O presidente da Comissão de Direitos Humanos e Minorias da Câmara dos Deputados, Helder Salomão (PT), considerou “mentirosa, sádica e um desrespeito aos princípios civilizatórios mínimos” a declaração do presidente Jair Bolsonaro (PSL) sobre o militante político Fernando Santa Cruz, pai do presidente nacional da Ordem dos advogados do Brasil (OAB), Felipe Santa Cruz, assassinado pela ditadura militar na década de 70.
Em nota, o parlamentar critica a postura de Bolsonaro e aponta que ele, “em tom de pouco caso, afirma que foram correligionários de Fernando Santa Cruz que o mataram, informação essa que teria obtido com pessoas que conversou à época. O ouvir-dizer contraria os documentos”.
De acordo com relatório do Ministério da Aeronáutica de 1978, Fernando Augusto de Santa Cruz Oliveira foi preso em 22 de fevereiro de 1974 no Rio de Janeiro. Já o relatório da Marinha de 1993 dá conta que ele teria sido preso no dia 23 de fevereiro de 1974.
São documentos oficiais levantados pela Comissão Nacional da Verdade. Fernando foi considerado desaparecido após estar sob a tutela do Estado. Duas hipóteses, baseadas em depoimentos de agentes públicos, são consideradas pela CNV: assassinato na sede do DOI-CODI/SP, com sepultamento no Cemitério de Perus; ou encaminhamento para a Casa da Morte, em Petrópolis, com posterior incineração em usina de açúcar.
A incineração de corpos, entre eles o Fernando Santa Cruz, foi confirmada pelo então delegado Cláudio Guerra, hoje pastor evangélico, em depoimento à Comissão da Verdade. A morte de Fernando também está registrada no livro Memória de uma Guerra Suja, com relatos de Guerra aos jornalistas Rogério Medeiros e Marcelo Netto.
O local da incineração dos corpos, segundo depoimento de Cláudio Guerra, foi a usina Cambahyba, em Campos dos Goytacazes, Estado do Rio, da família de Heli Ribeiro Gomes. “O forno da usina era enorme, ideal para transformar em cinzas qualquer vestígio humano”, conta Cláudio Guerra no livro.
Helder Salomão explica que “dias antes às declarações de Bolsonaro, a Comissão Especial sobre Mortos e Desaparecidos Políticos atestou que Fernando Augusto de Santa Cruz Oliveira foi vítima de morte não natural, violenta, causada pelo Estado brasileiro, no contexto da perseguição sistemática e generalizada à população identificada como opositora política ao regime ditatorial de 1964 a 1985”.
Para o deputado, o Brasil é plural e tolerante; é construído por organizações da sociedade civil que defendem diferentes causas, por movimentos sociais organizados, por corporações profissionais, pela imprensa e por cidadãos, “diferente do traço antidemocrático, desumano e sádico da manifestação do presidente”.
E acrescenta: “Estou certo de que esta Comissão de Direitos Humanos, o Poder Legislativo, os órgãos públicos e as diversas expressões da sociedade civil brasileira não aceitarão que o Brasil se torne um país que transita entre as trevas e os porões”.