de Cidadania do Maranhão; Fundação Padre José Koopmas; Movimento Ciência Cidadã; Movimento Cultural Arte Manha; Movimento de Luta pela Terra (MLT); Movimento Interestadual das Quebradeiras de Coco Babaçu (MIQCB); Movimento Quilombola-Coordenação Estadual ES; Pretaria.Org; Rede de Agroecologia do Maranhão; Terra de Direitos; Viola de Bolso Arte e Memória Cultural.

Assinam em solidariedade, organizações internacionais:

Acción Ecológica (Ecuador); Alianza Biodiversidad (Latinoamérica); Biofuelwatch (USA); Campaign to Stop GE Trees (Internacional); Canadian Biotechnology Action Network – CBAN (Canada); ETC Group (Mexico); Family Farm Defenders (USA); Forum Ökologie & Papier (Germany); Fundação Montescola (España); GE Free New Zealand in Food and Environment (Aotearoa/New Zealand); GE Free Northland (New Zealand); GeneEthics (Australia); Global Justice Ecology Project (USA); GMO Freee USA (USA); GMWatch (UK); Heartwood (USA); Indigenous Environmental Network (USA); Institute for Social Ecology (USA); Japan International Volunteer Center – JVC (Japan); Marcha Mundial das Mulheres (Internacional); Movimiento de Comunidades en Defensa del Agua Qana Choch (Guatemala); Movimiento Social Intercultural del Pueblo de Ixcán (Guatemala); Movimiento por un Uruguay Sustentable – MOVUS (Uruguay); Ofraneh (Honduras); Observatorio Latinoamericano de Conflictos Ambientales – OLCA (Chile); Otros Mundos Chiapas, México (México); Rapal-Uruguay (Uruguay); Red Latinoamericana contra los Monocultivos de Árboles – RECOMA (Latinoamérica); Red Ecuatoriana de Alternativas a la Palma Aceitera (Ecuador); Red Mesoamericana frente a la Palma Aceitera (Mesoamérica); Red por una América Latina Libre de Transgénicos (Ecuador); REDES Amigos de la Tierra Uruguay (Uruguay); Rettet den Regenwald (Germany); Salva La Selva (España); World Rainforest Movement – WRM (Internacional).

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