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A lista negra de Hartung

Na campanha eleitoral de 2014, o termo “velha política” foi usado a torto e a direito pelos candidatos. Sempre quando Fulano queria desabonar Sicrano pela sua maneira anacrônica de fazer política, recorria à expressão.
 
No Espírito Santo, o então candidato ao governo, Paulo Hartung (PMDB), tentou colar o termo no adversário, Renato Casagrande (PSB), sobretudo quando a campanha chegou ao clímax com as denúncias de corrupção contra o peemedebista. Sem ter como rebater as denúncias, Hartung preferiu recorrer ao termo com intenção de desclassificar as acusações do adversário.
 
Hartung, aliás, se considera o avesso da velha política. Ele acha que sua gestão voltada para as elites, especialmente para os grandes empresários, o define como um gestor empreendedor, dinâmico, moderno, que está muito à frente do seu tempo.
 
Esse perfil que Hartung reivindica para si de gestor público vanguardista, na verdade esconde sua faceta mais obsoleta, que se manifesta no seu estilo de fazer política.
 
Assim como nos seus dois mandatos anteriores (2003 – 2010), o terceiro governo de Paulo Hartung é calcado no velho conceito de se fazer política, semelhante ao que caracterizou o Coronelismo. Aliás, o termo “velha política” faz menção à República Velha no Brasil (1894 – 1930). 
 
Em poucas palavras, a política que se fazia nesse período era a política dos coronéis, dos caciques, das oligarquias. Como bem definiu o historiador Fernando Horta em artigo, “a velha política é a política da falta de povo, da falta de representação. A política em que é ‘feio’ participar, discutir e opinar. Esse é o velho”. 
 
As semelhanças da definição de Horta com o perfil do governo Paulo Hartung não são meras coincidências. Desde que assumiu o comando do Estado, Hartung tem passado mais tempo maquinando vinganças do que propriamente governando. Pior ainda, ele aparelhou o governo para perseguir seus algozes. 
 
Basta recuperar as falas da secretária da Fazenda Ana Paula Vescovi, que se sujeitou a torcer os números para colar em Casagrande a pecha de gestor incompetente e irresponsável — um verdadeiro perdulário da contas públicas. Um castelo de areia que se desmanchou com o resultado da primeira auditoria feita pela Casa Civil, que mostrou que Casagrande falou a verdade sobre os empenhos. A mentira, como esclareceu a auditoria feita pelo próprio secretário de Hartung, ficou para o governador.
 
A caixa de maldades de Hartung não se restringe às críticas a Casagrande. Na Assembleia, o governador também declarou guerra aos deputados ligados ao governo anterior e que tiveram um posicionamento mais crítico à sua gestão neste início de legislatura. 
 
Desde a campanha eleitoral, Hartung vem construindo sua “lista negra” que não para de crescer. Deputados como Gilsinho Lopes (PR) e Sandro Locutor (PPS), nomes cativos na lista, têm sentido a cólera do governador. Locutor foi banido da vaga de corregedor da Assembleia numa manobra engendrada pelo Palácio Anchieta. Já Gilsinho — deputado que mais combateu a poluição na Grande Vitória, causada pelas emissões da Vale e ArcelorMittal — foi excluído da CPI do Pó Preto por não aceitar se submeter às ordens palacianas. 
 
O artigo de Horta se encaixa também no perfil da nova (velha) Assembleia da Era Hartung, que continua submissa ao Executivo. “Desse ponto de vista a velha política é a política sem embate, é a política da acomodação. Essa forma de acomodação que cede a tudo e a todos com o objetivo da ordem e do progresso. O conflito é visto como algo prejudicial à sociedade (como no Positivismo de Auguste Comte). Para se evitar esse conflito político se faz malabarismo discursivo, se cede e se modifica linhas de ação sem um retorno efetivo e claro. Veja que uma coisa é o processo de negociação dentro de um parlamento, em que a cessão ou negociação de determinados pontos vêm em conjunto com o ganho efetivo em outros. Outra é esse processo de acomodação de interesses. Como se os pactos fisiológicos prescindissem de um encaminhamento político claro. Como se o político não tivesse rumo por si mesmo, estivesse vagando ao prazer das ondas e dos acordos”. 
 
A mais nova vítima da velha política de Hartung é o conselheiro do Tribunal de Contas do Estado, Carlos Ranna. O conselheiro, ao lado de Sérgio Borges, não faz parte da vassalagem de Hartung no tribunal. Como Hartung já sabia que seria de Ranna a prerrogativa de julgar as contas do primeiro ano do seu terceiro mandato, começou desde já a articular o processo de linchamento público do conselheiro.
 
Para o trabalho sujo, escalou dois fiéis aliados: os deputados Edson Magalhães (DEM) e Guerino Zanon (PMDB). Ambos usaram o púlpito da Assembleia esta semana para dizer que Ranna usou o poder da caneta para prejudicá-los, se referindo à Operação Derrama que deixou um saldo de dez ex-prefeitos na cadeia, incluídos Zanon e Magalhães. 
 
O discurso dos deputados, referendado pelo presidente da Assembleia Theodorico Ferraço (DEM) — cuja mulher, Norma Ayub, também foi presa na operação —, foi uma tentativa de alvejar moralmente o conselheiro e impedi-lo de julgar as contas do governador. 
 
Ranna já explicou que o TCE nada teve a ver com a operação, inteiramente coordenada pelo Núcleo de Repressão às Organizações Criminosas e à Corrupção da Polícia Civil (Nuroc) e pelo Ministério Público Estadual (MPES). 
 
Apesar dos esforços de Ranna para tentar explicar que o linchamento é político, seu nome já foi lançado na lista negra do governador. 
 
Os proscritos de Hartung devem reagir. Precisam mostrar que não há mais espaço para a prática rancorosa e vingativa da velha política.

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