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Córrego Alexandre e Morro da Onça fazem retomada de território quilombola

Ação é resposta à negativa da Suzano em devolver área indicada pela Justiça e à inação do Estado sobre o assunto

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As comunidades do Córrego do Alexandre e Morro da Onça, em Conceição da Barra, norte do Estado, realizaram uma retomada de parte de seu território tradicional em uma área localizada entre os dois quilombos, anteriormente usada para monocultivo de eucaliptos pela papeleira Suzano (ex-Fibria e ex-Aracruz Celulose). 

Ambas integram o Território Quilombola Tradicional do Sapê do Norte, que se estende também pelo município vizinho de São Mateus, e lutam, há mais de trinta anos, pela libertação de suas terras contra o deserto verde, que avança a passos largos, com a subserviência dos sucessivos governos estaduais capixabas.

A retomada é uma resposta das comunidades à negativa da multinacional em devolver parte das terras que ocupou – ilegalmente, segundo o Ministério Público Federal (MPF) e a Justiça Federal – do povo quilombola e à conivência velada do governo do Estado, que não realiza as diligências que lhe cabem para pacificar a disputa territorial que se arrasta há décadas, apesar das reuniões periódicas da Mesa de Resolução de Conflitos Fundiários, coordenada pela Secretaria de Estado de Direitos Humanos (SEDH). 

“Nas reuniões da Mesa, a gente nunca chega num denominador comum, para a Suzano recuar e as comunidades se desenvolverem. Ela sempre joga para frente, para frente, e nada. Aconteceu que em uma dessas conversas, ela mandou fazer a demarcação da área que a gente tinha interesse imediato e mandou um representante para acompanhar a comunidade no trabalho de campo. Mas foi só para eles ganharem tempo, porque estavam começando a plantar eucalipto ali e aceleraram o trabalho, colocaram três operações juntas: destocamento [retirada de tocos e raízes de eucaliptos colhidos], porque eles mudaram o alinhamento dos eucaliptos; subsolamento [preparo do terreno para fazer as covas e novos plantios]; e o plantio”, relata Douglas dos Santos Alexandre, vice-presidente da Associação de Remanescentes Quilombolas e Produtores Rurais da Agricultura Familiar e Pesqueira do Córrego do Alexandre – Sapê do Norte.

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A área da retomada, acredita, tem mais de 150 hectares. O primeiro pedido objetivo de recuo do deserto verde no local foi feito em abril de 2021, em ofício encaminhado para a coordenação de Sustentabilidade da Suzano. “Nunca tivemos nada de resposta, já tem mais de um ano”, conta. Diante da inércia, a Comissão Quilombola do Sapê do Norte deliberou pela retomada da área. “No nosso núcleo é onde tem menos área para crescimento das comunidades, então a Comissão decidiu fazer a retomada. Mas é uma resposta para a empresa e para o governo, em nome de todas as comunidades quilombolas do Sapê do Norte. Porque todas já pediram o recuo dos eucaliptos”, explica o vice-presidente. 

Desde o dia da retomada, em seis de agosto, sucedem-se os mutirões para plantios de espécies alimentícias e nativas, bem como o cercamento das mudas plantadas, para proteção contra pisoteio de animais. O objetivo é garantir a segurança e a soberania alimentar das famílias, bem como o acesso ao território para demais usos necessários às comunidades, como “recuperação de nascentes, [construção de] igrejas, área de lazer, moradias e o que mais a comunidade desejar fazer”, elenca a Comissão Quilombola do Sapê do Norte em documentos entregue aos órgãos de Justiça que defendem os quilombos da região – Ministério Público Federal (MPF), Defensorias Públicas Estadual e da União (DPES e DPU) e órgãos do Executivo envolvidos no assunto, especialmente a SEDH.

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Decisão judicial

A usurpação do território quilombola pela multinacional é considerada ilegal pelo MPF. Argumentação nesse sentido consta na Ação Civil Pública impetrada em 2015 – processo nº 0104134-87.2015.4.02.5003/ES – e teve a primeira decisão judicial favorável às comunidades. Em outubro passado, o juiz Nivaldo Luiz Dias determinou que seja declarada a nulidade dos títulos de propriedade emitidos para a então Fibria, por terem sido resultado de grilagem de terra, conforme demonstrou a CPI da Aracruz Celulose empreendida pela Assembleia Legislativa em 2002, e que o governo do Estado realize a titulação quilombola das terras devolutas hoje sob posse da papeleira

“Em nossas comunidades, o nosso povo vivia bem, comia e bebia com fartura. Hoje precisamos de tudo para viver, de todos os nossos direitos, desde o saber alimentar ao saber plantar. Lutamos para que o governo do Estado cumpra com a decisão da Justiça”, pontua o documento da Comissão Quilombola do Sapê do Norte. 

“Estamos lutando também pelos que já se foram e pelos que ainda vão vir. Lutamos por uma vida digna para todas e todos das comunidades. Uma vida que seja, mais do que apenas respirar, mas que garanta acesso à saúde, educação, segurança alimentar, lazer, cultura e tantas outras coisas importantes para o pleno desenvolvimento de qualquer pessoa”, declara.

“Se quisermos manter nossa existência e nossas tradições, necessitamos de espaço para plantar e criar nossos filhos e netos conforme nossos saberes. Essa é uma luta de mais de 30 anos das comunidades quilombolas no Território do Sapê do Norte”, reafirma a Comissão.

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