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Desembargador suspende bloqueio de R$ 10 bilhões da Vale e BHP

Ricardo Machado Rabelo se reuniu em abril com empresas em busca de “solução definitiva” para o caso

Divulgação/TRF1

Após um pequeno intervalo de aproximadamente um ano em que magistrados de primeira e segunda instâncias publicaram decisões alinhadas com os direitos dos atingidos pelo crime da Samarco/Vale-BHP contra o Rio Doce, um novo desembargador do caso volta a pesar o prato da Justiça para as empresas.

A mudança de ventos ficou explícita com a decisão da última quarta-feira (3), em que o desembargador Ricardo Machado Rabelo, titular no Tribunal Regional Federal da 6ª Região (TRF-6), contesta a decisão do juiz do caso, Michael Procópio Ribeiro Alves Avelar, da 4ª Vara Federal, que, no início de fevereiro, determinou o bloqueio de R$ 10,34 bilhões da Vale e da BHP Billiton, para garantir a execução de ações de reparação e compensação dos danos advindos do crime em comunidades do litoral norte capixaba que a Fundação Renova se nega a reconhecer como atingidas.

A sentença do Juiz Michael Procópio estabelece o pagamento da quantia em dez parcelas iguais, com intervalos de 40 dias, para benefício dos atingidos listados na Deliberação nº 58/2017 do Comitê Interfederativo (CIF), instância presidida pelo Instituto Brasileiro de Meio Ambiente e Recursos Naturais Renováveis (Ibama), para fiscalizar a atuação da Renova, conforme previsto no primeiro acordo extrajudicial firmado sobre o caso, o Termo de Transação e Ajustamento de Conduta (TTAC), de março de 2016.

Em seu despacho, o desembargador concorda com a apelação das mineradoras contra o juiz da 4ª Vara Federal, afirmando que a “determinação de depósitos mensais de aproximadamente R$ 1 bilhão pela VALE e BHP ocasiona impactos imensuráveis na liquidez e caixa das empresas”.

Ricardo Machado Rabelo também argumenta que compreende a intenção do juiz, quando determinação o bloqueio, que foi de “reforçar a garantia em espécie” para a execução das ações de reparação e compensação no território negligenciado pela Renova e suas empresas mantenedoras, porém, “a preocupação do ilustrado magistrado, conquanto legítima, ressente-se de respaldo fático e jurídico, ao menos neste momento”.

Ocorre que, com essa ressalva, o desembargador questiona a legitimidade da Deliberação do órgão fiscalizador ao estabelecer a inclusão das comunidades, há quase seis anos, afirmando que a decisão do CIF foi feita “sem contundente e robusta prova técnica” e que por isso “mostra-se precipitada”. Além disso, prossegue, “não há nada nos autos atestando a insuficiência da garantia outorgada pelas empresas, logo no nascedouro das ações judiciais, em torno de 2,2 bilhões. Ou seja, os valores bloqueados, ao menos até este momento, revelaram-se seguros e consistentes”.

Por fim, Ricardo Machado Rabelo afirma que “em havendo a justificada constatação da necessidade de reforço da garantia inicial ou da mudança na capacidade financeira das empresas, nada impede a prolação de nova decisão pelo juízo de origem”.

Estudos técnicos

Difícil saber que outras provas o desembargador aguarda ter em mãos, para não questionar a Deliberação do CIF, considerando a profusão de estudos técnicos nesse sentido, como os produzidos pela Aecom, expert contratados pelo Ministério Público Federal (MPF), e da Fundação Getúlio Vargas.

Na petição inicial de bloqueio dos R$ 10,34 bilhões, feita em setembro de 2022, os órgãos de justiça que defendem os atingidos e o governo do Estado do Espírito Santo, por meio da Procuradoria Geral do Estado (PGE), são taxativos: “ao longo dos anos, as empresas e a Fundação Renova simplesmente desconsideraram os municípios litorâneos de seus programas. Passados sete anos do rompimento da Barragem de Fundão, a área costeira/litorânea nunca foi atendida por ações de recuperação. Pode-se usar de maneira enfática a palavra ‘nunca’, porque pode até ser que em um ou outro programa específico tenha ocorrido alguma ação pontual em município litorâneo, mas essa ação foi esparsa e não é digna de nota dentro do cenário que o desastre acometeu no Espírito Santo e diante da omissão das empresas e da Fundação Renova”.

