Parlamentares são acusados de participação em suposto esquema de propina

O juiz Gustavo Grillo Ferreira, da 2ª Vara Criminal da Serra, determinou, nesta terça-feira (23), o afastamento de quatro vereadores do município acusados de corrupção: Saulinho da Academia (presidente da Câmara) e Teilton Valim, ambos do PDT; Cleber Serrinha (MDB); e Wellington Alemão (Rede). A medida é válida por prazo indeterminado, e atende a um requerimento do Ministério Público do Estado (MPES).
De acordo com a decisão, os vereadores ficarão proibidos de frequentar as dependências da Câmara Municipal, mas vão continuar recebendo salário. Eles também não poderão praticar atos de gestão, e serão obrigados a devolver crachás, senhas, chaves, tokens ou quaisquer elementos de acesso a sistemas operacionais que lhes permitam interferir em proposições legislativas. Além disso, será necessário que se mantenham distantes de quaisquer outras pessoas relacionadas ao caso, tais como testemunhas e demais acusados.
O caso envolve um suposto esquema de negociação de propinas. Os acusados tentaram um Acordo de Não Persecução Penal, possibilidade em que confessariam o crime em troca da extinção do processo. Entretanto, a Procuradoria-Geral de Justiça (PGJ) se manifestou contra, por entender que “não se configura necessário e suficiente para a reprovação e prevenção dos crimes apurados nos autos”.
Procedendo à análise do caso, o juiz classificou os fatos trazidos pelo Ministério Público como “gravíssimos”, e “estão vinculados, de forma direta ao exercício do cargo”. Segundo ele, “os áudios demonstram, para além de qualquer dúvida razoável, a antiga e nefasta prática do compadrio político, estando nítido que os parlamentares se associaram para tratar de escusos interesses privados. Em adição, é possível extrair, já nesta oportunidade, fortes elementos de indícios dando conta de que não irão eles cessar o núcleo de interesses, caso o Poder Judiciário deixe de tomar a medida excepcional, em especial porque sobejas são as evidências de estar a prática espúria enraizada no legislativo municipal desta Comarca. Oportuno destacar que é possível, inclusive, extrair, da análise dos diálogos travados nos áudios, tratar-se de um esquema de favorecimento ilegal reiterado”.
“A bem da verdade”, continuou o magistrado, “os áudios dão conta da possibilidade, plausível, de haver outros agentes políticos envolvidos, porém não identificados (ainda), podendo dessumir-se que uma significativa parcela dos parlamentares tomaram a casa legislativa local e transformaram a Câmara Municipal de Serra num ‘clube de amigos’, num verdadeiro ‘círculo de comparsas”.
O juiz ressaltou que a suspensão da função pública é uma medida cautelar diferente da prisão, e que a manutenção dos vereadores em seus mandatos “importa risco real de continuidade de práticas semelhantes”.
‘Ninguém é bobo’
Segundo a denúncia do Ministério Público do Estado, os vereadores teriam negociado propina para a inclusão de emendas no Projeto de Lei nº 69/2024, que “institui a Política Pública de Regularização de imóveis urbanos de propriedade do município da Serra dados em aforamento, em enfiteuse ou em emprazamento e dá outras providências”.
A denúncia cita que a proposta era considerada “projeto do prefeito” ou “projeto do Moreira” – em referência a Luiz Carlos Moreira (MDB), ex-vereador e ex-presidente da Câmara, também denunciado. A iniciativa envolvia vários interesses, mas não é citado quem teria oferecido a vantagem.
Em uma reunião que teve o áudio gravado, os quatro vereadores trataram do assunto. “Negócio é o seguinte. Aqui a galera sabe que você anda devagar, mas sempre anda na frente. (Risos) Ninguém é bobo. Você chegou com uma emendazinha aí e a gente tá sabendo o seguinte, e esse mesmo cara que você conversou, que iria dar uma situação para a galera aí, o cara recuou e você meteu uma emenda. Aí a gente quer saber o que que tem nessa emenda aí pros vereador votar não ter problema, mas é o miguel ai cair pra todo mundo”, disse Cleber para Wellington na ocasião, segundo transcrição do MPES.
Inicialmente, a vantagem oferecida seria de R$ 100 mil, mas depois houve uma proposta de troca para um terreno de 6 mil metros quadrados, que não foi bem recebida pelos participantes. Também há áudios sobre vantagens indevidas a respeito da votação do Plano Diretor Municipal (PDM) em outra ocasião. Outros citados nas descrições são William Miranda (União), vice-presidente da Câmara – não denunciado – e um homem nomeado apenas como Isaac. Segundo o MPES, os envolvidos nos áudios confirmaram que as vozes eram mesmo deles.
Wellington Alemão e a Mesa Diretora fizeram duas emendas ao projeto de lei, e o projeto foi aprovado com 19 votos favoráveis e três contrários, em maio de 2024. Entretanto, o então prefeito, Sérgio Vidigal (PDT), vetou as duas emendas, e o veto foi mantido após votação na Câmara. Dessa vez, Saulinho e Teilton não votaram, enquanto Alemão e Cleber estavam ausentes, de acordo com o boletim de votação da Câmara.
O ex-vereador Aloísio Ferreira Santana também é citado no esquema. Ele e Luiz Carlos respondem por corrupção ativa, e os demais, por corrupção passiva.
Base governista
O processo é um duro golpe para a gestão do prefeito Weverson Meirelles (PDT), que precisa lidar com o fato de ter dois parlamentares de seu próprio partido envolvidos no escândalo. Empresário, Saulinho da Academia foi o candidato a vereador mais votado nas eleições de 2024, com 8,2 mil votos. Eleito pela primeira vez em 2020, está também no segundo mandato como presidente da Câmara de Vereadores – ocupou a posição no biênio 2023-2024.
Teilton Valim, liderança comunitária de Nova Carapina II, foi justamente o segundo mais votado em 2024, com 7,3 mil votos, e também está no seu segundo mandato. Ou seja, a denúncia afeta diretamente duas figuras políticas em ascensão do Partido Democrático Trabalhista e cotados como possíveis candidatos a deputado estadual no ano que vem.
Em julho, Vidigal deixou o cargo de secretário estadual de Desenvolvimento. Um dos motivos seria justamente a necessidade de trabalhar mais pelo partido visando as eleições do ano que vem. Vidigal também tem circulado com seu filho, Serginho Vidigal, cotado para disputar uma cadeira na Câmara Federal.
Os outros dois vereadores denunciados também compõem a Mesa Diretora da Câmara Municipal e são da base de Weverson Meirelles. Primeiro secretário, Serrinha é ligado aos rodoviários, sendo mais um que exerce o segundo mandato consecutivo como vereador. Já Wellington Alemão, sendo secretário da Câmara, está em seu terceiro mandato.