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‘Nosso maior erro tem sido reagir e não agir’, aponta epidemiologista

Para Ethel Maciel, faltam saúde básica nos municípios e apoio econômico às famílias. ES tem 7.693 casos e 325 mortes

Integrante do corpo técnico da Sala de Situação para o coronavírus do governo do Estado, a epidemiologista e professora da Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes) Ethel Maciel acredita que “o nosso maior erro [da gestão da crise do coronavírus no Espírito Santo] tem sido reagir e não agir”. 

Numa metáfora de guerra, diz, “estamos sempre defendendo o território”, numa situação de desvantagem em relação ao vírus. Faltam medidas mais preventivas, que dependem de uma ação mais efetiva por parte dos municípios, que devem dedicar “um esforço maior à atenção primária, à saúde da família”, principalmente identificando as pessoas com sintomas gripais, testando e isolando as pessoas e as áreas com maior número de casos. Tudo isso antes da pessoa transmitir a doença e, depois de doente, monitorar os casos nos domicílios”.

Segundo o Painel Covid desta terça-feira (19), o Espírito Santo já confirmou 7.693 casos e 325 mortes pela doença, sendo 536 e 23, respectivamente, nas últimas 24 horas. Até o momento, foram feitos 29.894 testes. Desses, 1.361 desde a atualização anterior do painel, o que mostra a relação de uma confirmação de coronavírus a cada 2,53 testes, uma das mais altas registradas até o momento.

A taxa de ocupação de Unidade de Terapia Intensiva (UTI) já toca o sinal amarelo pela segunda vez consecutiva, atingindo 83,67% dos leitos existentes na Grande Vitoria e 78,13% do total do Estado. Segundo têm afirmado o secretário de Estado da Saúde, Nésio Fernandes, e o governador Renato Casagrande (PSB), a ocupação de mais de 80% dos leitos de UTI dedicados aos pacientes graves de Covid-19 é alerta de colapso do sistema de saúde.

No entanto, desde essa segunda-feira (18), quando esse limite foi extrapolado na região metropolitana, nenhum dos dois gestores declarou qualquer medida de gestão diferente de anunciar a abertura de mais leitos de UTI e o pedido para que a população respeite o distanciamento social e uso de máscaras.

A ampliação na oferta de leitos na rede própria, privada e filantrópica, segundo a Secretaria de Saúde (Sesa), prevê a abertura de aproximadamente 300 novos leitos nesta semana, 100 deles de UTI e o alcance de mais de 1.300 leitos específicos para Covid-19 até o mês de julho.

O próprio secretário, no entanto, é enfático em dizer que nenhum quantitativo de leitos será suficiente se o isolamento social não subir.

“É muito ruim essa estratégia de apenas aumentar o número de leitos”, afirma Ethel. “As pessoas estão morrendo, mesmo com atendimento hospitalar”. Refletindo a postura adotada pelas nações que melhor administraram a crise, a maioria delas coordenadas por mulheres, é preciso isolar mais as pessoas, e dar-lhes condições pra esse isolamento.

É fundamental ainda um maior suporte financeiro e logístico às famílias mais vulneráveis. “Algumas comunidades vão precisar de um lugar para o isolamento”, ressalta, lembrando as vastas áreas das cidades com famílias numerosas dividindo poucos cômodos, que quase impossibilitam o isolamento dos suspeitos e infectados.

E, nesse sentido, as mulheres formam um grupo ainda mais vulnerável. Sem creches e escolas para os filhos, devido à suspensão das aulas presenciais, é sobre as mães que, via de regra, recai a responsabilidade de cuidar dos menores. “Tem que fechar tudo pra que haja alguém em casa para cuidar das crianças e adolescentes”, afirma.

Mas, se o empregador manda a mulher voltar ao trabalho, ou ela deixa os filhos com os avós ou com cuidadores de bairros, em condições inapropriadas, principalmente, sob necessidade de isolamento social, ou ela deixa o emprego. “As mulheres serão mais despedidas”, antevê Ethel. “Tem que pensar nessa mulher que trabalha. O impacto é muito diferenciado sobre a mulher”, salienta.

“Não é só fechar ou não fechar comércio. Essa dicotomia é falsa, não existe. Não tem como abrir comércio e shopping sem pensar na vida das pessoas da classe trabalhadora, que vão pegar ônibus, se aglomerar. Tudo tem que ser pensado de forma global”, orienta.

E essas ações, para além da reação habitual, precisam ser urgentes. Como demonstra a segunda Nota Técnica do Núcleo Interinstitucional de Estudos Epidemiológicos (NIEE) – instituído pela Secretaria de Economia e Planejamento (SEP) e o Instituto Jones dos Santos Neves (IJSN) – assinada por sete técnicos do IJSN e da Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes), “a interação social altera fortemente as proporções da pandemia e medidas adotadas pelo governo refletem diretamente nessas interações”. Porém, “só é possível perceber mudanças no comportamento da pandemia após, em média, 14 dias de mudanças na interação social”.

Segundo os pesquisadores, a partir de dados epidemiológicos do Espírito Santo, um aumento de 5% na interação entre as pessoas provoca um aumento de aproximadamente 22% no número de hospitalizados no dia crítico do período analisado. Já um aumento de 10% na interação social leva um aumento de aproximadamente 48% no número de hospitalizados.


A falsa dicotomia entre saúde e economia será abordada em uma live que em Ethel irá participar, em seu
Instagram, junto com o também professor da Ufes, o economista Arlindo Villaschi, com mediação da professora Adriana Ilha. Nesta quarta-feira (20), às 19h. 

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