Açucena, alvo de pedido de cassação, segue sem acesso ao documento
Durante a sessão da Câmara de Cariacica na tarde desta quarta-feira (18), a vereadora Açucena (PT) se pronunciou sobre o pedido de abertura de processo disciplinar na Corregedoria pedindo a cassação de seu mandato. “O vereador Sérgio Camilo [União] não vai nos calar”, reagiu, reiterando que embora o pedido já tenha sido protocolado, ainda não teve acesso ao documento, portanto, “não se sabe os fundamentos e alegações”.

O pedido de cassação foi anunciado pelo próprio Sérgio Camilo na sessão dessa segunda-feira (16). Ele também disse ter solicitado o afastamento imediato da parlamentar e que a sua vaga seja ocupada pelo suplente “até que ela se defenda das acusações contra este parlamentar”. A fala provocou reação da sociedade civil, que lotou o Plenário da Casa de Leis nesta quarta.
Com base na fala do vereador, Açucena destacou que a iniciativa de Sérgio Camilo foi motivada “por um suposto ataque ao dizer que ele não foi eleito e que é um suplente em exercício devido ao acordo de licenciamento de um vereador de seu partido para assumir uma secretaria, e em seu direito assumiu como vereador suplente”, referindo-se a Edgar do Esporte (União), vereador eleito com 4,6 mil votos e que hoje atua como secretário de Relações Comunitárias.
“A tentativa do vereador, sem fundamentação, de tentar cassar o mandato, não é um ataque a mim, Ilona Açucena, é um ataque aos 2.644 votos que me elegeram, a todas as mulheres, jovens, professores e professoras, à periferia da cidade, religiões de matriz africana e todos que se sentem representados pelo nosso mandato”, disse a vereadora, que destacou: “sou uma mulher jovem, cria de Padre Gabriel, filha de Elaine e Vitor, filha de Oxumaré, fruto da escola pública e do SUS [Sistema Único de Saúde]. Conheço bem a realidade da cidade”.
Embora estivesse na sessão dessa quarta-feira, Sérgio Camilo não se pronunciou sobre o assunto. Na de segunda, o vereador referiu-se a Açucena como “vereadora do partido da bandeira vermelha” e falou que o motivou do pedido de cassação foi o fato de que Açucena “disse, em vários discursos, que não sou vereador, e que estou aqui devido a um acordo”.
Sérgio Camilo também afirmou subir na tribuna “para desmentir, desmascarar falas, inclusive ofensivas, da vereadora do partido da bandeira vermelha, que disse que eu estava fazendo dessa Casa o fundo do quintal da minha casa e que eu estava no mundo das fake news”.
O vereador também se referiu ao deputado federal Helder Salomão (PT), que foi prefeito de Cariacica em duas gestões, como “prefeito do partido da bandeira vermelha” e acusou o PT de ser responsável “pelo maior escândalo do INSS da história desse país”. Além disso, com uma reportagem de jornal em mãos, afirmou que na gestão do Helder em Cariacica estava entre as 100 cidades mais pobres do Brasil, entre as 20 piores em saneamento básico e que Açucena, “como não conhece onde mora, disse que eu estava no mundo das fake news”.
Manifestações
O PT Estadual, em nota, destacou que “Açucena é uma liderança legítima, eleita com 2.644 votos, que representa a luta das mulheres, da juventude negra, da periferia e dos movimentos sociais que constroem, diariamente, uma política com coragem, dignidade e compromisso com o povo”.
O partido disse, ainda, que “não aceitaremos calados mais um caso de violência política de gênero e raça, que tenta silenciar a força e a voz de uma mulher negra que ousa enfrentar o machismo institucionalizado e os privilégios de uma política arcaica. Seu mandato pertence a um projeto coletivo construído com as bases populares de Cariacica”.
A Juventude do PT classificou a atitude de Sérgio Camilo como uma “tentativa grotesca, autoritária e ilegal de cassação do mandato da companheira Açucena, a única mulher vereadora e de esquerda da Câmara Municipal de Cariacica”. Para a Juventude do PT, trata-se de “um ataque frontal à democracia, ao voto popular e à luta das mulheres, da juventude, da população negra, das LGBTI+, da periferia e de todos aqueles e aquelas que ousam ocupar espaços de poder sem se curvar à velha política dos gabinetes fechados e dos conchavos sujos”. Destaca, ainda, que Açucena “é mulher, negra, lésbica, periférica e combativa”. “Não é exagero dizer que esta tentativa de cassação é misógina, lesbofóbica, racista e antidemocrática”, disse a nota.
A deputada estadual Iriny Lopes (PT) também se manifestou nas redes sociais. “Isso tem sido uma prática repudiável em praticamente todas as câmaras municipais do Brasil, onde as vítimas são sempre parlamentares negros, parlamentares LGBTs, parlamentares mulheres. Nós defenderemos o mandato da Açucena de todas as formas”, disse.
Helder Salomão classificou como “absurda” a tentativa de cassação. “Querer cassar o mandato da vereadora Açucena é desrespeitar a vontade do povo e querer criar uma situação que não existe. Açucena é uma vereadora que orgulha o Partido dos Trabalhadores, orgulha os eleitores, e está fazendo um mandato exemplar”, disse o deputado nas redes sociais.
O senador Fabiano Contarato (PT) afirmou ser “inaceitável e revoltante essa tentativa absurda de cassar o mandato, conquistado de forma legítima nas urnas”.
Na sessão dessa terça-feira, na Câmara de Vitória, a vereadora Karla Coser (PT) demonstrou solidariedade à colega de partido. “Açucena, conta com a gente aqui em Vitória. A gente sabe que a entrada da mulher na política é extremamente desafiadora, mas a permanência dela é ainda mais desafiadora”, disse.
Também em Vitória, o vereador Jocelino (PT) destacou que Açucena “tem trabalho de base, militância no movimento Estudantil e nas comunidades na qual têm vinculação e tem feito um mandato estratégico para Cariacica”. “Quando a gente chega nos espaços de poder, como a Câmara de Vereadores, não somos aceitos. Querem, a todo tempo deslegitimar quem vem da periferia, quem faz trabalho social de base”, acrescentou.
A também vereadora de Vitória, Ana Paula Rocha (Psol), em suas redes sociais, apontou que “essa tentativa de cassação é mais uma forma de violência contra nós, mulheres negras, que ocupamos espaços de poder. Você não está sozinha e não seremos silenciadas”.
Em nota, o Centro de Estudos Bíblicos do Espírito Santo (Cebi/ES) afirmou que estará ao lado de Açucena “em todas as demandas necessárias para manter um mandado que prima por defender a vida em todas as suas dimensões de liberdade, de educação, de moradia, de saúde e alimentação digna para toda a população no âmbito de seu município”.