“Já se passaram sete anos do desastre e o que se percebe é que as empresas pouco ou quase nada fizeram. Não é admissível que empresas do porte da Vale e BHP, que distribuem lucros de aproximadamente R$ 100 bilhões anualmente a seus acionistas, se neguem prover a reparação do mal que causaram”, salientou, na ocasião, o procurador-geral do Estado, Jasson Hibner Amaral.

“É importante lembrar que, conforme nota técnica expedida pelo ICMBio, em conjunto com o Projeto Tamar, a visualização por sobrevoo e de imagens de satélite mostraram que a pluma sedimentar atingiu com diferentes intensidades e concentrações toda a região costeira do Espírito Santo, sendo que a área compreendida entre o município de Serra e a divisa com o estado da Bahia foi a mais atingida, pela presença frequente da mesma”, pontuou, também na época, o procurador da República Carlos Bruno Ferreira da Silva.

De toda a área pontuada na Deliberação, entre Nova Almeida, na Serra, até Conceição da Barra, na divisa com a Bahia, somente as comunidades de Linhares são atendidas pela Renova. Entre São Mateus e Serra, a exclusão atinge 21 comunidades, formadas essencialmente por pescadores artesanais e catadores de caranguejos, que estão, desde o rompimento da Barragem, estão impedidos de exercer suas atividades econômicas tradicionais, sofrendo graves impactos ambientais, econômicos, sociais e culturais, além de graves problemas de saúde.

A decisão do desembargador cabe agravo, junto ao mesmo TRF6, e, considerando o processo de repactuação liderado pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ), tende a ser discutida também nessa mesa negociação jurídica e política.

Repactuação do CNJ

A mais recente reunião do CNJ com as partes ocorreu nos dias 26 e 27 de abril, em Brasília, na Sala de Situação da Presidência do Conselho Nacional de Justiça (CNJ). Conforme noticiou o Ministério Público Estadual (MPES), “a reunião tratou do alinhamento entre o poder público, com participação da nova equipe do Governo Federal. A pauta envolveu temas como cooperação interfederativa; participação social; demandas de povos e comunidades tradicionais; apresentação do plano de retomada econômica (transferência de renda) e do programa de indenizações; deliberação direta das comunidades para aplicação de recursos; apresentação e debate sobre o Fundo de Enchentes; saneamento básico; pesca; entre outros assuntos”.

A reunião contou com a participação de equipes de diversos setores do governo federal, além de membros do Ministério Público Federal e do Ministério Público do Estado de Minas Gerais (MPMG), além de integrantes da Defensoria Pública do Estado do Espírito Santo (DPES), Defensoria Pública do Estado de Minas Gerais (DPMG), Governos dos Estados do Espírito Santo e de Minas Gerais e das Procuradorias-Gerais desses dois Estados.

Renegociação do TRF6

Dias antes, em 11 de abril, uma reunião de alinhamento havia sido liderada pelo desembargador federal Ricardo Machado Rabelo. Conforme noticiado pela Justiça Federal, tratou-se de uma “audiência de tentativa de conciliação na sede do TRF6 em Belo Horizonte”, vista pelo magistrado como “um primeiro esforço visando ao alcance de uma solução definitiva para o maior desastre ambiental do país”, estando presentes “representantes das instituições de justiça que atuam no polo ativo do processo, bem como as empresas rés Vale, BHP Billiton e Samarco Mineração”.

O portal explica que, “com a criação do TRF6 [em 19 de agosto de 2022] os processos oriundos do caso Samarco, que até então vinham sendo julgados no TRF1, foram redistribuídos para o gabinete do desembargador federal Ricardo Machado Rabelo. Diante disso, o magistrado decidiu abrir uma mesa de negociação a fim de estimular uma repactuação entre as partes, conforme já proposto em 2018 (…) Ele acredita que uma decisão final a partir de um acordo entre as partes permitirá o surgimento de uma homologação que proporcionará a necessária segurança jurídica e o esperado encerramento do processo judicial”.


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https://www.seculodiario.com.br/meio-ambiente/e-o-fim-da-pesca-no-rio-doce-e-no-litoral-capixaba

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