Sexta, 03 Mai 2024

Derrama: controvérsia jurídica encobre fraudes milionárias apontadas nas investigações

Derrama: controvérsia jurídica encobre fraudes milionárias apontadas nas investigações

O pedido de arquivamento das investigações da Operação Derrama, feito pelo procurador-geral de Justiça Eder Pontes da Silva, lançou uma “cortina de fumaça” sobre o conteúdo do inquérito, que evidenciou a existência de uma quadrilha por trás do esquema de recuperação de créditos tributários em prefeituras. No texto, os delegados do Núcleo de Repressão ao Crime Organizado e à Corrupção (Nuroc) apontam repasses indevidos de até R$ 21,3 milhões, dinheiro que teria alimentado um sistema de propinas a agentes públicos.



De acordo com as investigações, a empresa de consultoria CMS Assessoria e Consultoria Ltda teria recebido pagamentos indevidos na ordem de R$ 12,4 milhões entre 2007 e 2012. A maior fatia desses recursos veio dos caixas das prefeituras de Aracruz, onde o escândalo foi denunciado inicialmente pelo Tribunal de Contas do Estado (TCE), R$ 4.735.874,86, e de Linhares (ambos os municípios localizados na região norte do Estado), R$ 4.398.204,49.



Em seguida, as equipes da Polícia Civil identificaram os repasses oriundos das prefeituras localizadas na região sul capixaba: Itapemirim, R$ 2.500.007,76 – com destaque para os repasses efetuados em “anos eleitorais”, cerca de 90% dos pagamentos ocorreram em 2010 e 2012; Anchieta, R$ 447.522,60 nos anos de 2009, 2010 e 2012; e Marataízes; R$ 319.862,44 entre 2009 e 2012.



Esses valores não incluem os pagamentos de gratificações a servidores públicos municipais, que também recebiam uma parte dos tributos recuperados sob justificativa de uma comissão a ser recebida por fiscais e gerentes de tributação. Somente em Aracruz, os servidores teriam ficado com R$ 8,9 milhões entre 2007 e 2012 – embora o próprio secretário municipal de Finanças, Durval Valentim Blank, um dos indiciados, tenha declarado em depoimento que desconhecia os critérios de pontuação para o repasse das comissões.



Da mesma forma que ocorreu em Aracruz, os demais contratos da CMS também previam o mesmo tipo de pagamento à empresa, “ressalvadas alguma peculiaridade em cada contrato, legislação e decretos”, ressalta o relatório policial com mais de 130 páginas.



Durante o cumprimento dos mandados de busca e apreensão na sede da empresa de consultoria e nas prefeituras, ocorrido na primeira fase da operação, em dezembro do ano passado, os policiais encontraram processos contábeis dos municípios em poder dos sócios da CMS, inclusive, documentos com “timbre da CMS, porém, assinados por prefeitos municipais”, apontou o inquérito.



No entendimento dos delegados do Nuroc, os documentos assinados pelos então prefeitos reforçam a participação deles no esquema de fraudes. As investigações também apontaram a existência de distribuição de propina pela CMS a pessoas que não foram identificadas devido as limitações impostas às investigações. Durante a quebra do sigilo bancário dos sócios da empresa [o auditor fiscal da Prefeitura de Vitória, Cláudio Múrcio Salazar Pinto, e do  filho, Cláudio Múrcio Salazar Pinto Filho] foi levantada a evidência de lavagem de dinheiro, de acordo com o relatório.



“Constatou-se a existência de um padrão de saques efetuados na conta da CMS, todos no valor de R$ 1,5 mil nos meses de fevereiro e março de 2012, além de vultosas quantias movimentadas na conta que chegam ao valor aproximado de R$ 1,2 milhão”, destaca o texto. 



Relatório contradiz Pontes 



Mesmo sem a apreciação do mérito das investigações pelo procurador-geral, o relatório final da Derrama expõe graves contradições nos posicionamento do chefe do Ministério Público Estadual (MPE), que recomendou o arquivamento do caso. Ao contrário das suspeições lançadas por Eder Pontes – rebatidas pela entidade ligada aos delegados da Polícia Civil nesse domingo (3) –, o relatório final aponta que todas as regras sobre o foro competente pelas investigações foram cumpridas.



Apesar da suspeição lançada pelo procurador-geral, no que chamou de “fixação em atribuir a competência no juízo de Vitória”, o inquérito policial esclarece que a operação partiu das ilegalidades na operação da CMS para então desvendar as relações da empresa com as prefeituras e não o contrário. No texto, os delegados do Nuroc indicam que o “centro decisório da organização criminosa” era operado na sede da CMS, localizada em um prédio na Avenida Nossa Senhora da Penha (conhecida como Reta da Penha), principal centro financeiro e empresarial da Capital capixaba.



“A organização criminosa articulou-se e teve como ponto fulcral o município de Vitória, nos meandros dos recintos fisicamente instalados na CMS. Depreende-se pelo alicerce indiciário existente nesta investigações que os desdobramentos fáticos deste grupo delituoso foram deflagrados a partir daqueles arranjos criminosos, verdadeiramente estruturados de uma quadrilha focada quanto à sua gênese no cometimento de crimes diversos, como consequência de formação de uma ampla rede de atuação nos municípios indigitados”, esclarecem.



Sobre a apurações das irregularidades envolvendo a CMS, as investigações partiram da própria formação da empresa, cuja presença do auditor Cláudio Múrcio Salazar contrariava até mesmo o Estatuto dos Servidores Públicos de Vitória, que proíbe os servidores de participarem de empresas e outros tipos de sociedade. Em seguida, os trabalhos elucidaram a ilegalidade na contratação de empresas de consultorias atuarem em funções que deveriam ser desempenhados pelo Estado, neste caso, a autuação de devedores de tributos – na forma da denúncia do TCE.



Apenas depois que as investigações se voltaram para as possíveis ramificações das quadrilhas nos municípios, circunstância diferente daquela apontada por Eder Pontes ao solicitar o desmembramento das investigações para o relator do inquérito policial, desembargador Ronaldo Gonçalves de Sousa. A previsão é de que o magistrado se manifeste esta semana sobre os pedidos de Pontes para a soltura dos envolvidos e o arquivamento do inquérito da Derrama.

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