Esta semana aconteceram dois fatos curiosos que ilustram o paradoxo da Justiça. Num dos episódios a Justiça se mostrou um tanto lenta, burocrática, pesada, arrastada. No outro, mudou da água pro vinho. Foi célere e lépida, sem amarras, desburocratizada. Resultado, deu andamento em um processo em menos de 48 horas. Uma marca invejável. Quanta eficiência!
O processo relâmpago envolveu este jornal eletrônico que o leitor, neste momento, prestigia com seu precioso tempo. Obrigado! Nessa sexta-feira (30), como tem se repetido quase que semanalmente, os responsáveis por este jornal foram intimados a comparecer a mais uma audiência. São tantas que já dá para marcar os compromissos antes ou depois da audiência. Igual ao que acontece com a chuva em Belém do Pará.
Horas antes da audiência, marcada para Quarta Vara Criminal de Vitória, havia um dúvida no ar se o expediente do fórum estaria normal ou não, pois, momentos antes, devido à manifestação que parou a Grande Vitória na última sexta, o Tribunal de Justiça do Espírito Santo (TJES) facultou aos juízes a decisão de manter ou suspender as audiências agendadas. A nossa, obviamente, foi mantida. Pudera, depois de tanta correria, todo esse esforço não seria em vão por causa de um corriqueiro protesto. “Os réus que se virem para chegar”, devem ter pensado.
A celeridade da Justiça causou espanto no caso de Século Diário e jogou por terra uma pesquisa feita pela Universidade de São Paulo (USP Ribeirão Preto) que queria saber a opinião dos advogados sobre a lentidão da Justiça brasileira. Dos 15 mil advogados ouvidos em todo o país, 98,9% consideraram a Justiça lenta. Mas isso parece não ser uma regra.
Na segunda-feira (26), a intimação dos jornalistas de SD já estava na Central de Mandados. No dia seguinte, 27, o oficial de Justiça já estava na rua atrás de um dos jornalistas. Foi na casa de um deles, mas ele já havia saído para o trabalho.
No dia seguinte, 28, o bote foi certeiro. Pela manhã, o oficial de Justiça chegou na Redação quase junto com o jornalista. Intimação em mãos, a missão estava cumprida. Data da audiência, 30 de agosto, ou seja, dali a 48 horas.
Chamou a atenção do jornalista um detalhe. A intimação trazia a epígrafe: “réu preso”. Ou seja, a juíza Gisele Souza Oliveira se valeu do expediente de recorrer ao caminho mais curto (réu preso) para não perder tempo. O “atalho” que passou a funcionar há cerca de um ano no TJES, evita que um intimação normal, que pode levar até quatro longos meses para notificar o destinatário, chegue em 24 horas. Sensacional!
Detalhe, vale registrar que a autora da ação é a procuradora Inês Thomé Taddei. É difícil não cismar que as coisas só voaram em função da autora. Se a ação partisse de um cidadão comum a rapidez seria a mesma? Os números e a percepção do cidadão comum não mostram isso.
Mas a Justiça bonachona e sedentária é a que prevalece. E muitas vezes a morosidade passa a ser estratégica. Neste caso, também é sempre recomendado dar um espiada em quem está por trás da causa. Dependendo do autor e do réu, o andamento processual, emprestando o nomenclatura musical, pode ser “gravíssimo” (extremamente lento) ou “prestíssimo” (com toda a velocidade e presteza).
Faz cinco meses que a Justiça tenta localizar o paradeiro do ex-gerente da Secretaria de Transportes e Obras Públicas (Setop) Luiz Cláudio Abrahão Vargas, um dos oito acusados de participação nas supostas fraudes envolvendo a construção do “Posto Fantasma” de Mimoso do Sul, que custou R$ 25 milhões aos cofres públicos do Estado, mas que não saiu da fase de terraplanagem.
Tal qual o posto, o ex-servidor também segue “sumido”. Enquanto Vargas não aparece, o processo, ajuizado no início de março deste ano, segue travado.
Um dos efeitos práticos dessa lentidão impede a localização do ex-gerente é o adiamento do exame da liminar solicitado pelo promotor de Justiça, Dilton Depes Tallon Netto, da decretação da indisponibilidade dos bens de todos os envolvidos no caso, entre eles o ex-governador Paulo Hartung (PMDB), José Teófilo de Oliveira (atual sócio de Hartung no escritório de consultoria Éconos); Bruno Pessanha Negris (ex-presidente e atual diretor do Banestes); o ex-secretário de Transportes e Obras Públicas Neivaldo Bragato (atual presidente da Companhia Espírito-Santense de Saneamento, a Cesan), e o ex-diretor-geral do DER-ES Eduardo Antônio Mannato Gimenes – que ainda ocupa cargo de direção no órgão. Tanta gente importante envolvido e nada do modesto ex-gerente.
O processo envolvendo o “Posto Fantasma”, pelo andamento, talvez se encaixe melhor na fusão de dois ritmos musicais: “gravíssimo adagio” (extremamente lento, de expressão terna e patética).