Em poucos dias, uma importante passagem da história recente do Espírito Santo poderá finalmente ser passada a limpo. Começou nesta segunda (24) e deve terminar na sexta (28) um dos julgamentos mais aguardados pela opinião pública capixaba.
A previsão de uma semana de júri é do juiz da 4ª Vara Criminal de Vila Velha, Marcelo Soares Cunha, que vai presidir o julgamento do coronel da reserva da Polícia Militar, Walter Gomes Ferreira e do ex-policial civil e hoje empresário, Cláudio Luiz Andrade Baptista, o Calú. Os dois são acusados pelo mando do crime do juiz Alexandre Martins de Castro Filho, morto em março de 2003, em Vila Velha.
Desde as primeiras horas da manhã desta segunda as atenções estão voltadas para o Cineteatro da Universidade Vila Velha (UVV). Não é para menos. Quem acompanhou mais de perto o Caso Alexandre tem grande expectativa de que o júri popular possa esclarecer o mistério que cerca o crime nesses 12 anos.
Há tese oficial sustenta que o crime foi de mando. As principais autoridades que estiveram à frente do caso, na época, logo após o assassinato do juiz, trabalharam nessa linha de investigação: do então governador Paulo Hartung ao juiz Carlos Eduardo Ribeiro Lemos, passando pelo então secretário de Segurança Rodney Miranda, hoje prefeito do município que sedia o júri, ao delegado Danilo Bahiense, que tomou os primeiros depoimentos das testemunhas e dos suspeitos.
No calor dos fatos, o então governador Paulo Hartung declarou que não deixaria o Espírito Santo se tornar refém do crime organizada. Ele fazia menção ao crime do juiz-corregedor paulista Antônio José Machado Dias, executado dez dias antes (14/03/2003) da morte do juiz Alexandre (24/03/2003) pelo Primeiro Comando da Capital (PCC), no interior do Estado de São Paulo.
Hartung, que acabara de assumir o governo, prometia dar uma resposta ao crime organizado que ameaçava o Espírito Santo. A partir daí, o tom do discurso do governador foi incorporado e replicado por todas as autoridades envolvidas na investigação do crime.
O juiz Carlos Eduardo Lemos, uma das personagens mais importantes do Caso Alexandre, ia mais além: transmitia uma indignação que se misturava com vingança. Ele repetia que o Judiciário iria mostrar que, quando se mata um juiz, vários outros virão. E acrescentou: “Mais sedentos, vigorosos e decididos a pegá-los”.
Século Diário, que cobriu o Caso Alexandre desde o início, foi registrando ao longo da cobertura que havia muitas contradições na tese de mando, e passou a apurar a veracidade da outra tese, que sustentava que o juiz fora vítima de um latrocínio: assalto seguido de morte.
O jornal, cumprindo o papel da imprensa que é de esclarecer os fatos, ouviu os personagens que defendiam a tese do latrocínio. Não demorou para o jornal ser associado “ao braço armado do crime organizado” no Estado. Há estratégia dos que defendiam o mando era criminalizar o jornal, que passava a trazer elementos da tese de latrocínio para reflexão.
Nesses últimos anos, Século Diário publicou diversas reportagens que deram margem para pôr em suspeição a tese de mando.
Exemplos não faltam. O juiz Carlos Eduardo Lemos, apesar dos seus juramentos de vingança e envolvimento emocional com o magistrado morto, a quem chamava de “irmão, foi designado pelo Tribunal de Justiça do Estado para conduzir o caso. Menos de dois meses depois do crime, ele decretou a prisão dos seis primeiros suspeitos.
Essa e outras evidências que apontam contradições na condução do Caso Alexandre devem voltar à tona nos próximos cinco dias. O problema é que o julgamento também se inicia repetindo erros que acompanharam o caso nesses 12 anos.
Gera ou não gera suspeição o fato de o juiz Carlos Eduardo Lemos ser testemunha no júri popular depois de ter atuado no processo? Lemos, não nos esqueçamos, foi um dos autores do livro “Espírito Santo”, lançado em 2009, que narra os bastidores das investigações do crime para sacramentar a tese de mando.
Pesa ainda contra Lemos as acusações feitas pelo juiz aposentado Antonio Leopoldo este ano na Assembleia, durante a CPI da Sonegação. Leopoldo afirmou à CPI que sofreu tortura durante a tomada de depoimentos do Caso Alexandre. As sessões de tortura, segundo Leopoldo, teriam tido a participação do juiz Carlos Eduardo, que diz que se encontrou com Leopoldo, à época dos fatos, apenas para propor um acordo e delação premiada.
É difícil prever se o júri vai conseguir esclarecer de vez o mistério que cerca a morte do juiz. Mas uma coisa é certa, muitas revelações virão à tona e muita gente vai perder o sono nos próximos cinco dias.

