Segunda, 06 Mai 2024

Pesquisadores elaboram parecer independente sobre 'Porto da Manabi'

Pesquisadores elaboram parecer independente sobre 'Porto da Manabi'
Oceanógrafos, biólogos e diversos outros profissionais ligados à questão ambiental elaboraram um parecer técnico independente a respeito do Porto Norte Capixaba (PNC), mais conhecido como "Porto da Manabi", que será protocolado nesta terça-feira (24) no Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) e na Procuradoria Geral da República (PGR).
 
Os ambientalistas apontam diversos entraves na documentação para o licenciamento do empreendimento, previsto para ser instalado em Linhares (norte do Estado). Entre eles, o fato de a empresa minimizar os reais impactos do projeto, principalmente no que se refere à contaminação dos ecossistemas marinho e costeiro pelo minério de ferro; e de os órgãos públicos não terem feito uma avaliação criteriosa dos estudos para a implantação, que são criticados por conter erros, falhas e omissões.
 
O parecer inicial do porto foi feito pelas empresas Ecology and Environment do Brasil e Econservation que, segundo os signatários, apresentaram impactos descritos como positivos ou negativos. "Todavia, é uma classificação arbitrária, que representa o ponto de vista do empreendedor, pois sequer referenciam trabalhos que se utilizaram de métodos científicos para tal". Igualmente arbitrária, afirmam, foi a escolha de Povoação como local adequado para a instalação da empresa. "Nossa análise crítica dos documentos demonstra que não há respaldo técnico para as conclusões de viabilidade socioeconômica e ambiental de mais um empreendimento portuário destinado ao escoamento de minério de ferro no Estado", reiteram os profissionais.
 
Prova dessa arbitrariedade pode ser retratada pela presença da Unidade de Conservação no terreno norte, considerada somente um fator moderado e não negativo à instalação do empreendimento; e pela ausência da descrição de impactos na área sul do empreendimento, onde permanecerá uma vegetação preservada próxima à praia.
 
Os profissionais também consideram a importância da avaliação dos órgãos ambientais como o Ibama, por sua competência interestadual, do mineroduto que corta 23 municípios, entre Minas Gerais e o Espírito Santo, e o Instituto Estadual de Meio Ambiente e Recursos Hídricos (Iema), que deveria fiscalizar corretamente o porto.
 
Eles consideram que os relatórios técnicos elaborados pela Econservation não avaliaram adequadamente os impactos aos ecossistemas marinhos e costeiros, principalmente com relação à emissão de material tóxico (minério de ferro e compostos químicos relacionados). Para os signatários do documento, é amplamente subestimada a avaliação dos impactos sobre as comunidades marinhas, parte em que o texto é incoerente e não apresenta suporte técnico. Apontam ainda que tal atitude subjuga o conhecimento técnico de avaliadores dos órgãos ambientais.
 
Segundo o relatório, não existem as três alternativas locacionais distintas exigidas por lei para a instalação de um empreendimento de tal porte, sendo que a única delas é área planejada para futura expansão do empreendimento. "É clara a arbitrariedade quanto ao balanço de impactos para a escolha da alternativa locacional, já que as áreas consideradas menos adequadas correspondem aos terrenos já adquiridos pela empresa Manabi", completam.



Além disso, os signatários apontam que, segundo a Câmara de Patrimônio Ecológico, Natural e Paisagístico, do Conselho Estadual de Cultura (CEC), o empreendimento se localiza dentro da poligonal de Tombamento da Mata Atlântica e Ecossistemas Associados e, por isso, seria obrigatória a anuência do CEC para concessão da licença ambiental, o que não aconteceu.
 
Sobre a questão do derramamento de minério de ferro, afirmam que mesmo que haja "tratamento" na água utilizada no mineroduto que será despejada no mar, poderá haver contaminação do pescado consumido nas redondezas e um agravo na cadeia produtiva dos animais, o que provocará um impacto direto nas comunidades tradicionais dependentes deste recurso. Este impacto é comparado ao minério despejado na Praia de Camburi pela Vale na década de 1970, o que, segundo estudos, fez com que o corpo de sedimentos com minério de ferro apresente toxicidade elevada e iniba severamente o desenvolvimento do ciclo da base da cadeia alimentar marinha. 
 
Também não foram tratados nos Estudo e Relatório de Impacto Ambiental (EIA/Rima) da empresa os impactos socioeconômicos que serão causados pela instalação do porto e que inviabilizam o projeto para a região. Entre os impactos diretos, estão a perda da biodiversidade promovida pela instalação e pelas atividades do porto, o que diminui automaticamente a quantidade e variedade de pescado disponível; e a restrição da área de pesca no entorno, fator que inviabiliza a circulação das pequenas embarcações na região.



Além disso, haverá um decréscimo no turismo da região, que atualmente usa de artifícios como a biodiversidade e a paisagem para gerar renda e trabalho. A mão de obra que será deslocada de outras regiões do país para os povoados em Linhares é similar ou mesmo maior do que todas as populações das vilas da região (Regência, Povoação e Degredo). Dessa forma, retratam que a estrutura pública (saneamento básico, saúde e educação) existente não atenderá a este aumento demográfico repentino. Assim, os balneários sofrerão intenso impacto social, principalmente com aumento do consumo de drogas e a violência relacionada à prostituição infantil, fatores que já foram constatados por moradores de Degredo durante a instalação do último empreendimento, o Terminal da Transpetro de Cacimbas.
 
O parecer alternativo é assinado por Alessandro M. Bayer, conselheiro de Patrimônio Ecológico, Natural e Paisagístico do Conselho Estadual de Cultura; Amanda Di Giacomo, bióloga marinha; Eric F. Mazzei, oceanógrafo; Dulce Mendonça de Castro Neves, oceanógrafa; Heloisa Dias, coordenadora do Colegiado Mar da Reserva da Biosfera da Mata Atlântica e do Grupo Conexão Abrolhos – Trindade; João Batista Teixeira, oceanógrafo; Jonathas Barreto, biólogo marinho; Leonardo Bueno, biólogo; Lucas Bermudes de Castro, oceanógrafo; Luiz Cláudio Ribeiro, professor doutor do Departamento de História da Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes); Maik dos Santos Cividanes da Hora, oceanógrafo; Gilson Mesquita, conselheiro do Conselho Municipal de Meio Ambiente de Vitória (Comdema); Renato Morais Araujo, biólogo; Robson Guimarães dos Santos, biólogo; Renata Costa Carvalho, bióloga; e Vitor Leonardo Amaral Rodrigues, oceanógrafo.

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