No filme O Capital, do grego Costa-Gavras, em cartaz nas salas de cinema do Brasil, o executivo de banco que faz o papel central admite, no final, em conversa com a esposa, que sua vida depende de D. Conjuntura, “uma senhora gorda que comanda tudo”, na economia e até na política. Ele não disse, mas digo: D. Conjuntura é filha natural de Don Mercado, o supremo comandante dessa barca impune.
D. Conjuntura é a suprema ironia de um filme que gasta quase duas horas tentando retratar o jogo pesado das altas finanças internacionais. Digo tentando porque no final fica um gostinho de fraude. No fundo, Gravas faz uma comédia dramática com bons momentos. Por exemplo, diante da necessidade de demitir 10% do pessoal do banco, a esposa do executivo o aconselha a “fazer como Mao Tse Tung na revolução cultural da China: use os jovens para derrubar os velhos”.
Perto do final, depois de explorar a fundo os sórdidos bastidores do mundo financeiro – chantagem, desperdício, espionagem, lavagem de dinheiro, luxo e alta tecnologia de comunicação, demissões em massa, traições em cadeia, assédio moral e sexual –, o executivo que virou presidente do banco sugere que vai saltar da barca. Porém, diante do aplauso dos representantes do Mercado, decide permanecer no poder. É um fraco! Ou é um forte?
Para encerrar, se vira para o espectador perplexo e comenta: “São crianças que ficarão aplaudindo até que tudo exploda.” A mensagem final é essa: a coisa vai acabar mal. Será mesmo?
A História mostra que o capitalismo se reinventa a cada crise (a propósito, o banco do filme O Capital chama-se Phoenix, nome da ave mitológica que renasce das cinzas). Portanto, é de duvidar que se confirme a previsão do personagem de Costa-Gravas.
Sem querer ser cineasta nem nada, gostaria de acrescentar apenas que na vida real D. Conjuntura é mãe solteira de um casal de gêmeos, internacionalmente conhecidos como Mr. Crédito e Mme Dívida. São siameses. Alimentam–se de juros. Preferencialmente de juros de dois dígitos, como se tornou notório no Brasil neoliberal e privatista. São amparados por dois lemas inculcados a ferro e fogo no inconsciente coletivo da população:
1 – Devo, logo existo
2 – Se me dão crédito, é sinal de que estou vivo
LEMBRETE DE OCASIÃO
“Quando o governo está com os trabalhadores, fala em defesa da agricultura familiar. Mas na prática faz diferente. Na prática, o que nós vemos, é um apoio total e irrestrito ao agronegócio”
Valmir Noventa, líder da agricultura familiar no Espírito Santo