Nerter Samora e Renata Oliveira
O grupo do ex-governador Paulo Hartung encontra dificuldade em desatar o nó da unanimidade que ele mesmo criou. Papo de Repórter analisa as movimentações dos “dois PMDBs” do Estado para a eleição do próximo ano.
Nerter – O PMDB do Espírito Santo vem tentando erguer um palanque ao governo do Estado para a eleição de 2014, mas as dificuldades para consolidar um nome do partido na disputa têm sido muito grandes. Diferentemente de 2010, quando os interesses nacionais tiraram o partido da disputa no Estado, este ano a nacional do partido não está conseguindo vencer a reação interna ao palanque próprio. Parte do partido, aliás, a maioria dos membros do partido não, está nada disposta a aceitar a tratorada em favor do projeto do grupo do ex-governador Paulo Hartung.
Renata – Antes de discutir essa questão do palanque próprio é preciso voltar no tempo para avaliar como isso foi construído. Em 2002, Paulo Hartung foi eleito governador do Estado pelo PSB, quem diria. Deixou o partido cerca de um ano depois e só foi se filiar novamente em 2005, para disputar a reeleição em 2006. A sigla escolhida foi o PMDB. O ex-governador foi levado ao partido pelas mãos do ex-senador Gerson Camata, que depois acabou isolado no PMDB. Ele e os chamados históricos. Aproveitando-se da confusão criada com aquela questão das ambulâncias, em Brasília. Ele com o apoio do deputado federal Lelo Coimbra – eleito com a ajuda de Hartung, de quem era vice, em 2006 e do então deputado estadual Guerino Zanon, o grupo derrubou o então presidente do partido no Estado Marcelino Fraga, com uma costura com a nacional.
Nerter – Sim. Lelo foi alçado ao posto de presidente do PMDB e passou a ser a voz de Hartung dentro do partido. Com o poder da caneta do governador seu grupo acabou dominando o partido. Depois do entrevero de 2008, quando Ricardo Ferraço, vice no segundo mandato de Hartung, e ainda no PSDB fez campanha para o então prefeito de Vitória João Coser, do PT, causando um mal-estar no ninho tucano. O vice de Hartung foi levado para o PMDB já com a missão de ser o sucessor do governador na eleição de 2010. Tudo isso foi empurrado verticalmente no partido, sem qualquer discussão. Um sistema de unanimidade política foi costurado no Estado baseando as articulações em uma política de grupo, passando por cima das colorações partidárias.
Renata – No PMDB, embora muita gente tivesse torcido o nariz e reclamado baixinho, as coisas foram sendo aceitas. O partido, porém perdeu figuras importantes. Camata deixou de ser senador, a mulher dele, Rira Camata, a deputada federal de seis mandatos, deixou o partido. A mudança na chapa costurada por cima, tirou o PMDB do governo do Estado e a participação no governo de Renato Casagrande ficou restrita às indicações do grupo do ex-governador, que não se relacionavam com a representatividade partidária na equipe do socialista. Se perdeu no Executivo, o PMDB ganhou no Legislativo, com as danças das cadeiras nas bancadas por conta das eleições de 2012 e recontagens de votos das eleições de 2010, o partido tem hoje um senador, três deputados federais e sete deputados estaduais.
Nerter – E é aí que começam os problemas para o grupo de Hartung. Esses sete deputados, mais os 15 prefeitos e alguns ex-prefeitos do partido seguem a tendência da classe política capixaba de que em time que está ganhando não se mexe. Apesar da tentativa do grupo de Hartung em retomar o poder no Palácio Anchieta, os deputados sabem que essas lideranças não têm mais a mesma capacidade de aglutinação de forças que tinham antes, quando contavam com o poder da caneta e do arranjo institucional. Os deputados querem acomodação para as chapas proporcionais, os prefeitos querem socorro nas finanças das prefeituras e as lideranças históricas do PMDB querem retomar o comando do partido. Tudo isso foi deflagrado por mais uma tentativa de verticalização das decisões. Hartung e Ricardo fecharam acordo com a nacional sobre o palanque majoritário, mas não têm as garantias exigidas pela bancada estadual de que vão conseguir uma acomodação proporcional favorável ao partido. Também não tem como garantir vitória, o que coloca os prefeitos em uma situação complicada. Se Casagrande for reeleito como vão lidar com ele os prefeitos que lhe viraram as costas nas eleições de 2014?
Renata – Casagrande hoje tem um caixa cheio, o apoio das forças políticas e a posição de neutralidade – embora isso seja um assunto à parte – em relação ao palanque presidencial. Ricardo Ferraço tem uma série de dificuldades para vencer antes de se viabilizar para a disputa. Caso Paulo Hartung seja o candidato, a preocupação não é nem o palanque de Casagrande, mas o imprevisível palanque de Magno Malta (PR), que não teria nenhum problema em ir para o confronto com o peemedebista. Se Hartung entrar no jogo de embate com o republicano, mais uma vez vai beneficiar o governador Renato Casagrande. Se bem que o discurso de Magno pega os dois.
Nerter – Enquanto a bancada declara sua fidelidade a Casagrande, nacionalmente uma outra disputa é travada. Dentro do PMDB nacional,o vice-presidente da República Michel Temer e o presidente do partido, senador Valdir Raupp, parecem ter opiniões diferentes sobre o nome que deve capitanear o palanque da sigla no Espírito Santo. Temer diz que tanto faz, mas ao deixar claro que não pediu a Hartung que disputasse, desmontou a tese do ex-governador. Ele, na verdade prefere Ricardo Ferraço, mas duvido que Dilma Rousseff, depois do episódio do senador boliviano Roger Molina, queira subir no palanque ao lado dele no Estado. O ex-presidente Lula tenta negociar a candidatura de Hartung para sustentar o palanque de Dilma. É o que resta para o PT, não é?
Renata – Rapaz, o PT é um assunto muito complicado para se tratar no meio dessa discussão aqui, vamos guardar isso para depois das eleições internas do partido. Por ora, basta dizer que o partido, assim como o restante da classe política capixaba, vai lutar até o último segundo para permanecer no palanque de reeleição de Renato Casagrande. Mas aceita conversar com o PR também. Enfim, sem um projeto político e com seu perfil cada vez mais pragmático, digamos que o PT só não sobe no palanque de Aécio Neves (PSDB). Se bem que essa história de aliados de Hartung no ninho tucano pode acabar levando o PT para uma cilada.
Nerter – O fato é que o grupo do ex-governador está tendo muita dificuldade para desatar o nó que ele mesmo criou. Na hora de aglutinar as forças para conquistar o poder sem ter de enfrentar qualquer crítica da oposição, a união, ou melhor, a unanimidade era muito bem vinda. Agora, ela não interessa mais.
Renata – Pois é, viraram defensores da diversidade política em defesa da democracia. Quem diria…