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Parque Atlântico, na Praia de Camburi, é maquiagem verde da Vale

Um acordo ilegal que determina a construção de uma estrutura milionária, como tentativa de mascarar a poluição ambiental que persiste há meio século. Essa é a realidade sobre o Parque Atlântico, que a Vale está construído no extremo norte da Praia de Camburi, na Capital, em atendimento ao Termo de Compromisso Ambiental (TCA) homologado pela Justiça Federal em 21 de setembro de 2017.

As obras – no valor de R$ 14 milhões – são um clássico exemplo de greenwashing: estratégia, executada principalmente por grandes empresas, de promover ações de responsabilidade socioambiental que mascaram problemas sérios que não são resolvidos – neste caso, a retirada do Passivo Ambiental da Vale e a interrupção do despejo de outros poluentes, no ar, na areia e nas águas, que persiste há meio século.

E o próprio TCA também pode ser considerado greenwashing, pois é um tipo de acordo que, historicamente, não tem surtido resultado na redução da poluição que assola a Grande Vitória e já foram contestados pela população em um abaixo-assinado com mais de 500 nomes.

Foto: Leonardo Sá

O TCA do Passivo Ambiental de Camburi, especificamente, ainda é ilegal, como foi denunciado na Justiça Federal no final do mês de agosto, por meio de uma ação civil pública impetrada pela ONG Juntos SOS ES Ambiental. Na ação, a entidade requer a nulidade do Termo, por ele ter sido elaborado sem a anuência do Conselho Municipal de Defesa do Meio Ambiente de Vitória (Comdema).

Segundo a Prefeitura de Vitória, a obra está sendo erguida numa área que hoje já abriga o campo de futebol Zé da Bola e uma pista de bicicross. Para receber o parque, será feita uma ampliação dessa área de lazer, que passará a contar com playgrounds, deques, mirante de contemplação, espaço para musculação e ginástica funcional, um Pracão (área destinada ao lazer e atividades de cães) e locais livres com árvores, pergolados, jardins e bancos. O parque terá uma área total de mais de 19 mil metros quadrados e será entregue à comunidade em dezembro de 2018.

'Presente de grego'

“A Vale afirma que é um presente pra cidade, mas é a Prefeitura que irá administrar, que vai ter gastos pra manter funcionando. Seria muito melhor investir em reflorestamento e despoluição da praia. Se tiver água limpa com praia limpa, a população já teria uma área de lazer natural, não precisaria construir nenhum parque”, observa o administrador Jovan Augusto, morador de Jardim Camburi, que reclama também do bloqueio da visão da praia com os tapumes. “A gente não sabe por quanto tempo isso vai ficar lá”, pergunta.

A Vale só faz oba-oba”, acusa Paulo Pedrosa, da Associação dos Amigos da Praia de Camburi (AAPC). “Deveria gastar com coisas efetivas, como retirar o passivo ambiental, eliminar a poluição atmosférica dentro do mar, retirar os resíduos sólidos industriais, como barcaça, coletes, ferramentas, capacetes, luvas, que estão poluindo a praia. Deveria fazer coisas que são efetivas pra humanidade, pra população. Esse parque não agrega nada nem pro meio ambiente nem pra humanidade”, reclama.

O cirurgião-dentista aposentado Sebastião Coutinho, é da mesma opinião. Também membro da AAPC, ela lembra que a despoluição da praia é o lema da associação. E conta um aspecto lamentável que verificou em ações de educação ambiental que já desenvolveu em Camburi com crianças, seus pais e mãe. “Encontrei muita dificuldade com muitos pais, que, por serem funcionários da Vale, não apoiavam os nossos atos reivindicando a despoluição, por medo de serem repreendidos”, lamenta. “A Vale costuma sim tapar o sol com a peneira”, opina.

A professora Ivna Langsdorff Santana também desenvolve ações de educação ambiental com seus alunos e conta como foi impactante observar a sujeira deixada pela Vale ao longo da Praia de Camburi e, principalmente, no trecho embaixo da Ponta de Tubarão, no extremo norte de Camburi, já próximo ao porto. “Encontramos muito foco de contaminação de minério e lixo, incluindo casco de navios, ferragens. É um descaso da Vale, deveria ser investido realmente em despoluição ambiental. A situação está muito crítica. É muito chocante”, descreve.

'Pão e circo'

A funcionária pública estadual Zelita Viana Gonsalves também reivindica uma melhor destinação do dinheiro gasto com as obras do Parque Atlântico. “Um parque, uma área de lazer, ou a construção de outro tipo qualquer de equipamento de lazer será sempre bem-vindo.  Porém, denotaria mais seriedade, sinceridade e respeito com a sociedade, se a Vale, uma das maiores mineradoras do mundo, despoluísse já a praia e modernizasse sua planta industrial. Dá muita tristeza e frustração ver o prejuízo causado pela Vale, seja no ar, no mar ou na terra.  E a construção de um parque não atenua muito essa dívida da empresa com a sociedade” afirma.

Foto: Leonardo Sá

“É um cala-boca, né?”, classifica o químico Wallace Mendes. “Tipo pão e circo”, complementa. “A população vai ter mais uma atração perto de casa, o pessoal que joga futebol, vai gostar, e assim a Vale mascara a problemática real, que deveria receber investimentos reais”, protesta.

E conta sobre uma lamentável atuação do Instituto Estadual de Meio Ambiente e Recursos Hídricos (Iema) durante reunião com membros da sociedade civil e a Vale. Questionada sobre a poluição provocada pela mineradora, o representante do Iema disse que “o problema do esgoto era mais importante do que o pó preto da Vale”, conta.

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