Sexta, 03 Mai 2024

Nas entrelinhas

 

Quem vem acompanhado a queda de braço entre o procurador-geral de Justiça, Eder Pontes, e o relator do inquérito da Operação Derrama no Tribunal de Justiça, Ronaldo Gonçalves, sabe que a decisão do desembargador, apresentada na noite dessa terça-feira (5), está repleta de recados ao chefe do Ministério Público Estadual. 
 
A decisão, para quem leu as entrelinhas do documento, deixa claro que a tensão entre as duas instituições está longe de acabar. Vamos por partes...
 
Revogação das prisões
 
Eder Pontes, com esse último parecer, interou três pedidos de soltura dos acusados. Irritado com as negativas anteriores, o procurador-geral afirmou várias vezes que as prisões eram desnecessárias, para não dizer arbitrárias.
 
Ronaldo Gonçalves, embora tenha concordado em soltar os 30 acusados, entre eles os ex-prefeitos que permaneciam presos há 50 dias, fez questão de esclarecer que as prisões preventivas foram sim necessárias. Ou seja, o desembargador não se arrependeu de manter os acusados encarcerados por todo esse tempo. Ele se diz convicto que não houve qualquer excesso por parte da Justiça em prorrogar as prisões, acrescentando que só soltou os acusados porque o MPE, contrariando sua expectativa, não ofereceu denúncia à Justiça. 
 
Provas
 
Nas argumentações postadas no seu parecer e via imprensa, Eder Pontes desqualificou as investigações e, por conseguinte, as provas apurados pelos delegados do Núcleo de Repressão ao Crime Organizado e à Corrupção (Nuroc). Na avaliação do procurador-chefe, o destino das provas que consumiu meses de investigações é a lata do lixo. Nada será aproveitado. 
 
O desembargador discorda, e deixa registrada na decisão sua opinião sobre as provas levantadas pelo Nuroc. Ronaldo faz menção às fortes evidências contidas no material apurado. E aproveita para espetar Pontes: “Continuo, particularmente, convicto quanto à existência de significativos indícios de autoria e materialidade delitivas". 
 
E materialidade é que não falta. Uma caminhonete de provas encheu, durante as apurações, uma sala do Tribunal. 
 
Arquivamento do inquérito 
 
Eder Pontes pediu o arquivamento do inquérito dos investigados com direito ao foro: três prefeitos e dois deputados. Na cabeça da lista dos abonados estava o presidente da Assembleia Legislativa, Theodorico Ferraço. 
 
Com relação ao deputado do DEM, o procurador chegou a declarar à imprensa que os delegados do Nuroc retardaram a apresentação do relatório de investigação para prejudicar Ferraço, que buscava a reeleição à presidência da Assembleia. Pontes insinuou mais que uma vez que as investigações tinham viés político. 
 
Na decisão, o relator Ronaldo adverte ao procurador-geral que irá submeter o pedido de arquivamento dos acusados com privilégio de foro ao Pleno do Tribunal de Justiça. A decisão é mais um sinal de que a relação entre as instituições permanece bem azedada. Ao levar o caso para a apreciação do Pleno, o desembargador vai submeter o trabalho de Pontes aos seus pares do Tribunal. 
 
Provocando Pontes sobre o pedido de arquivamento, Ronaldo escreve na decisão: "No entanto, o próprio Ministério Público, na condição de defensor da sociedade, entende por bem promover o arquivamento do inquérito quanto aos suspeitos com prerrogativa de foro e em relação aos demais investigados já afirma que a denúncia demorará a ser oferecida".
 
Nessa passagem, ironicamente, o desembargador, sutilmente, ironiza Pontes ao dizer que o órgão ministerial, “como defensor da sociedade, entende por bem promover o arquivamento”. Na verdade, a mensagem que Ronaldo pretende passar é de que o MPE, ao pedir o arquivamento, segue justamente na contramão dos anseios da sociedade, que quer a apuração rigorosa dos fatos e a punição exemplar dos culpados. 
 
Como num nervoso jogo de xadrez, cada jogada de Pontes e Ronaldo tem sido estudada lance a lance. Antes de cada movimento, os jogadores tentam antecipar o raciocínio do adversário para surpreendê-lo em uma jogada desconcertante. Em meio a tanta tensão, ainda é difícil dizer quem está mais próximo do xeque-mate. 

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