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Escritoras negras do Estado fazem lançamento coletivo de livros no próximo sábado

Publicações visam garantir voz, construir memória e debater o racismo em suas mais variadas faces

Apesar da abolição da escravatura, o racismo persiste no Brasil, violentando principalmente as mulheres negras, que, em diversas áreas, se empenham na luta antirracista. No Espírito Santo, quatro escritoras, por meio de suas obras, buscam se fazer ouvir, construir memória e debater o racismo em suas mais variadas faces. Lavínia Coutinho Cardoso, Olindina Cirilo Nascimento Serafim, Bárbara Cazé e Selma dos Santos Dealdina lançarão um livro, cada uma, no próximo sábado (28), em evento virtual organizado pelo Núcleo Estadual de Mulheres Negras do Espírito Santo.

O lançamento será às 19h, com transmissão pelo canal do YouTube da Coalização Negra por Direitos. Selma dos Santos Dealdina lançará Mulheres quilombolas: territórios de existências negras femininas, organizado por ela e que contará com textos de 18 autoras, sendo 17 quilombolas de todo o Brasil, que divulgam, por exemplo, seus estudos de mestrado e doutorado. Segundo Selma, que é da comunidade quilombola Angelim III, no Sapê do Norte, as temáticas são variadas, como a educação e a relação com as sementes, sempre partindo da vivência das mulheres nas comunidades.

Selma Dealdina. Foto: Divulgação

A organizadora do livro, lançado pela editora Jandaíra, é autora de um dos capítulos, no qual fala da resistência das mulheres negras nos movimentos sociais. Na apresentação da obra, rememora pessoas que se destacaram na luta antirracista, como Negro Rugério e Silvestre Nagô, de quem é trineta. “Silvestre Nagô comprava alforrias, ajudou a proteger um quilombo em Conceição da Barra. Andava de fraque e descalço. Dizia que continuaria a andar descalço enquanto todos negros não pudessem calçar. De acordo com o que defendia, estaria descalço até hoje”, diz Selma. A quilombola afirma que é importante para a população negra conhecer a história de resistência de seu povo.

Assim como Selma, Olindina Cirilo Nascimento Serafim também é quilombola do Sapê do Norte, antigo território formado pelos municípios de São Mateus e Conceição da Barra. Ela lançará o livro O caminho do quilombo: histórias não contadas na educação escolar quilombola: território do Sapê do Norte, da editora Appris. Fruto de sua dissertação de mestrado, o livro traz estudos sobre a educação escolar quilombola, especialmente no território ao qual a autora pertence.

Olindina publicou em livro sua dissetação de mestrado. Foto: Redes sociais

O livro traz como um de seus debates a necessidade de repensar os currículos e as práticas pedagógicas para avançar na redução das desigualdades sociorraciais, salientando que a escola precisa se tornar um espaço de discussões das questões sociais que envolvem a vida dos educandos de todos os seguimentos sociais e raciais. Nesse contexto destaca-se, ainda, a importância da memória para as comunidades quilombolas, da preservação de seus valores, das práticas religiosas, das técnicas e outras expressões culturais.

Lavínia Coutinho Cardoso é autora do livro Revolta do Queimado: Negritude, Política e Liberdade no Espírito Santo, da editora Appris, no qual afirma que a revolta de Queimado, na Serra, é o mais importante evento pela libertação dos negros escravizados da história do Estado. A publicação é resultado de sua dissertação de mestrado, na qual estudou o processo de busca pela libertação dos negros de Queimado, que não começou, segundo ela, com a suposta negativa de um padre em alforriar os escravizados que trabalharam na construção de uma igreja na região. 
A historiadora recorda que o contexto em que ocorreu a revolta era de medo do aquilombamento por parte da sociedade, de muitas revoltas, como a dos Malês, em Salvador, na Bahia. “O Século XIX tem toda uma onda de revoltas, é um século de insurgência em diversos pontos”, relata. Lavínia ressalta que isso pode ter influenciado a revolta de Queimado, que teve como uma de suas lideranças o negro Eliziário, um dos articuladores da participação dos negros na construção da igreja.
Lavínia ressalta Queimado como o maior evento pela libertação dos negros no Estado. Foto: Zélia Siqueira

Lavínia salienta que, além das revoltas, era um contexto em que os negros obtinham alforria diante de alguns feitos, como os que foram libertos após participação na Guerra do Paraguai. Possivelmente, afirma, Eliziário convidou os escravizados argumentando que receberiam alforria, culminando na insurreição diante da recusa do padre em cumprir uma promessa que pode não ter sido feita. Essa articulação pela libertação é o que a historiadora chama de síncopa libertária. 

O termo síncopa, na música, como ela explica, significa improviso, sendo, portanto, no espaço do improviso, do cotidiano, que os negros criavam ações emancipatórias. Lavínia recorda que, após eclosão da revolta, a milícia saiu do Colégio São Tiago, onde hoje é o Palácio Anchieta, no Centro de Vitória, rumo ao local, e mataram vários negros no meio do caminho. Além disso, Eliziário foge e Chico Prego, outra liderança, morre. “Queimado é um evento importante não por causa da violência, mas pelo protagonismo e engenhosidade daqueles negros”, pontua.

O livro organizado por Bárbara Cazé reúne sete ensaios

Já o livro Mulheres Negras na Tela do Cinema, organizado por Bárbara Maia Cerqueira Cazé, conta com sete ensaios e foi pensado a partir das atividades do Cineclube Afoxé, que realiza exibição de filmes e debate em Vitória, com foco em curtas-metragens produzidos por negras e negros. Na publicação são analisadas as obras Braços Vazios, de Daiana Rocha (ES); Casca de Baobá, de Mariana Luiza (RJ); Deus, de Vinícius Silva (SP); Mulheres de Barro, de Edileuza Penha de Souza (ES); Nada, de Gabriel Martins (MG); Tia Ciata, de Mariana Campos e Raquel Beatriz (RJ); e Travessia, de Safira Moreira (RJ). 

Todos esses filmes foram exibidos pelo cineclube e quem os analisa no livro são mulheres negras, acadêmicas, em sua maioria jovens, com formações em diferentes áreas, que participaram como debatedoras nas exibições do Cineclube Afoxé. Barbara escreveu um dos artigos do livro. As outras escritoras que participaram são Andreia Teixeira Ramos, Eliane Quintiliano, Keila Mara, Mara Pereira, Renata Beatriz Rodrigues da Costa e Tamyres Batista. O prefácio é de Edileuza Penha de Souza, professora, pesquisadora e cineasta capixaba que recentemente conquistou o prêmio de melhor documentário com seu curta-metragem Filhas de Lavadeiras, no Festival É Tudo Verdade, um dos mais importantes do gênero no país.

“São temáticas que afetam as mulheres negras: memória, família, trabalho, amor, maternidade, mobilidade social, políticas públicas de acesso e permanência à universidade e, claro, cinema. Um cinema pensado e realizado a partir do ponto de vista de pessoas negras”, aborda Bárbara sobre as abordagens feitas pelos textos. “Escrevemos porque nos autorizamos a escrever, inspiradas em mulheres negras como Carolina Maria de Jesus e Lélia Gonzalez e todas as que vieram antes de nós e ousaram”, destaca.

Todos os livros estão disponíveis no site das editoras. 


Novo livro reflete sobre atuação de mulheres negras no cinema

Coordenado por Bárbara Cazé, obra reúne análises a partir de filmografia e debates organizados pelo Cineclube Afoxé


https://www.seculodiario.com.br/cultura/novo-livro-retrata-atuacao-das-mulheres-negras-no-cinema

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