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‘Vamos mostrar para vocês, na prática, como se trabalha sem agredir a natureza’

Pescador convida ambientalistas a embarcarem em estudo do Compesca para conhecer a pesca assistida

“Estão distorcendo as coisas. O pescador é amigo do meio ambiente, é amigo da natureza. O que nós precisamos acertar dentro desse trabalho é acabar essa divergência entre o pescador e os ambientalistas. Nós convidamos vocês para participar. Os barcos ficam aqui do lado do Sebrae. Vamos fazer um trabalho correto: quem quiser fazer o trabalho, vamos curtir a baía de Vitória, vamos mostrar para vocês na prática como se trabalha sem agredir a natureza”.

O convite vem do pescador João Carlos Gomes da Fonseca, o Lambisgoia, presidente do Sindicato dos Pescadores e Marisqueiros do Espírito Santo (Sindpesmes), em um vídeo que circula nas redes sociais com o objetivo de contrapor falas feitas por entidades ambientalistas de Vitória no sentido de que o decreto e a lei assinados pelo prefeito Lorenzo Pazolini (Republicanos) liberam a pesca de rede na cidade, incluindo a Área de Proteção Ambiental (APA) Baía das Tartarugas, que inclui a baía de Camburi, local de maior polêmica nas discussões sobre regulamentação da atividade pesqueira, desde a operação conjunta de fiscalização realizada no último dia 6 de junho.

“Vocês que não são pescadores, vocês não têm ideia: (…) se a gente consegue pegar um animal desses [tartaruga marinha, baleia ou golfinho], e jogar para dentro do barco, sabe o que acontece? Ela é igual um bebê recém-nascido, automaticamente chora igual criança. E isso mexe com o sentimento de qualquer pescador. Nós não estamos aqui para agredir nada, não. Dois, três [pescadores que agridem o meio ambiente] não podem classificar uma classe inteira”, relata.

Em seguida, Lambisgoia repete o convite, referindo-se a uma reunião do Comitê Estadual de Gestão Compartilhada para o Desenvolvimento Sustentável da Pesca (Compesca), que está marcada a princípio para o próximo dia 15, em local ainda a ser definido pelo Instituto Brasileiro de Meio Ambiente e Recursos Naturais Renováveis (Ibama). “Eu convido vocês todos, quem quiser participar da reunião da Compesca, qualquer ONG, qualquer ambientalista, tem que participar para a gente mostrar o nosso plano de trabalho”.

Lambisgoia, presidente do Sindpesmes, em audiência pública da Câmara de de Vitória. Foto: Divulgação/Karla Coser

O superintendente do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) no Espírito Santo, Luciano Bazoni, explica que essa reunião será a primeira do ano no Compesca e vai ter a pesca assistida em Vitória como principal ponto de pauta. A intenção, reforça, é que participe o maior número possível de pessoas interessadas no assunto, para que possa ser feito um nivelamento das informações acumuladas pelo Compesca nesses 20 anos de atividades, e especialmente nos pelo menos três anos em que a normatização dessa estratégia de pesca foi minuciosamente pesquisada, inclusive com trabalhos em campo, junto com pescadores e entidades ambientalistas como o Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio) e o Projeto Tamar, além da Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes).

“No âmbito do Compesca, a pesca assistida já foi debatida à exaustão”, afirma o superintendente, conhecedor do histórico do Comitê. Um dos momentos da reunião, adianta, deve ser a apresentação de um comparativo entre o que o Comitê já relatou e propôs, inclusive em forma de minuta de normativa legal, e o que consta na lei e no decreto publicados pela Prefeitura de Vitória esta semana.
“Não posso afirmar se o decreto da prefeitura é melhor ou pior do que a proposta do Compesca e nem sou eu quem deve decidir isso. O que precisa ser feito é a discussão ampla. E o que a gente já viu é que, certamente, o que foi publicado pelo município não dialoga com o que o Compesca já encaminhou”.
A verdade
A entrada firme do Ibama na polêmica é um fato que precisa ser devidamente valorizado. A autarquia é historicamente a que mais acumula atritos com os pescadores, considerando que uma de suas finalidades é a fiscalização ambiental, o que inclui coibir ações indevidas promovidas pelos pescadores em relação à legislação em vigor.
No entanto, a atuação equivocada da Prefeitura de Vitória e das chamadas ONGs ambientalistas vêm levando o pseudo-inimigo dos pescadores a se levantar para mostrar os pontos de convergência entre a atividade da pesca artesanal e a conservação ambiental e as possibilidades reais de conciliar a dignidade dos trabalhadores do mar com a proteção da fauna ameaçada que vive nas baías da Capital.
“Enviamos um ofício para a prefeitura, pedindo para que ela não dê continuidade a esse trabalho de legislar sobre a pesca até que tudo seja discutido dentro do Compesca. Ela tem prerrogativa para fazer o que está fazendo, sim, tem, mas o Compesca é o fórum ideal para essa discussão, com a participação de todas as entidades relacionadas com o assunto”, afirma o superintendente.
O eco com os pescadores é direto. “As pessoas distorcem a coisa”, lamenta Lambisgoia. Sobre os atos publicados esta semana pela prefeitura, que contaram com apoio do Sindpesmes, ele faz uma modulação mais otimista e novamente se dirige diretamente às ONGs ambientais. “O prefeito criou espaço de diálogo entre o pescador, ICMBio, Ibama, superintendência da pesca e principalmente vocês ambientalistas, que a gente está convidando para participar da Compesca”.
Pescador Valquírio Sampaio Loureiro mostra mapa da cidade com locais estudados pelo Compesca. Foto: Divulgação/Karla Coser

O presidente do sindicato também toca num ponto crucial, que vem ficando de lado, muitas vezes, no meio de toda essa polêmica. Ao mostrar o mapa da baía de Camburi e áreas próximas, que foram alvo dos estudos sobre pesca assistida e outros temas dentro do Compesca, apresentado durante audiência pública do dia 4 de julho, ele sugere: “Se tiver que agredir alguém, tem que agredir aqui ó, a Vale do Rio Doce, a siderúrgica, eles que poluem o meio ambiente”.

Dentro da baía de Camburi e os canais que deságuam na praia, afirma, a pesca de rede continua proibida, até que uma regulamentação minuciosa seja aprovada. Por ora, com a revogação do Artigo 5º da Lei 9077/2017, apenas foi liberado o pesqueiro tradicional de camarão, próximo ao porto de Tubarão. Os pescadores de rede continuam sem poder trabalhar, acumulando já 97 dias parados.

O pedido, reforça, é pela união e debate amplo para resolver de forma justa a questão. “A gente sabe que tem dois três pescadores que não seguem as regras e é nisso que a gente vai tentar acertar o nosso ponto. A gente vai tentar fazer a nossa parte. Mas esperamos que vocês também façam as suas, participando da reunião da Compesca onde vai ser discutida essa área que ainda não foi liberada. (…) Nós não somos bandidos, precisamos trabalhar, então nada melhor do que nos unirmos, achar um plano de manejo melhor para a gente trabalhar, acabar com essas mentiras, essas divergências que nós estamos prontos para matar tartaruga. O nosso fundamento não é esse, nosso fundamental é mostrar a realidade, fazendo um trabalho justo e honesto junto com as entidades os ambientalistas, a prefeitura e o ator principal dessa história, que é o pescador”. 

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