Sexta, 03 Mai 2024

2014, noves fora, sete

 

Todo mundo projeta 2014 como um ano espetacular para o Brasil graças à realização da Copa do Mundo em 12 capitais atualmente empenhadas em obras esportivas, viárias e turísticas.
 
Falta cair a ficha quanto a outros eventos não menos significativos. O mais importante será a sétima eleição presidencial após o fim da ditadura militar, implantada pelo golpe que dentro de dois anos completará meio século.
 
Ainda em 2014, no mês de maio, estará vencendo o prazo (dois anos) do trabalho da Comissão da Verdade sobre Violações de Direitos Humanos, nomeada pela presidenta Dilma, que provavelmente será candidata à reeleição.
 
Sem alarde, os sete comissários estão levantando casos de tortura, desaparecimentos e assassinatos ocorridos nos bastidores do regime ditatorial. No mínimo, deve sair daí um documento aprofundando o documento Brasil Nunca Mais, pioneiro no levantamento de casos de tortura e desaparecimentos de presos políticos.
 
Deve-se considerar ainda que a simples existência da Comissão da Verdade vem encorajando muitas pessoas e organizações a contar o que sabem. Na 58ª Feira do Livro de Porto Alegre, com encerramento no dia 11 de novembro, foram lançados vários livros sobre fatos e personagens do tempo da ditadura militar. É lógico esperar que um exemplar de cada um desses livros será anexado ao dossiê da CV.  
 
Pela lógica do sistema democrático, o relatório final da CV pode inspirar denúncias do Ministério Público ou da Procuradoria Geral da República, gerando processos que talvez acabem sendo julgados pelo Supremo Tribunal Federal, cuja imagem está sendo retocada pelo julgamento do Mensalão. Nesse ritmo, pode ser que no ano de 2014 nós brasileiros vejamos o time da Democracia vencer o do Arbítrio no tapetão inapelável do STF.    
 
O que precisa ser dito neste momento é que não se trata de um jogo fácil cuja vitória está garantida. Paira sobre o levantamento da CV um clima de tensão gerado pelo inconformismo de segmentos policiais-militares que, mesmo com culpa no cartório, reclamam estar protegidos pela lei da anistia de 1979, para a qual estariam prescritos todos os “crimes conexos”, inclusive os hediondos.
 
À luz dessa interpretação, a CV seria um ato de "revanchismo" da presidenta Dilma contra os algozes da Esquerda durante a luta armada antiditadura. O maior foco de resistência à revisão da anistia é representado justamente por uma minoria de oficiais da reserva e policiais aposentados que, mesmo acuados, não dão o braço a torcer nem entregam a rapadura.  
 
Essa resistência surda, mas não muda, confirma a impressão de que a democracia brasileira não alcançou a maturidade suficiente para liquidar com os últimos resquícios da ditadura militar, ainda presentes em órgãos públicos com o Arquivo Nacional, guardião de antigos documentos produzidos pelo extinto Serviço Nacional de Informações (SNI).      
 
Embora o SNI não exista mais, o espírito que o regia continua vivo no comportamento de funcionários do AN, que fazem exigências absurdas e criam barreiras ridículas aos pesquisadores. Ao investigar sua própria ficha e o caso emblemático de Vladimir Herzog, o jornalista e ex-deputado Audálio Dantas constatou que muitos papeis oficiais foram suprimidos da entrega feita pelo SNI à AN. São sinais de que criminosos do tempo da ditadura militar continuam agindo nos bastidores do regime democrático.
 
 
LEMBRETE DE OCASIÃO
 
“Desde 1985 os governos eleitos democraticamente não tiveram coragem de enfrentar essa situação. A presidente Dilma resolveu encarar e a apoiamos enfaticamente.”
 
Audálio Dantas, 80 anos, ex-presidente do Sindicato dos Jornalistas de São Paulo, ao lançar na 58ª Feira do Livro de Porto Alegre o livro “As Duas Guerras de Vlado Herzog” (Civilização Brasileira, 400 páginas) sobre o jornalista paulista que morreu sob tortura em 25 de outubro de 1975, data que se tornou marco da resistência democrática à ditadura militar.

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