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Indígenas decidem, em assembleia, desocupar ferrovia no dia 13 de outubro

Decisão é “voto de confiança” ao juiz Cobucci, que intermedeia revisão do acordo-desastre com mineradoras

Divulgação

As comunidades indígenas Tupinikim e Guarani que ocupam os trilhos da Vale que cortam seus territórios irão suspender a mobilização na próxima sexta-feira (13). A decisão foi tomada em assembleia realizada neste sábado (7), em respeito ao compromisso firmado pelo juiz federal Vinicius Cobucci, da 4ª Vara de Belo Horizonte, de buscar uma negociação com a Vale, a Samarco e a BHP Billiton, responsáveis pelo crime contra a bacia do Rio Doce em novembro de 2015.

“As comunidades darão esse voto de confiança ao pedido do juiz, porém se as empresas não apresentarem proposta que atenda às reivindicações das comunidades o trilho será interditado novamente”, informa Joel Monteiro, presidente da Associação Indígena Tupinikim de Caieiras Velha (AITCV).

A deliberação está alinhada com a posição estabelecida desde o início do movimento, no dia 17 de setembro, de que a desocupação da ferrovia só aconteceria mediante um sinal concreto, por parte das mineradoras, de que estão dispostas a reverem o “acordo-desastre” firmado entre as comunidades indígenas e a Fundação Renova no final de 2021, referente à compensação e reparação dos danos decorrentes do crime.

A decisão será encaminhada pelo Conselho Territorial de Caciques ao magistrado federal em ofício, onde também será incluído um pedido para que ele interceda junto ao desembargador do Tribunal Regional Federal da Sexta Região (TRF-6) Ricardo Machado Rabelo, responsável pelos processos do caso Samarco/Vale-BHP em segunda instância e representante da Justiça Federal na mesa de Repactuação liderada pelo governo federal.

“As comunidades deliberaram para que o juiz interceda junto ao desembargador para que garanta a consulta livre, prévia, informada [Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT)] e que seja pactuado com as empresas um acordo em que não haja transferências das responsabilidades de mitigação e reparação que são exclusivas delas. Falou-se de um possível depósito judicial para garantir esse pacto”, relata o presidente da AITCV.

A preocupação das comunidades, explica, é de que “a repactuação está sendo construída de cima para baixo” e que “o cenário é de insegurança e de ameaça à devida reparação e mitigação dos danos causados ao território”, devido a, mais uma vez, não estar sendo cumprido o direito de consulta prévia, livre e informada. “Continuam as violações”, acentua.

Contrapartidas das empresas

O tema da repactuação também foi tratado durante reunião realizada nesta quinta-feira (5), quando o juiz federal Vinicius Cobucci informou às comunidades que irá solicitar ao desembargador do TRF-6 que verifique a possibilidade de tratar a questão dos povos originários em separado dos demais grupos de atingidos, para que seja garantido sua participação conforme estabelece a Convenção OIT 169.

Na ocasião, o magistrado levou aos indígenas a informação de que as mineradoras criminosas aceitaram participar da audiência de conciliação do dia 17 de outubro, na tentativa de revisão do “acordo-desastre” de 2021 com a Renova. As contrapropostas em relação à pauta de reivindicações das comunidades, no entanto, ainda não foram apresentadas. A expectativa é de que, apresentadas as contrapropostas, seja possível, na audiência, homologar um novo acordo de reparação e mitigação dos danos.

Nessa reunião também participaram o Ministério Público Federal (MPF), Defensoria Pública da União (DPU), Defensoria Pública Estadual (DPE), Coordenação-Geral de Gestão Ambiental da Fundação Nacional dos Povos Indígenas (CGGAM/Funai) e Ministério dos Povos Indígenas (MPI).

Violação continuada de direitos

O acordo de 2021 com a Fundação Renova é chamado de “acordo-desastre” pelos indígenas porque foi “uma imposição e uma violência” que precisam ser sanadas. “A Fundação Renova, que tinha obrigação de garantir um acordo justo e igualitário, fez o exato oposto, transformando o acordo contra o qual lutamos em um novo desastre (…) Tivemos um acordo injusto, ilegal e violador de direitos, que resultou na pior indenização de toda a Bacia do Doce. Não houve consulta livre, prévia e informada [conforme determinada a Convenção 169 da OIT], na verdade as pessoas foram obrigadas a aceitar os termos do acordo-desastre porque ‘ou era aquilo ou nada’ (…) Todos os demais problemas surgem dessa violação, desse desrespeito. E nós, povos originários, não temos opção: só nos resta lutar contra essa violação continuada”, relata o Conselho Territorial de Caciques Tupinikim e Guarani em carta enviada à Justiça Federal em setembro, posição com a qual o MPF e a DPU concordam.

A revisão do “acordo-desastre” foi o motivo da ocupação dos trilhos realizada durante 43 dias há um ano, que resultou na saída da Fundação Renova das tratativas com as comunidades, que passaram a ser feitas diretamente com as mineradoras mantenedoras, e com a retomada do pagamento do Auxílio de Subsistência Emergencial (ASE), equivalente ao Auxílio Financeiro Emergencial (AFE), pago aos atingidos não-indígenas. Os outros pontos de pauta, no entanto, não foram cumpridos pelas mineradoras, durante o período de intermediação do então juiz substituto da 4ª Vara Federal, Michael Procópio.

Ao assumir a 4ª Vara, o juiz Vinicius Cobucci chegou a despachar de forma contrária ao pleito feito pela AITCV pela revisão do acordo, sem análise do mérito, dizendo que a entidade não tinha legitimidade para judicializar. Após essa sentença, as empresas se negaram a continuar dialogando com as comunidades, o que motivou essa segunda ocupação. Com o atual entendimento de Cobucci de retomar a intermediação das negociações, as comunidades lhe deram esse voto de confiança, agendando a desocupação para a próxima sexta-feira, à espera de resultados concretos na audiência do dia 17 de outubro.

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