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Governo escolhe local para base da PM sem consultar moradores da Piedade

Representantes de ONGs que atuam no Morro da Piedade, no Centro de Vitória, e moradores foram surpreendidos, na manhã dessa segunda-feira (18), com uma coletiva de imprensa convocada pela Secretaria de Estado da Segurança (Sesp). O motivo: anunciar um suposto local para implantação da base da Polícia Militar na comunidade. Vestido a caráter, com colete a prova de balas, o representante da pasta, coronel Ilton Borges, só se esqueceu de um detalhe: consultar e ouvir a comunidade, que também tem suas sugestões a dar sobre o local.  

O Instituto Raízes, ONG que realiza trabalhos sociais no bairro, considerou a coletiva de imprensa um espetáculo midiático, além de total falta de respeito com a comunidade. “Na ultima sexta (15) , em reunião, a Prefeitura de Vitória garantiu que o Centro de Vivência da comunidade seria potencializado com atividades socioculturais, mas hoje [segunda], de forma espetacularizada e sorrateira, o secretário de Segurança anunciou, que este mesmo Centro de Vivência, único lugar que a comunidade tem para acessar internet, elaborar trabalhos escolares e se socializar, pode virar a base da PM. É fácil, tirar pirulito da mão de criança. E é justamente isso que o Estado tenta fazer. Além da falta de diálogo, e nos parece de sensibilidade, a comunidade é vítima da intervenção estatal autoritária e da ausência de políticas públicas eficazes”, disse por meio de nota publicada em suas redes sociais.

A nota completa: “Como é de conhecimento de todos, estamos acompanhando e vivendo tudo o que tem ocorrido no morro, apoiando as famílias, dialogando com as pessoas, estando junto nos momentos mais difíceis. No entanto, a maior surpresa foi devido ao não diálogo com a comunidade e instituições da região sobre o local de instalação da base. Os moradores têm sugestões, mas sequer foram consultados e ouvidos”.

Moradores deixam a comunidade

Desde o ano de 2010, quando os conflitos do tráfico se intensificaram no bairro da Piedade, no Centro de Vitória, 203 pessoas deixaram a comunidade, o que corresponde a 60 residências desocupadas. Os dados são do Grupo Raízes da Piedade, que divulgou mais uma nota na tarde dessa sexta-feira (15). Apenas neste ano, segundo a organização, 128 pessoas se mudaram do bairro, o que representam 40 casas vazias desde janeiro; dados atualizados nesta segunda-feira (18). 

Depois da reunião realizada com a Prefeitura de Vitória na última sexta, foi realizado um mutirão de limpeza, recolhimento de entulhos, pintura de corrimões e vias do Morro da Piedade nesse sábado (16).

Além dessas intervenções imediatas, serão avaliadas e planejadas outras medidas de melhorias para o bairro e equipamentos que atendem à comunidade, como a ampliação e funcionamento do Centro Municipal de Educação Infantil (CMEI) Carlita, com a ideia de ampliar o horário para tempo integral; reorganização dos atendimentos na unidade de saúde do bairro; articulação do CRAS com ações coletivas e sociais; início de práticas esportivas na quadra poliesportiva do bairro e reuniões periódicas para acompanhamento da situação do bairro.

 

Diante do medo que se instaurou no bairro, a comunidade tem utilizado a fanpage do Instituto Raízes para se posicionar.  “Durante toda a semana vimos cenas tristes, emocionantes e estarrecedoras com famílias deixando histórias e a casa própria para trás. Os membros do Raízes, em sua maioria, são frutos da Piedade e viram muitas das casas serem construídas, noites carregando materiais, festas coletivas, brincadeiras e a liberdade que se tinha em circular no Morro, agora tudo pode se tornar ruína e as histórias esquecidas. A alegria e o samba que aqui sempre ecoou, deram espaço para crianças com semblantes entristecidos, idosos lamentando deixar seus lugares que nasceram e criaram seus filhos e netos. Hoje uma família preferiu destruir toda casa a marretada com medo de que ela seja invadida por terceiros. Vivemos uma triste realidade e que nos choca a cada andada pelo morro. O sentimento de destruição que vimos em Mariana – MG, é o mesmo da Piedade”, relataram.

Neste ano, pelo menos, quatro jovens foram assassinados no morro, incluindo os irmãos Damião, 22 anos, e Ruan, 20, crimes que alcançaram grande repercussão no final de março deste ano. Neste mês, Walace de Jesus Santana, 26 anos, foi a vítima mais recente. Foi assassinado próximo ao projeto social Raízes da Piedade, cancelando uma festa junina prevista para o domingo (10). Além do assassinato, os criminosos invadiram a casa da mãe do jovem, onde também morava sua avó de 93 anos, e colocaram fogo nos cômodos. Além dos três jovens, Lucas Teixeira Verli, de 19 anos, por sua vez, foi assassinado no dia 28 de maio. 

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