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Pareceres reforçam inconstitucionalidade da ‘lei antigênero’ do Estado

AGU abre brecha, entretanto, para possível proibição em atividades extracurriculares

Sedu

Dois pareceres publicados nesta semana sobre a Lei nº 12.479/2025, também chamada de “lei antigênero” das escolas do Espírito Santo, reforçaram que a norma afronta princípios constitucionais. Entretanto, a manifestação da Advocacia-Geral da União (AGU) abre brecha para que a proibição possa, sim, ser aplicada nos casos que envolvam atividades extracurriculares.

A norma, promulgada pela Assembleia Legislativa após omissão do governador Renato Casagrande (PSB), assegura a pais e responsáveis o direito de vedar a participação de seus filhos ou de seus dependentes em atividades pedagógicas relacionadas a gênero e orientação sexual, realizadas em instituições de ensino públicas e privadas.

Três ações judiciais requerem que a lei seja declarada inconstitucional. Uma delas foi protocolada no Supremo Tribunal Federal (STF) pela Aliança Nacional LGBTI+, pela Associação Brasileira de Famílias Homotransafetivas (Abrafh) e pelo Fórum Nacional de Travestis e Transexuais Negras e Negros (Fonatrans). As outras duas tramitam no Judiciário capixaba, sendo de autoria do Partido Socialismo e Liberdade (Psol) e do Partido dos Trabalhadores (PT).

No âmbito da ação que tramita no STF, sob a relatoria da ministra Carmem Lúcia, a AGU argumentou que a Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB), o Plano Nacional de Educação (PNE) e resoluções do Conselho Nacional de Educação (CNE) preveem a aplicação de conteúdos de inclusão e de tolerância nas atividades pedagógicas das escolas.

Sendo assim, a legislação capixaba avança sobre uma competência que é privativa da União. Estados e municípios têm, sim, competência concorrente sobre ações educacionais, mas apenas na forma como as ações educacionais são colocadas em prática.

“Ao condicionar a possibilidade de administração de um conteúdo mandatório ao aval de pais e responsáveis, a lei estadual aqui impugnada não complementou as diretrizes federais, mas a contrariou, pois criou uma hipótese de matrícula/frequência facultativa que descaracteriza o padrão curricular e pedagógico constante das diretrizes federais”, escreveu o advogado-geral da União, Jorge Rodrigo Araújo Messias.

Entretanto, para Messias, estados podem criar normas para “conteúdos de atividades pedagógicas que extravasam tais finalidades e alicerces da educação”. Sendo assim, defendeu que “seja fixada interpretação conforme a Constituição à lei atacada, de modo a se estabelecer que o direito parental de escolha nela veiculado somente pode ser aplicado a atividades pedagógicas que o currículo escolar considere eletivas ou que extravasem a base curricular mínima exigida” – apesar de a lei capixaba não fazer diferenciação entre atividades obrigatórias ou eletivas.

Em posicionamento enviado à ministra-relatora da ação no STF, Carmem Lúcia, Casagrande, embora tenha se omitido antes, adotou a mesma linha de defesa da Procuradoria-Geral do Estado (PGE) já manifestado antes da sanção tática.  Ele disse que a norma “viola dispositivos constitucionais e jurisprudência consolidada do STF e a competência legislativa privativa da União para dispor sobre diretrizes e bases da educação, bem como a vedação constitucional a quaisquer formas de censura e à liberdade de cátedra e concepções pedagógicas de professores”.

Já o presidente da Assembleia Legislativa, Marcelo Santos (União), apresentou posição divergente. O deputado sustenta que “a norma está em conformidade com a Constituição Federal e visa apenas promover o diálogo entre família e escola”. Trata-se, segundo a manifestação, “de uma iniciativa que não traz qualquer proibição, mas apenas um convite a uma salutar e legítima integração entre a escola e a família no processo de formação pedagógica da criança e do adolescente”.

Ação do Psol

O procurador-geral de Justiça Francisco Martínez Berdeal se manifestou no âmbito da ação movida pelo Psol no Tribunal de Justiça do Estado (TJES), adotando um posicionamento mais incisivo do que o da AGU no processo que corre no STF.

Segundo o procurador, “o Supremo Tribunal Federal tem reiteradamente reconhecido a inconstitucionalidade de normas locais que, a pretexto de regular a atividade educacional, avançam sobre matéria de competência privativa da União”.

O representante do Ministério Público do Estado (MPES) argumenta que a lei emprega expressões genéricas e imprecisas, como “ensino de gênero”, “orientação sexual”, “identidade de gênero” e “outros assuntos similares”, incorrendo em “grave vício de indeterminação normativa”.

“A ausência de critérios objetivos”, acrescenta, “abre espaço para interpretações arbitrárias, denúncias infundadas e censura prévia, instaurando clima de insegurança no ambiente escolar, com potencial de paralisar a atividade pedagógica e silenciar docentes”.

Além disso, o procurador defende que a lei fragiliza políticas afirmativas e protetivas já consolidadas. “O retrocesso é ainda mais grave diante da realidade do Estado do Espírito Santo, que ocupa posição alarmante nos índices de feminicídio e violência doméstica. Segundo dados oficiais da Secretaria de Segurança Pública (Sesp-ES), entre 2022 e 2025 foram aplicadas mais de 78 mil medidas protetivas de urgência, com registros contínuos de feminicídios e agressões”, cita o procurador.

Assim como a AGU, o procurador de Justiça defendeu a suspensão cautelar da lei, tendo em vista o “perigo da demora”.

Tribunal de Contas

A Lei nº 12.479/2025 também é contestada no Tribunal de Contas do Estado (TCES) por representação do Ministério Público (MPC-ES), que pede a suspensão da aplicação da lei e solicita que o governo estadual e as prefeituras capixabas se abstenham de regulamentá-la ou tomar qualquer medida com base na nova norma.

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