Quinta, 16 Mai 2024

Encarceramento e criminalização juvenil estão relacionados, diz estudo

Encarceramento e criminalização juvenil estão relacionados, diz estudo

O pesquisador Deivison Souza Cruz, que é mestre em Ciência Política e cientista social, escreveu um artigo cientifico que destrincha a relação entre o encarceramento em massa ocorrido no Estado e a criminalização juvenil. O estudo “Juventude, criminalidade e aprisionamento no estado do Espírito Santo: alguns dados e hipóteses” derruba mitos relacionados à entrada de adolescentes na criminalidade e as principais causas para o encarceramento em massa que ocorre no Estado. O estudioso constatou a similaridade do perfil dos encarcerados e das vítimas de homicídios que, nos dois casos, são jovens do sexo masculino, com baixa escolaridade e residentes no meio urbano metropolitano.





O Espírito Santo se mantém há quase três décadas entre os estados com maior taxa de homicídios - sendo a taxa de homicidios de jovens a segunda mais alta do País, de 33,8 homicídios por grupo de 100 mil habitantes. “E como há muita flutuação nas demais posições entre os estados da federação, significa reconhecer, pelo critério de estabilidade, o Estado apresenta-se como um dos casos mais graves da federação”, constata pesquisador no estudo.

 
Ao longo deste período houve redução da idade das vítimas masculinas, que correspondem a 90% do total no Estado. Apesar disso, a resposta governamental mais consistente na última década foi o aumento massivo no encarceramento. A taxa de apenados aumentou sete vezes entre os anos de 1998 e 2012, passando de 78,4 para 566,4 detentos para cada grupo de 100 mil habitantes. 
 
Entre 2003 (primeiro ano do governo Paulo Hartung, que terminou em 2010) e 2012 o número de apenados triplicou, passando de 193,3 para 566,4 detentos por 100 mil. “Projeções para 2013 e 2014 mostram que a meta é chegar a taxas de encarceramento masculino superior a 1% do total da população, consolidando o encarceramento em massa como política de segurança dos governos”.
 
Os gastos com segurança pública cresceram 70% entre os anos de 2005 e 2010. No entanto, a redução de mortes violentas entre 2011 e 2012 foi de 10,8%, o que desmonta a máxima “maior encarceramento, menos crimes”. 
 
O estudo também questiona a redução de homicídios propalada pelo governo do Estado. Ele demonstrou por meio de dados que períodos de redução e mesmo estabilidade são seguidos por elevação posterior. Ele escreve no estudo: “É precipitado afirmar que o nível de taxas encontra-se em descenso ou ponto de saturação. Para responder mais precisamente o que leva a redução é preciso compreender o que fez com que chegassem os níveis de homicídio a esse ponto e, em seguida, atuar fortemente nesses fatores”.
 
De acordo com o estudo, as taxas de mortes continuaram altas e mesmo se elevaram nos anos de maior encarceramento. Ou seja, se a conexão entre drogas e homicídios fosse direta, maior encarceramento de envolvidos em tráfico – que correspondem à maioria dos presos do sistema no Estado – teria efeito direto na redução de homicídios e, mesmo havendo essa conexão forte, estaria associada àqueles envolvidos em homicídio do tipo qualificado, e de modo fraco aos envolvidos em tráfico em geral.
 
Jovens
 
O estudo aponta que, em síntese, não é a sociedade em geral vítima de crime de homicídio. A concentração desses crimes recai sobre o perfil juvenil, não branco (negros e pardos) com baixa escolaridade e residentes na região metropolitana. “Quando se trata da população carcerária dos dados cobrem apenas os anos mais recentes, mas a conclusão é a mesma. Repete-se o perfil dos grupos etários juvenis com a maior taxa de encarceramento”. 
 
Como os últimos governos investiram em encarceramento em massa como a solução para a segurança pública é pouco provável que o quadro mude em médio prazo. 
 
Entre 2005 e 2012 as taxas de encarceramento de jovens entre 18 e 24 anos elevaram-se de 867,7 para 2411,6 detentos por 100 mil e na faixa entre 25 e 296 anos o aumento foi de 830,2 para 1924,2 por 100 mil. “Na prática, significa que os governos estão mantendo sob custódia 1 a cada 50 jovens do sexo masculino no Estado”, constata o estudo.
 
O estudo ainda combate o senso comum ao lembrar que há mais de um século pesquisas provam que fatores sociais diversos explicam as variações da criminalidade. Deivison aponta que nas últimas décadas muito se tem falado do chamado “enfraquecimento moral da família”. No entanto, o fato foi acompanhado da menor eficiência do Estado. “Não se trata de culpar um ou outro, ambas as instituições envolvem-se no mesmo processo. Governos e famílias comportaram-se de modo atabalhoado frente à necessidade de orientação normativa das novas gerações. Baixa assistência social, concentração de pobreza, habitações precárias, fracasso escolar, ineficiência policial e da justiça emergem como problemas conjuntos na provisão de recursos sociais e da ordem pública nos bairros pobres”, diz o estudo.
 
As políticas com foco na delinquência devem reverter à rotulagem dos jovens como criminosos, modificando condutas de operadores públicos, como professores, assistentes sociais e, principalmente, polícia, tribunais e instituições de controle social. Essas ações devem ser combinadas com ações que aumentem o senso de responsabilidade para a integração com família, escola e comunidade. 
 
Esforços conjuntos da escola, comunidade, justiça e programas voltados aos jovens em condição de vulnerabilidade têm maior sucesso que esforços isolados de diversas instituições públicas. Ao mesmo tempo, indivíduos, famílias e comunidades que vivenciam condições de diversos fatores que provocam estresse tornam necessária intervenção pública complexa e planejamento governamental estratégico. 

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