Assunto virou discussão entre vereadores de direita da Câmara de Vitória

Mais um episódio de violência policial ocorreu no Território do Bem, em Vitória, nesse fim de semana, de acordo com relatos de representantes locais. O assunto tem sido destacado por lideranças comunitárias da região nas redes sociais e motivou discussão na Câmara de Vereadores, em sessão realizada nesta segunda-feira (21).
O caso está relacionado a uma Festa Junina na rua Tenente Setúbal, no bairro São Benedito, que compõe o Território do Bem. A associação de moradores possuía alvará para realização do evento, com interdição do trecho entre a Rua do Chafariz e a Escadaria Botafogo, a partir de sábado (19), às 8h, até domingo (20), às 23h59.
Segundo Vital Ronalt Araújo Ribeiro, liderança comunitária que estava na organização da festa, a Polícia Militar fez uma primeira abordagem aos organizadores às 21h20 de sábado. Um policial teria informado que as atividades deveriam ser encerradas até as 23h, mas Vital rebateu, dizendo que o evento seguiria conforme o alvará que ele possuía.
Após a última atração da programação de sábado, conforme horário estipulado para encerramento, Vital relata que pediu para que o responsável pelo som desligasse os equipamentos. Foi nesse momento, por volta de meia-noite, que policiais militares o teriam surpreendido com agressões, inclusive jogando spray de pimenta no seu rosto.
Ele postou nas redes sociais um vídeo de uma discussão com os agentes de segurança. Nas imagens, Ronalt aparece esfregando a mão no rosto e reclamando com os policiais, que estão com armas em punho. Outros moradores tentam contê-lo. Em dado momento, um dos PMs o empurra e aponta para o seu rosto, gritando: “Some daqui!”.
Na legenda da postagem, apesar de criticar a Polícia Militar, o líder comunitário agradeceu ao prefeito Lorenzo Pazolini (Republicanos) e ao vereador Anderson Goggi (PP), presidente da Câmara Municipal, pelo apoio que teriam dado para a realização da festa.
“Os policiais não tinham nenhuma identificação. Após o ocorrido comigo, eles estavam agredindo outros moradores que estavam no barzinho. Liguei para o 190 [número da Polícia Militar] e foram me orientando. Quando fui buscar o número de identificação da viatura, fizeram uma barreira e começaram a jogar gás, tiros de borracha”, afirma.
A presidente do Instituto Conexão Perifa, Crislayne Zeferina, estava na festa no momento em que ocorreram os episódios de violência e postou uma nota de repúdio nas redes sociais. “Infelizmente, mesmo com todos os esforços de diálogo e cooperação com os órgãos de segurança pública, mais uma vez fomos surpreendidos pela truculência da Polícia Militar, que chegou à nossa festa agredindo moradores e, inclusive, uma liderança comunitária. (…) Até quando teremos que suportar tamanha violência institucional?”, questinonou.
Apesar dos episódios de violência no sábado, no dia seguinte, a festa seguiu até as 22h, sem novas ocorrências.
Direita contra extrema direita
Na Câmara de Vitória, vereadores de direita fizeram críticas à atuação da Polícia Militar. Anderson Goggi tomou a dianteira das críticas, afirmando que cobraria uma resposta do comandante da 4ª Cia da PM, e foi acompanhado por declarações de João Flávio (MDB) e Luiz Paulo Amorim (PV). O presidente da Câmara afirmou que o seu mandato estava presente na festa.
“Não é essa Polícia Militar que eu defendo aqui. Quando vocês chegam na Praia do Canto, e eu frequento a Praia do Canto, vocês chegam jogando gás de pimenta no rosto de alguém?”, questionou Goggi, ressaltando que não estava falando contra a instituição Polícia Militar, e sim repudiando a operação truculenta.
Entretanto, Dárcio Bracarense (PL) saiu em defesa da Polícia Militar. Em discurso na tribuna, o vereador bolsonarista citou outro caso, na Serra, em que “seis traficantes de alta periculosidade” teriam sido soltos por “inércia do Ministério Público”. “Pois eu quero dizer uma coisa para vocês: enquanto o sistema for corrupto e truculento, não tem como a polícia agir de uma forma que não seja igualmente truculenta”, defendeu.
Anderson Goggi, então, decidiu subir novamente na tribuna para rebater Bracarense. “Uma das melhores instituições que existe no Brasil é a nossa Polícia Militar. São os nossos guerreiros das forças de segurança. Mas o que aconteceu na comunidade de periferia nós não vamos aceitar”, disse.
João Flávio, em aparte concedido pelo presidente da Câmara, criticou Bracarense por “distorcer” a fala de quem criticou a ação dos policiais, e os dois começaram um bate-boca. Depois, em novo discurso, Bracarense argumentou que não estava falando de nenhum episódio específico, e sim defendo a Polícia Militar como instituição.
Violência recorrente
Esse foi apenas mais um caso de violência policial registrada no Território do Bem. O Instituto Conexão Perifa acionou o Ministério Público do Espírito Santo (MPES) e as coordenações de Mulheres e Direitos Humanos da Defensoria Pública do Espírito Santo (DPES) em decorrência da ação policial ocorrida no Bonfim, no Território do Bem, no dia 9 de junho, quando foram utilizados sprays de pimenta contra moradores e um rapaz foi baleado com bala de borracha na perna.
Em outubro de 2024, o Fórum Estadual de Insegurança Pública criou um observatório de pesquisa sobre a violência policial. A ideia é fazer uma checagem de dados para averiguar se os números divulgados pelo Governo do Estado condizem com os elencados pelo fórum.
O fórum foi criado após a ocorrência de oito mortes em ações policiais registradas no mês de setembro de 2024 em Vitória. Os crimes foram nas comunidades do Território do Bem, Jesus de Nazareth e Tabuazeiro. A mobilização começou a ser discutida no dia 25 de setembro, após uma manifestação em decorrência do assassinato de Bruno Vieira Lopes da Silva, de 24 anos, e Vinicius Alves de Jesus, de 20, em Jesus de Nazareth.