Sexta, 26 Abril 2024

Para onde foi o dinheiro lavado?

A cada lance da CPI do Cachoeira fica mais evidente as ramificações da Delta Construções no Espírito Santo. As investigações da comissão deixaram patente que a Garra Transportadora e Locação, Logística de Veículos preenche todos os requisitos de uma típica empresa de fachada. A “empresa laranja” instalada em solo capixaba, segundo o relatório da CPI, foi a terceira em movimentações financeiras provenientes da Delta: R$ 23,507 milhões dos R$ 173 milhões registrados em transações feitas pela empresa carioca.



Até ai tudo bem. Faltou, porém, a CPI identificar quem foram os beneficiados pelo esquema de lavagem de dinheiro da Garra e outras empresas que funcionara, como lavanderia da Delta. O relator da comissão, deputado Odair Cunha (PT-MG), chegou a sugerir que as investigações fossem aprofundadas. Falou-se até em prorrogar a CPI por mais seis meses para se chegar ao fio da meada. Mesmo porque, não adianta levantar as somas movimentadas e as “empresas laranjas” envolvidas no esquema se a investigação não apontar para onde foi o dinheiro.



Se a CPI não der nome aos bois, o trabalho vai ficar pela metade, inconcluso. Dentro da própria CPI, há muita gente interessada que essa peça do quebra-cabeça nunca seja encontrada. No relatório, o deputado relator alerta que as “empresas laranjas” teriam sido utilizadas para lavar o dinheiro da Delta Nacional no pagamento de propinas a políticos, financiamento de campanhas eleitorais e repasses para a organização criminosa encabeçada pelo bicheiro Carlinhos Cachoeira. Uma acusação grave, mas que se perderá se o trabalho não avançar.



Cunha já admitiu nos bastidores que vem sofrendo pressão para mudar as conclusões da investigação. Conforme publicado pelo jornal O Globo nesta sexta-feira (23), Cunha teria confidenciado a interlocutores que mudaria o texto do relatório final para “atender a pressão de pessoas muito acima dele e do PT”. Essas movimentações podem brecar o relatório final, como já articulam lideranças de alguns partidos que, da boca pra fora, defendem que o relatório de Cunha é “capenga”.



Na verdade, há muitos interesses em jogo envolvendo gente graúda. Vejamos o caso do Espírito Santo. O ex-governador Paulo Hartung, que abriu as portas para a Delta entrar no Estado em 2005, poderia alegar que não tinha bola de cristal quando firmou os primeiros contratos com a empresa. Afinal, como ele poderia prever, lá atrás, que a Delta se envolveria num escândalo desta monta.



Contra Paulo Hartung, porém, pesa o fato de o relatório da CPI ter identificado “empresas laranjas” ligadas a pessoas importantes do seu governo. Como o caso do engenheiro José Maria Oliveira Filho, irmão do atual sócio do ex-governador numa empresa de consultoria, o ex-secretário de Fazenda, José Teófilo de Oliveira. José Maria responde como gestor comercial da Delta Incorporação.



Essas evidências põem os contratos da Delta com o governo Hartung em suspeição, já que a empresa arrematou vários contratos com o Estado. Destaque para as obras do programa de pavimentação de estradas vicinais “Caminhos do Campo”. Somente com esses contratos a Delta faturou cerca de R$ 23 milhões. Mais grave, no caso do “Caminhos do Campo” a baixa qualidade do serviço prestado pela empreiteira deveria ter motivado o então governador a riscar a empresa do mapa do Espírito Santo, mas Hartung fez exatamente o contrário, e ampliou os contratos com a Delta.



Mesmo após ter deixado o governo, em 2010, o “bunker” montado pelo ex-governador na Cesan garantiu a manutenção dos contratos com a empresa, que passou a prestar serviços de manutenção das redes de esgoto na Grande Vitória em 2008.



Em abril deste ano, já com a CPI do Cachoeira instalada, o diretor-presidente da Cesan, Neivaldo Bragato, aliado de Hartung, não se constrangeu com o escândalo e assinou um novo aditivo com a empreiteira carioca. O ex-secretário de Saúde de Hartung e atual diretor administrativo e de Meio Ambiente da Cesan, Anselmo Tozi, reforça o “bunker” de Hartung que assegurou os contratos da empreiteira com a companhia de águas.



O esquema no Espírito Santo é só mais um em meio a tantos outros que foram instalados pela Delta País afora. Com tantas perguntas sem resposta, seria ideal que os membros da CPI prorrogassem os trabalhos de investigação da comissão para chegar aos verdadeiros articuladores dessa rede criminosa, mais uma, que espalha a corrupção como um câncer pelo País.

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