Domingo, 28 Abril 2024

Aracruz é condenada a fazer EIA/Rima de projeto que desviou a bacia do Rio Doce

Aracruz é condenada a fazer EIA/Rima de projeto que desviou a bacia do Rio Doce
A Aracruz Celulose (Fibria) foi condenada pelo Tribunal Regional Federal da 2ª Região a realizar e bancar o Estudo e Relatório e Impacto Ambiental (EIA/Rima) relativo ao projeto de transposição de bacias do Rio Doce para o Rio Riacho, no município de Aracruz, norte do Estado. O desvio foi feito em 1999 para abastecer a fábrica C da empresa, alterando drasticamente o comportamento hídrico da região. O processo foi marcado por irregularidades, com conivência do poder público municipal e estadual. 
 
A decisão do desembargador federal Reis Friede foi publicada nesta quarta-feira (27) e dá prosseguimento à sentença da Justiça Federal que acata parcialmente pedido feito em ação civil pública movida inicialmente pela Associação Capixaba de Proteção ao Meio Ambiente (Acapema) e assumida posteriormente pelo Ministério Público Federal (MPF).  
 
Friede negou apelação da empresa e dos demais réus do processo, o município de Aracruz, o governo do Estado - Secretaria de Estado de Meio Ambiente (Seama) - e o Instituto Brasileiro de Meio Ambiente e Recursos Naturais Renováveis (Ibama).
 
Além da Aracruz Celulose, o município de Aracruz também foi condenado à realização do estudo, que deverá ser concluído no prazo máximo de seis meses, sob multa diária e solidária aos réus, que pode variar de R$ 10 mil a R$ 100 milhões. Caberá à empresa arcar com todos os custos e contratar empresa especializada para o desenvolvimento dos trabalhos.
 
A decisão determina ainda que o estudo e relatório calculem o valor pecuniário para solucionar o impacto ambiental e os problemas decorrentes da aprovação das licenças ambientais, com soluções estimadas de questões futuras.  
 
Após concluído, o EIA/Rima terá que ser apresentado ao governo do Estado e ao Ibama. O governo terá que realizar a devida análise do documento, com oitiva do Ibama, condenado a acompanhar os procedimentos administrativos para decisão ao EIA, inclusive sobre a manutenção do licenciamento ambiental.
 
A Aracruz Celulose e o município de Aracruz também foram condenados a fazer, de modo contínuo, a canalização das águas do Rio Doce para os Sistemas de Abastecimento Público dos Distritos de Vila do Riacho e Barra do Riacho. No caso de descumprimento, será aplicada multa aos réus no mesmo valor, entre R$ 10 mil e R$ 100 milhões.
 
Nos autos do processo, o município de Aracruz tenta se livrar de responsabilidade, alegando que a competência do licenciamento é do governo do Estado. Já a Aracruz Celulose aponta “ausência de dano ambiental”. Os dois réus afirmam ainda que a Declaração de Impacto Ambiental (DIA) seria suficiente para o licenciamento e questionam a competência da Justiça Federal no julgamento do caso. O Ibama também nega sua omissão. Nenhum argumento, porém, foi acatado pelo desembargador Reis Friede. 
 
As irregularidades no processo contaram com conivência do então prefeito de Aracruz Luiz Carlos Cacá Gonçalves e o então secretário de Estado de Meio Ambiente, Almir Bressam. Em 2005, o sucessor de Cacá, Ademar Devens, igualmente sob o pretexto de aumentar a disponibilidade hídrica nas várzeas do Rio Riacho nos municípios de Aracruz e Linhares e, assim, desassorear o canal Caboclo Bernardo, conseguiu novo licenciamento ambiental para desviar o Rio Doce, agravando os impactos já existentes. 
 
Histórico de crimes
 
Com a transposição das bacias, foi construído o Canal Caboclo Bernardo, perpendicularmente ao Rio Doce, ligando-o ao Rio Comboios, o que possibilitou a captação das águas dos canais de drenagem do Departamento Nacional de Obras de Saneamento (DNOS), construídos nos anos de 1960, o Canal do Riacho, o Rio Riacho e o Rio Comboios. A água captada percorre uma extensão superior a 40 quilômetros, como apontam estudos publicados pela Federação dos Órgãos para Assistência Social e Educacional (Fase) no Estado. 
 
Os impactos da transposição atingiram principalmente as aldeias indígenas Tupinikim, localizadas em frente à fábrica da empresa em Aracruz. O Rio Comboios, antes utilizado para agricultura de subsistência, pesca e pastoreiro, ficaram secos e contaminados, transformando-se em um reservatório de doenças. 
 
Outros prejudicados foram os pescadores de Vila do Riacho e Barra do Riacho, já que os impactos do canal agravaram os problemas da redução dos estoques de pescado, existentes na região desde a construção do Portocel, terminal especializo da empresa, que iniciou suas operações em 1978. 
 
O desvio resultou ainda no estreitamento da Boca da Barra, provocado por bancos de areia formados pelo mar, tendo como consequência a diminuição do fluxo de água no Rio Riacho. O assoreamento impede que as embarcações de pesca artesanal cheguem ao mar durante a maré baixa, limitando a atividade. 
 
Na região, também geram impacto aos recursos hídricos os efluentes jogados no mar pela Aracruz Celulose, sem tratamento, e a abertura de estradas de transporte de eucalipto. Quem controla os níveis de água do Rio Riacho é a própria empresa, que abre as comportas de acordo com sua necessidade. 
 
Para as fábricas A e B, a Aracruz Celulose construiu um sistema integrado de reservatórios, transpondo rios a partir de desvios e barragens, que passaram a ser de uso exclusivo dela. 
 
O consumo diário de água para produção de celulose é de 248 mil metros cúbicos, suficiente para abastecer uma cidade de 2,5 milhões de habitantes, equivalente à população da Grande Vitória. Segundo os pesquisadores Daniela Meirelles e Marcelo Calazans, se a água utilizada pela empresa fosse captada, tratada e distribuída pela Companhia Estadual de Saneamento (Cesan), a conta se aproximaria de R$ 16 milhões mensais, sem considerar o consumo de outras unidades e suas expansões no País. 

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