Admitamos: por pequena que seja, a crise do governo Dilma afeta a governabilidade e põe em risco uma reeleição que até alguns meses atrás parecia barbada. Entretanto, admitamos também: não será um Deus-nos-acuda se a atual mandatária for descartada pelas urnas em 5/10/2014.
Aécio, Edu, Marina? Neste país sempre à espera da volta do Messias ou de um salvador-da-pátria, é bom que fique claro: o Brasil só irá para a frente por meio da construção de consensos mínimos. Ainda que a visita do Papa Francisco tenha ajudado a baixar a poeira das manifestações populares, nenhum problema desapareceu da agenda por um passe de mágica. É de hora de conversar, ouvir, pensar e agir. .
A proximidade das eleições deixa todo mundo nervoso, meio louco para dar um golpe mortal no adversário. E o alvo preferido da maioria tem sido a presidenta Dilma e seu PT. Na Internet correm mensagens a tratando por presidenta. Riem até do seu modo de caminhar.
Segundo os críticos, a falta de diálogo com o Congresso e o Judiciário ressalta o viés autoritário da presidenta, mas até agora ninguém apontou-lhe um erro capital ou uma falha grave.
Não faz bem à democracia transformá-la em alvo fixo de descontentamentos sociais, políticos ou econômicos. O cargo precisa ser preservado como patrimônio do estado de direito. E ambos, o cargo e a pessoa, não se dissociam, a menos que esta faça por desmerecê-lo.
Nos últimos meses, ficou claro que a presidenta perdeu o foco ao se deixar orientar (mal) por um marqueteiro, o pior dos conselheiros em momentos de tensão ou crise.
Porque o profissional de marketing tem a fidelidade de uma biruta de aeroporto: quando muda o clima, vira-se imediatamente para o lado de onde sopra o vento, deixando “o cliente” na poeira.
Em abril, quando os candidatos à presidência começaram a sair da toca, a presidenta foi aconselhada a ir ao interior, onde fez discursos mal ajambrados sobre realizações do governo. Expôs-se sem necessidade e, pior, sem ganhos reais.
Foi ali que começou a desmoronar a credibilidade presidencial. Dois meses depois, sem ter a quem recorrer, a presidenta buscou o apoio do CDES, órgão que até então vinha tratando com olímpico desdém, como se fosse um apêndice decorativo criado pelo presidente Lula.
Como as perspectivas econômicas não são positivas, correu o boato de que o ex-presidente Lula teria aconselhado sua pupila a colocar no núcleo central do governo o jornalista Franklin Martins, que ficou marcado no governo anterior como o patrocinador de um projeto de controle da mídia.
Caem os empregos caem, caem as exportações, sobem as importações, elevam-se os juros básicos da economia, desacelera-se o consumo, crescem os cortes orçamentários: infelizmente, desenha-se na economia um quadro recessivo que vai favorecer a concentração da propriedade e da renda. Nesse ritmo, o Brasil pode destruir o que foi construído em uma década de esforço distributivo e inclusão social. Olhando bem, pode-se ver aí o fermento das manifestações de 2013.
LEMBRETE DE OCASIÃO
“Há milhões de crianças sem comida e sem escola. Há milhões de idosos desamparados.
Essas tragédias do nosso mundo são esquecidas pela mídia. No entanto, as bolsas caem 3 ou 4 pontos e lá vêm as manchetes, como se o mundo fosse acabar.”
Papa Francisco I ao condenar a idolatria do dinheiro em entrevista ao Fantástico de 28/7/2013