Sábado, 04 Mai 2024

Pó preto: relatório minimizou cobranças da sociedade civil e exaltou defesa das poluidoras

Pó preto: relatório minimizou cobranças da sociedade civil e exaltou defesa das poluidoras
As contradições apresentadas pelo Grupo SOS Espírito Santo Ambiental no relatório final das audiências públicas sobre o pó preto na Assembleia Legislativa vão desde mudanças no que foi dito por representantes dos movimentos sociais, até no discurso das próprias poluidoras. A diferença é de tratamento. Enquanto o documento não enfatiza os argumentos da sociedade civil para defender suas causas, como a abertura da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) do Pó Preto e o embasamento técnico para a adoção de novos métodos para contenção da poluição, apresenta com detalhes a defesa das empresas e do poder público, até com gráficos ilustrativos.
 
Em alguns casos, a simples troca de termos muda o sentido daquilo que foi dito pela sociedade civil com relação às empresas. No relato da segunda audiência pública, consta que "o representante da sociedade civil pela SOS ES Ambiental [Eraylton Moreschi Junior] questionou ao deputado Cláudio Vereza [PT] quanto à idoneidade dos procedimentos desta série de audiências públicas, uma vez que não foi acolhida a proposta entregue pela ONG de nova formatação para as audiências públicas". A sociedade civil defende que não questionou a idoneidade ("aptidão adquirida pela prática", segundo o dicionário Priberam), mas sim a credibilidade ("qualidade de crível", segundo a mesma fonte), das empresas poluidoras, a ser: Vale, ArcelorMittal e Samarco Mineração.
 
O grupo ainda ressalta que não há registro no documento de que o gerente de Meio Ambiente da ArcelorMittal, Guilherme Abreu, considerou a viabilidade da proposta apresentada pelos ambientalistas na terceira audiência pública. O SOS Ambiental propunha que a Vale e a Arcelor reduzam conjuntamente as emissões de material particulado em 45% até 31 de agosto de 2018, se comparadas às taxas de 2013 e 2014. Os planos para as reduções deveriam ser apresentados em exatos seis meses, até o dia 16 de abril de 2014. Ao mesmo tempo, o inventário das emissões e o levantamento das fontes emissoras do Estado.
 
Ainda há, no documento, o registro de uma estatística apresentada pelo gerente de Meio Ambiente da Vale, Romildo Fracalossi, que segundo o grupo não foi apresentada na plenária. Afirma-se que Moreschi, representante do SOS, "trouxe dados novos provenientes de estudos técnicos feitos pela Ufes [Universidade Federal do Espírito Santo], afirmando que na Ilha do Boi, quando há vento nordeste, foram registrados níveis de 55% e até 80% de poeira sedimentável, o famoso “pó preto”, contradizendo a afirmação do Sr. Romildo que afirmou que a contribuição da Vale e da Arcelor é de 5%". Segundo o SOS, essa afirmação não foi feita.
 
No mesmo trecho, é registrado que Moreschi afirmou que os estudos do DNA do Pó Preto, que têm como objetivo rastrear de onde surge o material particulado e qual a participação de cada empresa em seu total, "nunca será concluído com a identificação das responsabilidades e percentuais de cada empresa", mas não registra que essa impossibilidade, segundo o ambientalista, é devido à resistência das próprias empresas em assumirem o material particulado e o prejuízo à população que causam.
 
No relato da última audiência pública, o documento relata que, na fala de Moreschi, este aponta que a Vale usa tecnologias inferiores às existentes, se nega a responder efetivamente aos questionamentos apresentados nas audiências públicas, além de "subornar agentes públicos, quebrar sigilos bancários e realizar ações de espionagem; etc". Os ambientalistas relatam que essa fala foi sintetizada e solicitam que seja anexado ao relatório o pronunciamento completo do grupo com relação à empresa.
 
O pedido do SOS Ambiental para que o deputado Cláudio Vereza (PT), presidente da Frente Parlamentar Ambientalista da Assembleia e propositor das audiências públicas, retirasse urgentemente todos os relatórios de circulação aconteceu na última semana. O grupo afirma que nele havia registros de falas que não eram da responsabilidade da entidade. "Falas montadas de maneira irresponsável e até talvez planejadas”, reiterando que havia como comprovar a veracidade ou não das afirmações, que estão registradas em vídeos. O grupo também encaminhou uma versão do documento, com destaque para todos os pontos que considerou inadequados, bem como a sugestão para sua devida correção.
 
No pedido, o grupo se mostrou preocupado ao saber a quais pessoas foram incumbidas a elaboração de tal documento. O grupo também exige a prestação de contas da contratação dos serviços do Instituto de Excelência em Relações Comerciais e Internacionais (Instituto Inceri) para a elaboração do relatório final e cobra explicação sobre o porquê da terceirização do serviço. Além disso, questiona o que significa dizer que a responsabilidade pela elaboração e redação do relatório é de Lorena Zucatelli dos Santos, advogada e representante do Instituto, como consta no relatório, e se a contratação do serviço foi pago com dinheiro público.
 
Em uma rápida pesquisa pela internet sobre o Instituto Inceri, é possível ver que o último evento realizado pelo instituto, o IV Simpósio do Mercado de Crédito de Carbono, além de ter apoio do governo do Estado e do Instituto Estadual de Meio Ambiente e Recursos Hídricos (Iema), foi patrocinado pelas seguintes empresas: Samarco, ArcelorMittal e Vale. Exatamente as três poluidoras participantes das audiências públicas e principais alvos dos ambientalistas.

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