Cinco vereadores já assinam PL para revogar lei que proíbe a pesca em Vitória
A revogação da Lei nº 9.077/2017, que proíbe a pesca artesanal em Vitória, é uma das soluções para cessar a criminalização da profissão imposta pela gestão de Luciano Rezende (Cidadania) e continuada por Lorenzo Pazolini (Republicanos), que chegou a ser vaiado durante a procissão marítima em homenagem a São Pedro, no último domingo (2), quando os pescadores artesanais em massa se recusaram a colocar os barcos no mar, diante da impossibilidade de trabalhar.
Sob a atual gestão, a criminalização se intensificou, principalmente a partir do dia 6 de junho, quando uma operação conjunta de fiscalização deflagrou uma verdadeira perseguição aos pescadores, que estão, desde então, com os barcos parados nos píeres, sem trabalhar, e muitos já passando necessidades para sustentar suas famílias.
A proposta de revogar a Lei 9077/2017 foi discutida durante a audiência pública realizada na Câmara Municipal nessa terça-feira (4) e protocolada em forma de projeto de lei (PL) pelo vereador André Brandino (PSC). Até a tarde desta sexta-feira (7), mais quatro parlamentares já haviam assinado o PL como coautores: o presidente da Casa, Leandro Piquet (Republicanos), Aloísio Varejão (PSB), Dalto Neves (PDT) e Maurício Leite (Cidadania).
Durante a audiência e em uma reunião anterior a ela, dias antes, outros vereadores também manifestaram apoio de seus mandatos à luta dos pescadores para retomarem o direito de trabalhar e garantir o sustento de suas famílias e a conservação de um ofício tradicional na cidade, intimamente relacionado à identidade cultural capixaba.
Apoio que tem outras possibilidades de se materializar, conforme discutido na audiência, como alteração de partes da Lei 9.077/2017, especialmente em dois pontos: adequando a área de exclusão para pesca do camarão em acordo com a legislação federal do Instituto Brasileiro de Meio Ambiente e Recursos Naturais Renováveis (Ibama); e permitindo a prática da pesca assistida, conforme consta em minuta de normativa legal já apresentada pelo Comitê Estadual de Gestão Compartilhada para o Desenvolvimento Sustentável da Pesca (Compesca).
Independentemente do caminho legal que for encontrado para reverter a criminalização e garantir a proteção ambiental marinha, a busca de uma solução para a pauta socioambiental já recebeu apoio robusto de André Moreira (Psol), Karla Coser (PT) e Vinicius Simões (Cidadania), por meio de falas consistentes criticando o autoritarismo da Lei 9077/2017 e a injustiça imposta há seis anos por ela aos pescadores artesanais. A petista inclusive estuda a proposição formal de uma série de medidas visando resolver o conflito, como formações para os pescadores e criação de uma Gerência de Pesca Artesanal na prefeitura e a anistia das multas e devoluções dos apetrechos de pesca apreendidos durante a fiscalização conjunta.
Também já se manifestaram sensíveis à causa outros vereadores, como Anderson Goggi (PP), Chico Hosken (Podemos) e Luiz Paulo Amorim (Cidadania), presidente da Comissão de Meio Ambiente da Câmara, que presidiu a audiência do dia 4 de julho.
O próprio Luiz Emanuel, autor da lei questionada quando vereador na legislatura anterior, assinou o convite para a audiência pública desta semana e se manifestou publicamente favorável aos pescadores após reunião no dia 21 de junho, mas não compareceu à audiência e criticou, no dia seguinte ao debate, a explicação feita pelo presidente da Comissão de Cidadania e Advocacia Popular da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB-ES), Gustavo Minervino, sobre a inconstitucionalidade da Lei 9077/2017.
Inconstitucionalidade
A avaliação da inconstitucionalidade também consta no PL protocolado por André Brandino, que afirma em vários momentos os conflitos com a Carta Magna brasileira, inclusive citando posicionamentos do Supremo Tribunal Federal (STF) em situações afins e também o parecer técnico opinativo nº 171/2019, emitido pela Procuradoria da Câmara de Vereadores, este, tratando especificamente da contradição da lei com a Constituição Federal.
"A Lei 9077/2017 (...) parece ultrapassar a competência do município. Insta ressaltar que a Comunidade Pesqueira não foi consultada, nem tão pouco ouvida à época da construção da Lei 9077/2017, diálogo esse que seria de suma importância para que o equilíbrio da lei fosse posto para o meio ambiente e os pescadores (...) Ao proibir a prática da pesca, a lei municipal mencionada restringiu de modo desproporcional a liberdade profissional dos pescadores que desenvolvem suas atividades, afrontando, assim, a liberdade de exercício profissional e o princípio do devido processo legal substancial, conforme artigos 5º, incisos XIII e LIV da Constituição Federal (...)", afirmam dois trechos da justificativa do PL.
"Nota-se que a Lei nº 9.077/2017 estabelece proibição desproporcional da utilização das baias e canais mencionados, retirando-lhes uma de suas finalidades precípuas, algo que, conforme demonstrado, não se apresenta de modo devidamente justificado pelo suposto objetivo de preservação do meio ambiente" ", afirma outro trecho, destacando a necessidade de justiça socioambiental.
Justiça socioambiental
O PL "busca um equilíbrio entre o meio ambiente e os direitos sociais", assinala o vereador nas justificativas, propondo também que sejam realizadas ações de "educação, conscientização e parcerias com órgãos públicos ou privados, unindo inclusive as demais esferas e também o governo e a União, para que assim possamos crescer com sustentabilidade, respeitando tanto o meio ambiente quanto as tradições e o sustento das comunidades de pescadores".
Formações, ressalta, que não indicam que esses trabalhadores sejam inimigos da conservação ambiental, ao contrário: "a intenção não é descartar a importância do meio ambiente em favor de uma pesca indiscriminada, prática que vale ressaltar, não está enraizada na cultura dos pescadores de Vitória (...) O que se defende aqui é o retorno ao equilíbrio entre a preservação ambiental e a prática da pesca artesanal, uma tradição secular que está profundamente imbricada na cultura do povo capixaba".
Pescadores artesanais ecoam grito por justiça em audiência histórica da Câmara
São Pedro abençoa: pescadores se ausentam da procissão como forma de luta
Campanha arrecada doações para famílias de pescadores mais necessitados
Proteção do meio ambiente não pode ameaçar existência dos povos tradicionais
'Os navios têm mais direitos que nós?', questionam pescadores de Vitória
Veja mais notícias sobre Meio Ambiente.
Comentários: