Quinta, 02 Mai 2024

Brasil registrou quase metade das mortes de ambientalistas e defensores de terra no mundo

Brasil registrou quase metade das mortes de ambientalistas e defensores de terra no mundo
"Proteger o ambiente nunca foi tão importante, nem tão mortífero". Com essas palavras começa o estudo da ONG de direitos humanos Global Witness, divulgado nessa terça-feira (15), denunciando que o Brasil registrou quase a metade das estatísticas mundiais de assassinatos de ambientalistas e de defensores da terra. Entre 2002 e 2013, o país concentrou 448 assassinatos a militantes que defendem essa causa, seguido com uma larga margem por Honduras (109) e Filipinas (67).
 
O relatório Deadly Environment, publicado no 25º aniversário do assassinato do seringueiro e ativista ambiental brasileiro Chico Mendes, destaca uma enorme falta de informação e monitorização desses problemas, o que significa que o número de mortes é provavelmente superior aos documentados no relatório. Mesmo assim, a violência está ao nível da incidência mais visível de jornalistas mortos no mesmo período.
 
Foi possível confirmar que em todo o mundo 908 pessoas foram assassinadas na proteção das respectivas terras e do ambiente. No mesmo espaço de tempo, de acordo com os registros, apenas dez agressores foram julgados, condenados e punidos, o que corresponde a 1% da incidência geral de assassinatos conhecida. 
 
No ano de 2012, foram assassinadas três vezes mais pessoas do que nos dez anos anteriores, um total de 147 mortes, e a taxa de homicídios aumentou nos quatro últimos anos para uma média de dois ativistas por semana.
 
O relatório anuncia que o grande número de assassinatos a ambientalistas no país pode, até certo ponto, ser atribuído aos padrões de propriedade da terra no Brasil que, como considera, fazem parte dos mais concentrados e desiguais do mundo. As comunidades indígenas, salienta o documento, são as mais afetadas pelos ataques a ativistas, sobretudo por conta de seus conflitos com grandes latifundiários em razão da posse de terras.
 
Esses constituem um grupo poderoso e de grandes ligações, principalmente porque maioria dos alimentos consumidos pelas classes mais populosas, coincidentemente as mais pobres, é produzida em explorações de pequena e média dimensão - uma estatística irônica, se for considerado o elevado crescimento econômico geral que é, em partes, impulsionado justamente pelas exportações do setor agrícola. "A falta de vontade política em garantir que os grandes negócios que envolvem recursos sejam realizados de forma justa e aberta é idêntica à falta de vontade política em fazer justiça nos casos em que os conflitos resultam em assassinatos", destaca o documento.
 
O relatório também registra que a exploração florestal e empresas agrícolas têm uma enorme influência nas regiões onde foram cometidos homicídios contra ativistas e aponta como exemplo a província de Mato Grosso do Sul, onde a classe política é dominada por interesses de empresas agrícolas que incluem carne de vaca, soja e cana-de-açúcar e, não à toa, tem conflitos frequentes com as comunidades Guarani e Kuranji.
 
Esclarece, ainda, que o aumento de mortes é a face mais premente e mensurável de um conjunto de ameaças que envolvem intimidação, violência, estigmatização e criminalização, mas que a falta de informações públicas relativas a essas ameaças e a segurança das pessoas em perigo dificultam o acompanhamento desses casos. 



Histórico de ameaças
 
Embora o relatório não aponte os casos por estados, o Espírito Santo não está livre de episódios de violência decorrentes dos conflitos no campo, que ocorrem principalmente no norte, contra índios e quilombolas, em decorrência dos plantios de eucalipto da Aracruz Celulose (Fibria). A luta das comunidades tradicionais pela recuperação de seu território explorado pela Aracruz desde a ditadura militar resultou em episódios de violência, ameaças e prisões arbitrárias.


Denúncias como a registrada recentemente pelo quilombola  Manoel Pedro Serafim, que teve parte de sua propriedade incendiada em março deste ano, em represálias às críticas feitas contra a Aracruz Celulose, são comuns na região. Alguns episódios semelhantes, que contaram com auxílio da força policial do Estado, já foram alvos de ação de indenização pelo Ministério Público Federal no Estado (MPF-ES), com decisão favorável da Justiça. 
 
Na Grande Vitória e interior, militantes de movimentos sociais também foram alvo de intimidação pela Vale, investigada pela prática de espionagem e monitoramento de lideranças contrárias aos impactos de suas usinas. Há, também, denúncias de escutas telefônicas ilegais. 
 
Em Vila Velha, um aterro ilegal virou caso de polícia no bairro Ulisses Guimarães, em Vila Velha. O líder comunitário José Geraldo Lazarini, 56 anos, foi vítima de atentados em sua casa, alvejada por tiros. Ele denunciou a empresa registrada como Dailton Perim, de CNPJ 450141837-00, por crime ambiental, e precisou ser incluído em programa de proteção.



Outro caso emblemático no Estado foi o assassinato do ambientalista Paulo César Vinha, há 20 anos, após denunciar a extração ilegal de areia em uma área de restinga de Guarapari. Ele passou a receber ameaças e provocações de dois irmãos empresários, Ailton Barbosa Queiroz e José Barbosa Queiroz, que cercaram o biólogo e dispararam três tiros contra ele, no momento em que documentava com fotos uma área devastada do parque de Setiba.
 
Os irmãos se entregaram três meses depois e ganharam o direito de responder ao processo em liberdade. O julgamento dos acusados só aconteceria quatro anos depois do crime. Primeiro absolvidos, os irmãos seriam condenados em um segundo julgamento. Hoje, um está em liberdade condicional. O outro está foragido. Em homenagem ao biólogo, após sua morte, o parque de Setiba passou a se chamar Parque Estadual Paulo César Vinha.
 
 
 
 

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