Sábado, 04 Mai 2024

Justiça suspende repasses de verbas para Instituto Sincades

Justiça suspende repasses de verbas para Instituto Sincades

A Justiça capixaba determinou uma intervenção no Instituto Sincades, fundo criado no governo Paulo Hartung (PMDB) que prevê um percentual dos incentivos fiscais destinados ao setor atacadista. Nas transações comerciais os empresários beneficiados recebiam como incentivo a redução de 12% para apenas 1% da alíquota do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS). Deste percentual eles destinavam um décimo ao fundo privado de investimento em cultura, criado ao arrepio da legislação.



Pela complexidade da questão, o juiz da 3ª Vara dos Feitos da Fazenda Pública Estadual, Arion Mergár, acatou nessa segunda-feira (18) o pedido de liminar para suspender os repasses de dinheiro público ao instituto. “Sendo assim, o periculum in mora [do latim, perigo na demora] se encontra na medida em que a transferência de valores oriundos da redução na cobrança do ICMS para conta particular do Sindicato do Comércio Atacadista e Distribuidor do Espírito Santo (Sincades) pode, a princípio, gerar um prejuízo aos cofres públicos, lesão que pode ultrapassar as barreiras deste Estado e interferir no equilíbrio financeiro de outros Estados da Federação”, avaliou.



Na ação popular (024.13.004509-9), o estudante de Direito Sérgio Marinho de Medeiros Neto pede a nulidade dos incentivos fiscais concedidos ao setor. Entretanto, o magistrado interveio apenas na parte referente às atividade do instituto. O fundo foi criado em agosto de 2008 para cuidar da contrapartida dos benefícios concedidos pelo então governador Paulo Hartung, que também figura no processo.



Na decisão, o juiz Arion Mergár determinou o depósito judicial, em conta aberta com esta finalidade, “de todo e qualquer repasse de verbas provenientes do convênio firmado entre o Estado do Espírito Santo e o Instituto Sincades”. A sentença também fixou multa diária no valor de R$ 10 mil a ser pago pelo gestor encarregado pelos repasses no caso de descumprimento da liminar.



Sobre o exame da legalidade dos benefícios fiscais, o juiz Arion Mergár determinou a remessa de cópia de toda documentação sobre o convênio entre o Estado e o Sincades para o Ministério Público Federal (MPF), pois se trata de matéria pertinente à Justiça Federal, já que, entre outras coisas, as transações comerciais – em sua maioria, interestaduais – ameaçam os cofres de outros Estados em função da chamada “guerra fiscal”, como observou o magistrado.



“Para que isenções de ICMS surjam validamente é preciso que os Estados e o Distrito Federal celebrem entre si convênios, para se transformarem em direito interno de cada uma destas pessoas políticas, que deverão ser por elas ratificados. O instrumento idôneo da ratificação, longe de ser o decreto do governador, é o decreto legislativo (estadual ou distrital, conforme o caso)”, observou.



Mas o fundo privado foi criado por Hartung sem a autorização da Assembleia Legislativa ou com a ciência do Conselho Nacional de Política Fazendária (Confaz). A medida provoca uma renúncia fiscal na ordem de R$ 620 milhões por ano .







Esta é a primeira ação movida contra os deferimentos fiscais concedidos durante a gestão do peemedebista. Apenas o setor atacadista é beneficiado com incentivos desde o ano de 2003, ainda que de forma individual à época. Já o sindicato da categoria, criado no ano de 2007, passou a ser contemplado em agosto do ano seguinte – quando foi criado o Instituto Sincades.



Neste período, o setor registrou um crescimento de 62% no faturamento do setor – passou de R$ 10,8 bilhões em 2008, para uma previsão de R$ 17,6 bilhões para o ano passado, segundo dados do Relatório de Atividades do instituto. Fato que criou uma verdadeira corrida de novas empresas atacadistas que se inscreveram para atuar no setor. Hoje, o setor abriga 630 empresas em vários segmentos (medicamentos, autopeças, higiene e alimentos). Em 1999, o Espírito Santo tinha apenas 15 empresas no segmento.



Considerando o período desde a instituição dos primeiros benefícios concedidos ao setor (deferidos de forma individual no primeiro ano do governo de Hartung, em 2003), o crescimento foi de quase 400%, saltando de 156 empresas para o patamar atual. Em termos de comparação, o número de negócios registrados até o final de 2008 (ano de assinatura dos incentivos que estenderam as benesses para todas as empresas do setor) era de 344, quase metade do volume de negócios registrados hoje.



O autor da ação popular chegou a pedir o bloqueio dos bens do Sincades, o Instituto Sincades (e de seu presidente, Idalberto Luiz Moro), além de uma intervenção judicial na organização do fundo, mas o juiz negou o pedido sob alegação da falta de elementos suficientes para o dimensionamento dos pleitos que poderão voltar a ser analisados após a fase de defesa prévia.



O estudante de Direito, Sérgio Neto, também pediu a inclusão como parte (litisconsortes passivos) no processo do ex-governador Paulo Hartung, do ex-subsecretário de Desenvolvimento do Estado, Luis Carlos Menegatti e do ex-secretário de Finanças, Bruno Pessanha Negris (atual presidente do Banestes), que autorizaram os atos sob suspeição. Pedido no qual não há ainda a manifestação do juiz. Na decisão, o magistrado determinou a citação de todos os requeridos.



Esse “ambiente favorável” criado para o setor rendeu todas as homenagens do Sincades ao ex-governador Paulo Hartung, que venceu o troféu “Elo de Liderança”, concedido na grande solenidade anual do sindicato, no final de 2010 (último da gestão do peemedebista). Nos autos da ação popular, o estudante revela uma outra faceta dessa liderança. “Na hipótese, verificamos que parte dos impostos está [sendo] destinada ilegal e imoralmente a uma entidade privada”, afirma Sérgio Neto.



Alvo de críticas de entidades culturais e artistas locais, o Instituto Sincades não apresenta a prestação de contas dos valores repassados, porém, a ação estima que o dano ao erário possa chegar a R$ 30 milhões: “Os pedidos desta ação estão voltados para impedir a dilapidação da verba de imposto que está sendo entregue por vinculação ilegalmente à iniciativa privada. [...] Ademais, o governo não está demonstrando a compensação da renúncia de receita com vantagens superiores aos R$ 620 milhões. Tampouco está demonstrado que o ‘acordo de competitividade’ esteja sendo respeito em suas cláusulas”, esclarece um trecho da decisão.

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