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Pacto é assinado, mas Estado tem falhas no combate ao feminicídio

Sem políticas efetivas, índices estacionam em níveis alarmantes, aponta Fórum

Com a maior taxa de feminicídio registrada entre os estados do Sudeste, Nordeste e Sul do País no último ano, segundo o Anuário Brasileiro de Segurança Pública de 2024, o Espírito Santo aderiu ao Pacto Nacional de Prevenção aos Feminicídios nessa terça-feira (26), durante o Encontro com Gestoras Estaduais de Políticas para as Mulheres, realizado em Brasília. A assinatura pode trazer avanços, mas esbarra na falta de articulação entre as políticas públicas no Estado, como avalia Edna Martins Calabrez, representante do Conselho Estadual de Defesa dos Direitos da Mulher do Estado (Cedimes) na Câmara Técnica do Pacto Estadual pelo Enfrentamento à Violência contra as Mulheres.

Ela destaca que o feminicídio é apenas a etapa final de um ciclo de violências que deveria ser prevenido por meio de ações concretas de prevenção, diagnóstico preciso e assistência adequada às mulheres em situação de risco. Contudo, o Espírito Santo, mesmo diante da alta taxa de feminicídios, não apresenta políticas preventivas consistentes, nem prioriza investimentos robustos nessa área. “O governo do Estado precisa ter uma perspectiva de maior investimento no enfrentamento, não só do feminicídio, mas da violência de gênero como um todo”, avalia. 

Leonardo Sá

Apesar de já contar com um Pacto Estadual pelo Enfrentamento à Violência contra as Mulheres, estabelecido em 2007 e em processo de atualização, o Espírito Santo não tem priorizado a prevenção nas suas ações orçamentárias, de acordo com a militante do Fórum Estadual de Mulheres e representante do Cedimes. Ela destaca que a ênfase tem sido dada a capacitações para o empreendedorismo, com maior captação de recursos para esse fim do que para o combate à violência. “Não há nenhuma política nova para enfrentar essas violências”, afirma. 

Para Edna, a falta de articulação entre os diversos organismos de gestão pública se traduz em campanhas ineficazes e ações pontuais isoladas que não correspondem à realidade local. Um exemplo disso é o descumprimento da Lei nº 14.541/2023, que determina o funcionamento de delegacias da mulher 24 horas por dia. Em vez de cumprir a legislação, ela aponta que o governo implementa as chamadas “Salas Marias” nas delegacias plantonistas, onde o atendimento precário e o serviço de teleflagrante acabam por revitimizar as mulheres e não garantir o suporte digno e humanizado.

O quadro é agravado, acrescenta, pela carência de servidores na Polícia Civil, argumento usado pela gestão para justificar o não cumprimento da lei. Edna destaca que o atendimento contínuo e especializado é uma reivindicação histórica do movimento feminista, mas a falta de estruturas adequadas perpetua a violência.

Enquanto o governo estadual não articular de forma transversal as políticas públicas para as mulheres, fortalecendo mecanismos como as delegacias especializadas e respeitando os diagnósticos e pactos já estabelecidos, o combate à violência de gênero continuará fragmentado e ineficaz, enfatiza a representante do fórum. “Não basta aumentar penas para feminicidas se não investir em prevenção e olhar para a realidade das mulheres”, pontua. 

O Pacto Nacional de Enfrentamento ao Feminicídio foi instituído pelo Decreto nº 11.640/2023, que estabelece 73 ações governamentais com objetivo de reduzir o número de feminicídios e outras formas de violência e discriminação contra mulheres e meninas. As ações focam na promoção da transversalidade de políticas públicas e incentivam uma abordagem de gênero, incluindo suas interseccionalidades, de forma a englobar as diversas realidades vividas pelas mulheres em diferentes contextos. 

Fabio Rodrigues-Pozzebom/ABr

Subnotificação 

A subnotificação de tentativas de feminicídio, muitas vezes registradas sob outras tipificações, continua sendo um grande desafio para a criação de políticas públicas eficazes no Estado. Edna destacou o caso de uma moradora de Vila Velha vítima de tentativa de feminicídio, que exemplifica as dificuldades enfrentadas por mulheres em situação de risco para que o Estado garanta sua segurança. “O processo foi arquivado inicialmente, e sequer aplicaram com ela o formulário de risco, que é obrigatório. O agressor foi solto duas vezes, e agora ela vive sob ameaça constante, sem liberdade de ir e vir”, afirmou. 

‘Secretaria ineficiente’ 

No Espírito Santo, o número de feminicídios, conforme dados do Anuário da Segurança Pública e da Secretaria de Estado de Segurança Pública (SESP-ES), permaneceu o mesmo em 2022 e 2023, com 35 casos por ano. No entanto, esse número já foi alcançado novamente antes de dezembro de 2024. Para a representante do Fórum Estadual de Mulheres, os resultados deste ano revelam que a Secretaria Estadual de Políticas para as Mulheres, criada em 2023, tem sido ineficiente.  

“Não adianta assinar o Pacto Nacional se não houver mudança efetiva nas políticas públicas e na articulação dessas políticas, porque senão fica só no discurso, como é hoje. Se os números permanecem os mesmos, pode-se concluir que a secretaria não cumpriu seu papel de articular políticas de enfrentamento de forma integrada”, reiterou.

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