Com objetivo de se aliar à demanda da sociedade civil organizada e de comunidades indígenas, quilombolas e de pescadores diretamente prejudicados por impactos das indústrias do petróleo, o Fórum dos Afetados pelo Petróleo e Gás do Espírito Santo, ligado à Federação de Órgãos para Assistência Social e Educacional (Fase), está em processo de construção de uma identidade para a campanha “por áreas livres de petróleo”.
Segundo Marcelo Calazans, pesquisador da Fase, os “lucros” do petróleo, na maioria dos casos, não têm se convertido em melhorias na qualidade de vida da população. Ele aponta Presidente Kennedy, no extremo sul do Estado, como um caso emblemático. Com o segundo maior PIB per capta, o município possui alta concentração de renda nas mãos de poucas pessoas e déficits em setores básicos.
Em entrevista ao Instituto Humanitas Unisinos (IHU), Calazans afirma ainda que no Espírito Santo, além de acelerar a redução dos territórios da pesca artesanal, impedindo o acesso dos pescadores às rotas de pescado, a exploração do petróleo ameaça diretamente o recife de Abrolhos, área da baleia Jubarte.
O pesquisador se refere aos impactos previstos com os blocos leiloados no mês passado, no sul do Estado, comprados pela gigante norueguesa Stat Oil. Esses estão próximos a cidades com cultura de colônia de pescadores e comunidades tradicionais como Anchieta, que já tem uma história de degradação. “São vários terminais de gás e óleo, além de dutos cruzando todo o Estado, o estaleiro Jurong; em Aracruz, as siderúrgicas como a Samarco e o porto em Anchieta, os terminais de logística e administrativos na região metropolitana de Vitória, a fábrica de fertilizante em Linhares”, apontou ele ao IHU.
Outra questão levantada por Calazans é o greenwashing (lavagem verde), um marketing de fachada levantado por poluidoras, a exemplo do projeto Tamar, da Petrobras. Calazans também classifica o “boom” petroleiro do Estado como de uma “lógica perversa, que envolve esse sistema compensatório e exige cada vez mais petróleo, mais ferro, mais aço, mais fertilizante químico para o eucalipto e a cana-de-açúcar”, sem contar os diversos “casos de processo e prisão de figuras públicas por corrupção, figurada no desvio de royalties e na cobrança de propinas”.
Além disso, o pesquisador evidencia o inchaço populacional que acarreta problemas como a violência em pequenas e médias comunidades, que acontece na construção das infraestruturas de extração em solo.
Paulo Henrique de Oliveira, da Fase e do Fórum de Afetados por Petróleo e Gás no Espírito Santo, conta que durante o Pedal Contra o Pré-sal, que reuniu ciclistas em uma viagem de quase 400 km entre Vitória e a fronteira com a Bahia, foi possível presenciar áreas contaminadas, onde a exploração existe desde os anos 1970. Na fala das pessoas afetadas, “uma compensação que não compensa”.
A 11ª rodada dos leilões do petróleo impulsionou manifestações de diversos segmentos da sociedade civil que questionam a importância dada à exploração petroleira pelo governo brasileiro, em detrimento ao tratamento às comunidades nativas e os recursos naturais das regiões em que exploram a matéria-prima.
Apesar disso, o recente leilão arrecadou R$ 2,8 bilhões de empresas que terão 30 anos para explorar seus campos, localizados em 11 bacias. Estados como o Pará, Ceará e Rio Grande do Norte se tornarão produtores a partir da venda.
Integração
Fabíola Melca, também integrante do fórum, conta ainda que o Estado está prestes a receber o evento anual da Rede Brasileira de Justiça Ambiental, entidade de caráter político que luta pelos direitos sociais e humanos, pela qualidade coletiva de vida e pela sustentabilidade ambiental e reúne organizações como movimentos sociais, entidades ambientalistas e grupos de ensino e pesquisa.
Outro grupo aliado ao fórum capixaba é o Observatório de Conflitos Urbanos da Universidade Federal do Estado (Ufes). Sandro Juliati aponta que é essencial identificar o impacto das explorações petroleiras nas populações próximas aos pontos de extração, além de questionar o estilo de vida da sociedade petroleira – que foca a qualidade de vida urbana no consumo abusivo do recurso e desconsidera os direitos das populações nativas diretamente afetadas.
O fórum local, além de se aproximar de indígenas, quilombolas e pescadores afetados pela exploração desenfreada, buscará articulações, também, com a militância de outros estados como Bahia, Pernambuco e Maranhão – este último, inclusive, atingido pela última rodada de leilões do petróleo.