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O suplício como punição

 

Após levar o Espírito Santo e, por tabela, o Estado brasileiro às cortes internacionais com o escândalo das masmorras, o ex-governador Paulo Hartung e seu fiel secretário de Justiça Ângelo Roncalli tentaram convencer a opinião pública de que a construção de novas unidades prisionais, modelo high tech, sepultavam as violações ocorridas na gestão da dupla. 
 
Entretanto, as recorrentes violações no sistema prisional deixam patente que a cultura da tortura não se desfaz com a construção de novas unidades prisionais. Primeiramente, é preciso haver uma mudança de concepção no desafio de ressocializar presos. Algo que ainda está distante de acontecer no Espírito Santo.
 
O fato de Roncalli, remanescente do governo Hartung, ter continuado à frente da Sejus no atual governo até outro dia e, pior, ter sido substituído por outro quadro do governo anterior, André Garcia, manteve a situação praticamente inalterada. 
 
Na verdade, além das unidades high tech, o que mudou mesmo foi ação de algumas instituições, no caso o Tribunal de Justiça, que passou a denunciar as violações no sistema prisional. 
 
O desembargador Pedro Valls Feu Rosa, antes mesmo de assumir a presidência do TJES, já se mostrava intolerante com as violações que ocorriam no sistema. À frente da Corte estadual uma das primeiras providências do desembargador foi criar o torturômetro – contador de torturas que passou a incomodar primeiro Roncalli e agora Garcia. 
 
Para dar ressonância às denúncias que chegavam ao Tribunal, o presidente instituiu também a Comissão de Combate e Enfrentamento à Tortura, que passou a exigir a apuração rigorosa dos casos de violações no sistema prisional.
 
Nessa quinta-feira (11) ficou evidente a importância de termos no Estado uma instituição do peso do Tribunal denunciando casos de torturas contra presos. 
 
O caso denunciado, como retratado em matéria publicada em Século Diário, envolve o castigo imposto a 55 presos da Penitenciaria Estadual de Vila Velha II (PEVV II), no complexo de Xuri, que receberam o castigo, também conhecido como “procedimento”, que consistiu em obrigá-los a sentar-se por horas, nus, em pleno sol do meio-dia, no cimento fervendo do pátio. Resultado: os presos ficaram com terríveis queimaduras nas nádegas, como exibem as fotos, que fizemos questão de publicar na matéria. 
 
No governo Hartung, para quem não se lembra, foram inúmeros os casos de violações, muitos, inclusive, acabaram em mortes ou deixaram os presos sequelados para o resto de suas vidas. 
 
Mas parte da imprensa “segurou” até o último momento a informação. Quem não se lembra da censura ao artigo do jornalista Élio Gaspari? As violações só ganharam espaço no noticiário local quando as denúncias romperam as divisas do Estado, cruzaram o Atlântico e foram parar na ONU, em Genebra, na Suíça. A partir daí, as masmorras de Hartung ganharam as páginas da mídia nacional e até internacional, e já não havia mais como a imprensa caseira “segurar” o escândalo. 
 
Hoje, não precisamos mais que as denúncias cheguem à ONU para ocupar as páginas dos jornais. Graças ao trabalho do TJES, a Secretaria de Justiça não tem como omitir os fatos, e olha que nesse episódio do Xuri eles até que tentaram. 
 
Apesar do secretário de Justiça André Garcia ter divulgado uma nota hoje (11) alegando que não concorda com tortura e que vai abrir um procedimento administrativo para apurar as responsabilidades, além de anunciar a exoneração do diretor da unidade, é importante registrar que sessão de suplício ocorreu no segundo dia do ano e só nessa quinta (10), oito dias depois, é que a denúncia chegou ao TJES e veio à tona. Só agora também que os presos receberam cuidados, depois das feridas ficarem na carne viva. 
 
Será que o secretário de Justiça realmente não sabia de nada ou estava tentando abafar o caso? Se a primeira hipótese é verdadeira, o secretário está mal assessorado ou, como já disseram, não está dando conta de administrar duas secretarias (Justiça e Ação Estratégica). Quanto à segunda, não seria surpreendente, ainda mais porque Garcia vem da escola de Rodney Miranda e Hartung.
 
Dificilmente saberemos a verdade. Mas o que importa agora é saber que casos bizarros como esse não são mais abafados. O tempo de proibir o acesso das entidades de defesa de direitos aos presídios acabou junto com a Era Hartung. 
 
No caso de Xuri, os responsáveis pela barbárie terão que ser exemplarmente punidos no rigor da lei. Eles precisam entender, de uma vez por todas, que a punição do preso se restringe à privação de liberdade. Praticas de suplícios, castigos e torturas não fazem parte da pena arbitrada pela Justiça. 

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