Nerter Samora e Renata Oliveira
A partir de janeiro próximo, Renato Casagrande deixa de ser governador e vai se dedicar à política partidária. Ele, porém, pretende manter um canal de diálogo com a população. Ele precisa rebater o discurso do governador eleito de que seu antecessor foi mau gestor. Papo de Repórter debate como ficará esse embate de forças a partir de 2015.
Nerter – A entrevista do governador Renato Casagrande ao Bom Dia ES esta semana deu alguns sinais de como vai se movimentar o socialista a partir de 2015. Disse que fará política partidária, que estará “à disposição do povo capixaba” e sobre seu futuro político, não quis adiantar detalhes. A impressão que passou é de que não vai querer ficar na planície por muito tempo e nos bastidores os ventos já sopram em direção a 2016, para a prefeitura de Vitória. Esse caminho de Renato Casagrande, porém, não será tão fácil. Nesse sábado, o PSB se reuniu para discutir como vai começar a trilhar esse caminho. Casagrande tem partido na mão e, como maior estrela socialista no Estado, o projeto do partido é o projeto dele.
Renata – A partir desta segunda-feira (1), o governador entra em seu último mês de governo. Este será o último período para que ele possa, com a caneta na mão, defender sua administração e criar condições de construir seu futuro político. Ele fala de forma serena, firme, isso porque ele deixa o governo bem, sem denúncias de corrupção, e seu antecessor chega com um monte de denúncias. Há uma desigualdade no embate pós-eleitoral que precisa ser corrigida por Casagrande. Quem faz as críticas ao seu governo, não é Hartung e sim, Haroldo Correa Rocha, o interlocutor destacado para essa fase de transição. Ele vem preparando um cenário de caos para 2015 e os interlocutores do Anchieta não conseguiram desconstruir esse discurso. O debate foi equilibrado com a resposta do secretário de Fazenda, Maurício Duque, em sua prestação de contas na Assembleia esta semana. Duque deu um chega prá lá em Haroldo, levantando suspeição sobre todo aquele discurso de gestão de excelência, fez uma série de denúncias de irregularidades na passagem de Haroldo pela Secretaria de Educação. Mas essa desconstrução deveria ter acontecido antes.
Nerter – Assim como ocorreu tarde demais na campanha eleitoral entre os dois então candidatos, mas agora a questão já foi superada. É verdade que a disputa entre Hartung e Casagrande vai perdurar durante os quatro anos do governo. Isso porque Hartung não tem mais o mesmo capital político de quando chegou ao governo do Estado em 2002 e não tem mais a muleta do crime organizado para desviar o foco da falta de políticas públicas de seu governo. Com a caneta na mão, Hartung vai tentar de todas as formas desconstruir a imagem de seu antecessor, mas Casagrande parece estar disposto a não deixar que o rolo compressor palaciano passe por cima da imagem de seu governo e deve construir condições de rebater as provocações do sucessor. A coisa fica ainda mais séria caso ele tenha disposição de apontar as falhas no futuro governo…
Renata – É claro que se há essa preocupação tão grande por parte de Hartung em relação a Casagrande é porque ele sabe que o capital do governador não é fraco. Ele teve uma votação substancial na eleição, dividiu a classe política e tem todo o tempo do mundo a partir de janeiro para fazer suas articulações. Pode se preparar com calma para o próximo embate, que deve ser a disputa pela prefeitura de Vitória e Hartung sabe que não tem um nome em condições de enfrentar Casagrande. Daí as pedradas. Uma vez conquistada a segunda principal vitrine política do Estado, Casagrande se fortalece para o jogo político de 2018. Além disso, sabemos que o novo mandato de Hartung não será tão simples como foram os anteriores.
Nerter – Ou seja, Hartung não tem mais aquela situação confortável de antes. Está tentando reconstruir o arranjo político e institucional que garantiram sua governabilidade de 2002 a 2010, mas nem todos os elos dessa corrente estão propensos a se unirem. Isso não significa que um grupo de oposição está sendo criado, mas submissão ao Executivo é um tema bem mais complicado de se tratar. Já vimos a reação da Assembleia, querendo assento na discussão da escolha do presidente da Casa, deixou claro que não quer aquela mesma dinâmica de engolir goela abaixo um nome indicado por Hartung. O Judiciário também não é o mesmo dos governos anteriores e a classe política também vê Hartung de outra forma, não de baixo para cima, mas como alguém que caiu do pedestal e agora está misturado aos demais mortais.
Renata – Não se pode descartar a capacidade de articulação política de Casagrande e o caminho é observar o desempenho de seu sucessor. Hartung já começa a dar o tom de seu futuro governo, que não tem muito de diferente de suas passagens anteriores pelo Executivo: controle da classe política, internacionalização da economia, e discursos prontos de desestabilização dos pretensos adversários. Uma lupa sobre suas realizações pode garantir o caminho da construção do palanque de enfrentamento.
Nerter – Não será uma tarefa tão fácil para Casagrande também, já que estará sem o cargo. Mas uma vez tendo enfrentado Hartung e de forma dura, como foi a eleição, ele está fora do grupo do governador eleito e precisa construir um caminho político próprio. Isso é interessante para a democracia, já que Casagrande não terá outra opção senão criar um discurso dissonante. Como ele vai colocar isso em prática? Isso é o que vamos conferir.