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Uma cadeira vazia

Tal como essa cadeira vazia, as palavras também balançam ao vento – mudam de sentido, ocultam e revelam significados

Uma andorinha só não faz verão, diz o vulgo, esse sábio anônimo que sabe das coisas. Como no caso das andorinhas, uma palavra só não faz sentido: é quando se unem que elas mostram seu verdadeiro significado. Uma cadeira vazia pode indicar alguém que partiu e não volta mais – significa perda. Mas pode ser alguém que foi ali e volta logo, e a cadeira vazia significa apenas a fluidez das relações humanas. Subtexto, sentido figurado. O chamado vale de lágrimas pode significar sofrimento para uns e para outros pode estar entre montanhas de risos. A cadeira vazia balança ao vento – quem a ocupava voltará ou partiu para sempre?

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Na reunião familiar desse final de ano, embora nem todos em situação presencial – o mano Zé nos surpreende com alguns achados preciosos: velhas cartas, contos e cantos. Contas, bilhetes e lembretes que ficaram esquecidos e por algum capricho do tempo sobreviveram ao inexorável latão de lixo. Entre eles, alguns singelos versos escritos por minha mãe, Elzira, bela e sensível, que nos momentos de repouso em sua cadeira de balanço na varanda, gostava de poetar. Também desenhava e cuidava das plantas em um pequeno jardim ao lado da varanda.

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A cadeira solitária: “Numa varanda sem porta de entrada, uma cadeira de balanço – balança, embalada pela brisa tão mansa que brinca com ela. Às vezes para, parecendo cansada. Mas o vento a reanima e ela se move sem descanso – de noite e de dia. Essa cadeira vazia em seu eterno vai-e-vem, parece obedecer ao comando de alguém. Talvez a mãe embalando uma criança que nunca adormece. Talvez não esteja bem. Mas a mãe não se cansa, e cada vez mais balança…” Muito tempo passou por essa varanda, mas na minha memória a cadeira de balanço ainda está lá, balançando ao comando da brisa da tarde.

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Fico pensando se talvez um descendente voltando do futuro encontre esse texto que rabisco sem pressa, e se perdeu na poeira do tempo: Uma cadeira de balanço balança sozinha ao sabor do vento. Teria a bisavó sentado ali para escrevê-la? Isso em um tempo em que ainda usavam computadores! Muito antes disso, essa distante ascendente já batucava numa velha Remington outros textos que se perderam no balanço do tempo. Usava-se então uma fita que sujava as mãos e o papel, e às vezes também uma folha de carbono para guardar uma cópia. Que também sujava as mãos e o papel, e nada guardavam. Como era mesmo o nome dela?

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Tal como essa cadeira vazia, as palavras também balançam ao vento – mudam de sentido, se adaptam, ocultam e revelam significados e duplos sentidos, ao sabor da inconstância humana. Nessa cadeira hoje vazia, a mãe que embalava um filho doente também contou histórias, cantou cantigas de ninar, ensinou como se comunicar com o anjo da guarda. Já idosa, a mãe se sentava nessa cadeira para elaborar seus versos, e os netos vinham perturbar seu sossego e pentear seus longos cabelos. Deixa a avó em paz, crianças! A mãe pedia, e ela sorria: Deixe as crianças, filha. Talvez no futuro elas se sentem nessa cadeira e se lembrem de mim.

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