Quarta, 15 Mai 2024

Violência sem limite

O assassinato do balconista Celso Carlos Tomazini Fagundes, na noite do sábado (8), na Praia do Canto, no bairro mais nobre de Vitória, é um desses crimes que chocam a sociedade. Motivos para essa comoção não faltam. O rapaz era bom filho, trabalhador e estava cheio de planos, como não poderia ser diferente para um  rapaz de apenas 21 anos. 
 
A repercussão do caso, que coincide com a discussão da redução da maioridade penal no Congresso Nacional, pôs ainda mais fogo na polêmica. Segundo a polícia, dois dos criminosos envolvidos no crime, apreendidos na tarde desta segunda-feira (10), têm 13 e 14 anos de idade. O autor do disparo que matou o balconista também teria 13 anos.
 
O senador Ricardo Ferraço (PMDB), que é relator da matéria no Senado, disse em entrevista ao jornal eletrônico Folha Vitória, nesta segunda (10), que está trabalhando no sentido de reduzir a maioridade penal nos casos de crimes hediondos. Em seguida, referindo-se ao assassinato de Celso Carlos, o senador, preocupado em dar uma resposta à sociedade, ressaltou que é preciso aperfeiçoar a lei para acabar com a impunidade nesta faixa etária. Como se fosse fácil.
 
Hoje também houve novos debates no Senado que estão sendo promovidos para dar subsídio à discussão. As opiniões de especialistas convidados divergiram da posição do senador capixaba. O desembargador do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP), Marco Antônio Marques da Silva, trouxe uma reflexão interessante. O magistrado lembrou que a sociedade não consegue combater as pequenas transgressões no dia a dia, e não vai conseguir combater as grandes se não houver uma mudança de mentalidade. 
 
Ele ponderou que nos últimos anos, 50% dos condenados por homicídios em São Paulo, com pena de reclusão de nove anos, tiveram progressão para o regime semiaberto em 1,8 anos, após cumprimento de 1/6 da pena, enquanto a medida máxima de internação de adolescentes é de três anos. “Redução da maioridade não é um toque de Midas, no âmbito penal temos de pensar que o ordenamento jurídico é um sistema, um elo com vários outros. Se não tomarmos cuidado vamos ter maior rigor com adolescente do que adulto sem resolver nenhum dos problemas”.
 
A ponderação perturbadora do desembargador é oposta à posição do secretário de Segurança Pública André Garcia, que disse ser a favor de penas mais longas para os adolescentes que cometem crimes violentos. 
 
Preocupado em transmitir sua indignação à sociedade, o secretário postou em seu perfil no Facebook que o número de adolescentes envolvidos em crimes violentos é cada vez maior. E aproveitou para tirar o peso da tragédia das costas do Estado e transferi-lo para a legislação. Ele disse que o Estatuto da Criança e do Adolescente apresenta "fraquezas". 
 
Embora o secretário tenha afirmado que o o envolvimento de adolescentes em crimes é crescente, na discussão do Senado, o defensor público federal Wagner de Araújo Neto salientou que no País não há estatísticas uniformes de participação de adolescentes em crimes de homicídios, mas que todas elas mostram que a participação é de até 10%. Dentro de crimes com menor potencial ofensivo, as estatísticas são unânimes em mostrar que 70% dos adolescentes envolvidos em atos infracionais cometeram crimes contra o patrimônio, roubo ou furto. Ele completou dizendo que a redução da maioridade penal não diminuirá os índices de violência. 
 
Talvez o secretário André Garcia tenha se aproveitado da polêmica em torno da redução da maioridade penal para se isentar da responsabilidade da Segurança Pública sobre o crime do balconista. Pelo fato de o assunto estar na ordem do dia, obviamente, todo crime envolvendo adolescentes tem uma repercussão muito maior. Para o secretário foi oportuno entrar na polêmico e tirar o foco da discussão da violência no Estado, que independe da idade. 
 
A sociedade está embarcando na defesa da redução da maioridade penal porque já se criou uma "verdade" em torno do assunto. Os defensores da ideia prometem que a mudança na legislação irá reduzir a violência. Por isso quase todo mundo quer a mudança. Afinal, quem não quer viver numa sociedade pacificada?
 
A discussão que tem de ser trazida à tona no Espírito Santo, porém, não passa necessariamente pela redução da maioridade penal ou aumento no período de internação, como sugere Garcia. Afinal, o crime que tirou brutalmente a vida do jovem Celso Carlos poderia ter sido cometido por um adulto, como acontece todos os dias no Estado. E provavelmente a discussão recairia sobre a impunidade e as leis frouxas do Estado brasileiro. Já passou da hora de o governo identificar e atacar as raízes do problema. 

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