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​O cenário mais perverso

Há pouco o que se comemorar nos 30 anos do Estatuto da Criança e do Adolescente

Preto é o mal; branco, o bem, a virtude, disse o professor Abdruschin Rocha, pastor evangélico, ao abordar o tema Religião e Racismo, nesse domingo (12). Referia-se ao significado das cores, cruel quando ministrado em salas de aula, inclusive de escolas bíblicas, representando mais um poderoso ingrediente do tecido social a colocar o preto como um elemento a ser excluído e até mesmo destruído. 

Uma realidade exposta pelo racismo estrutural enraigado na sociedade, a ponto de tornar aceitável a exclusão em todas as suas formas, transformando a sociedade em um caldeirão de perversidades. Uma reflexão apropriada para o momento, levando em conta os 30 anos do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), completados nessa segunda-feira (13), principalmente pelo fato de que, apesar do avanço, a lei ainda patina na ausência de vontade política do Estado.

Longe de alcançar o que foi estabelecido no projeto original, em 1987, de autoria do então deputado federal Nélson Aguiar, e, também, da ex-deputada federal Rita Camata, relatora do projeto que deu nome à lei promulgada em 1990, o Estatuto permanece uma letra quase morta, decorrentes da ausência do Estado nas camadas populacionais mais necessitadas.

A partir do estatuto foram criados conselhos de proteção à criança e ao adolescente, entre outros mecanismos, que alteraram o quadro, especialmente com relação ao Código de Menores, fruto de uma época autoritária, cujo modo de agir encontra semelhança com o momento político atual. No entanto, de outro lado, o Estado se manteve aquém das necessidades básicas da população, ou seja, educação, saúde, emprego e moradia, punindo as camadas mais pobres, nas quais o contingente de pessoas de cor negra é mais numeroso.

Esse contexto traduz um descompasso histórico, no qual uma lei como o Estatuto da Criança e do Adolescente tem a aplicação de forma plena impedida, tendo em vista a postura do Estado brasileiro, habituado a substituir a proteção à criança, que deveria começar a partir do ventre da mãe, por ações que ao invés de suprir necessidades básicas, ferem ainda mais a dignidade, como ser humano.

Não é sem motivo, portanto, que as maiores vítimas de homicídios sejam pessoas de cor negra, da mesma forma que estejam nesse contingente os mais altos índices de homicídios, desempregados, ou seja, de abandonados pelo Estado, em todos os cenários, incluindo o religioso. O racismo estrutural, parte relevante da sociedade brasileira, esquece que ninguém nasce drogado com uma arma disparando para todo lado, como afirma o ex-deputado Nelson Aguiar.

A omissão quanto às desigualdades, procedimento normal da sociedade brasileira, fruto de um racismo secular, explode como uma bomba no seio das crianças e jovens negros, as maiores vítimas e também credores de uma dívida impagável.

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