Sexta, 26 Abril 2024

???Eu saí do cartório já programando a campanha e eles comemorando???

???Eu saí do cartório já programando a campanha e eles comemorando???

Rogério Medeiros e Renata Oliveira



 

“Se fiz descobertas valiosas, foi mais por ter paciência do que qualquer outro talento”

Isaac Newton



  Fotos: Gustavo Louzado

Uma das maiores surpresas da eleição deste ano aconteceu no município de Viana. O vereador em primeiro mandato Gilson Daniel (PV) venceu a disputa contra a deputada estadual e ex-prefeita Solange Lube (PMDB), quebrando a hegemonia do grupo dela na prefeitura.



Formado em Finanças e disputando uma eleição com uma coligação pequena, Daniel venceu o forte palanque de Lube, que contava com o apoio, entre outras lideranças, do ex-governador Paulo Hartung (PMDB).



Em entrevista a Século Diário, o prefeito eleito conta os bastidores da disputa e também sobre os desafios que o esperam à frente do município a partir do dia 1º de janeiro e das movimentações iniciais para conseguir inserir Viana no contexto da Região Metropolitana. Com uma estratégia baseada em seus conhecimentos de finanças, quer reduzir custos, atender às necessidades básicas da população e garantir investimentos.



Gilson Daniel fala ainda sobre os apoios políticos, a busca de parcerias para garantir sua administração e o relacionamento com a Câmara de Vereadores.





Século Diário – O senhor é vereador do município e tinha chances de se reeleger, mas preferiu disputar a eleição majoritária contra um palanque forte, da ex-prefeita Solange Lube (PMDB), que era tida como franca favorita ao cargo. O que fez com que mudasse seu caminho, disputando a prefeitura?



Gilson Daniel – A disputa foi dentro do contexto do querer. Acho que todo vereador almeja ser prefeito da cidade. Eu tenho experiência em gestão pública, assessorando vários prefeitos, e isso me motivou a disputar o pleito, pois gostaria de ajudar a cidade em que eu moro. Mas achei que isso iria demorar um pouco mais de tempo. Olhava o horizonte político da minha cidade e via que havia muitas pessoas ainda na minha frente para disputar a eleição majoritária. Mas o que aconteceu na cidade, foi que Solange conseguiu retirar as outras candidaturas. Ela seria candidata única se não tivesse havido a minha candidatura. Eu sempre falava isso, que se Solange fosse candidata e não tivessem candidatos, eu estaria disposto a disputar com ela. O desejo do Partido Verde era construir uma candidatura de oposição. E o nosso candidato de oposição era o ex-prefeito João Batista Novaes [PR]. Até porque tínhamos uma coligação proporcional interessante para o PV. Mas quando Dr. João viu que Solange estava tirando todos os partidos, e que ficaríamos isolados, ele foi desanimando. Ficou PR, PDT e PV, e os maiores grupos políticos estavam do lado de Solange. 



– E o senhor seria candidato à reeleição...



– A última reunião foi até na minha casa e perguntamos se ele tinha disposição de disputar. Dr. João disse que teria que ouvir umas pessoas ainda, diante da dificuldade. E decidimos que se ele abrisse mão da candidatura, eu seria o candidato com Faustão [José dos Santos da Silva, do PDT] de vice, mas na minha cabeça, eu era candidato a vereador. No outro dia, o dia da homologação, quando deu 16 horas, nós estávamos com as atas prontas para registrar as candidaturas, eu como candidato a vereador, não conseguimos falar com João, então alteramos as atas e aí chegamos ao cartório faltando 15 minutos para acabar o prazo. Quando protocolamos encontramos no cartório o grupo de Solange. Chegamos com oito pessoas e eles tinham umas 80. Eles esperavam que o João Batista fosse candidato e não Gilson Daniel. O interesse de Solange era que o PV não fizesse nem vereador. O PV foi o único partido com o qual ela não conversou.



– Porque o PV fez oposição a ela na Câmara...



– Sim, porque o Fabrício [Machado], que é o presidente do partido, votou contra as contas dela lá atrás. Já havia esses atritos e também porque Solange sabia que era nosso interesse fazer uma candidatura de oposição. Acreditamos que a mudança era necessária. Então, eles saíram do cartório comemorando, e eu sou um vereador. Foi uma total falta de respeito.



– Esse clima de já ganhou havia contaminado o período pré-eleitoral em Viana, embora eleição com dois candidatos seja sempre uma incógnita. Houve um salto alto?



– Houve. Eu saí do cartório já programando a campanha do outro dia e eles saíram comemorando a eleição e esqueceram de fazer campanha. Fomos para a rua mesmo. Tudo nosso foi primeiro, nosso material foi para a rua primeiro, nossas placas. Solange disse que não iria caminhar, que iria fazer grandes reuniões nos bairros, e eu e Faustão caminhando rua por rua. Depois de 30 dias é que Solange acordou. Fizemos uma pesquisa no início, com seis dias de campanha, Solange apareceu com 40% das intenções de votos e eu com 29%. Uma diferença de 11 pontos. Eu, vereador, mas ainda desconhecido em muitos bairros, nos maiores colégios eleitorais dos municípios. Solange tinha 34% de rejeição e minha rejeição também era alta, com 29%. Então, pedi para fazer um teste de rejeição. A rejeição da Solange era irreversível, era o eleitor que não queria mais votar na família. E a minha rejeição era por desconhecimento. A minha rejeição era reversível. Aí eu mudei a rejeição indo para a rua. Na sede a minha rejeição era imensa. Eu fiz uma grande caminhada, e três dias depois minha rejeição praticamente desapareceu.



– E como ficou o apoio do senador Magno Malta (PR) em sua campanha? Do outro lado, no palanque da ex-prefeita, havia várias lideranças de peso, como o ex-governador Paulo Hartung e o senador Ricardo Ferraço (PMDB), e no seu palanque a única liderança de peso era o senador.



– Nós fomos sozinhos até pouco mais da metade da campanha. Nesse período já estávamos à frente da Solange. Quando passaram 50 dias de campanha, já estávamos com 12 pontos à frente de Solange, porque caminhávamos de manhã, à tarde e fazíamos reunião à noite. Fazíamos três comunidades por dia e uma campanha muito barulhenta, com trio elétrico, que chamou a atenção das pessoas, que vieram me conhecer, saber quem era o adversário de Solange. Ela reunia essas lideranças e não atraia tanta gente. Paulo Hartung foi quatro vezes a Viana, levando deputados estaduais e federais e não conseguia juntar gente do município. Nós tivemos apoio político depois dessa etapa. O Magno esteve na campanha e eu agradeço muito a ele, levou o prestígio político, ele é muito bom na baixa renda, entra bem. Mas naquele momento já estávamos ganhando a eleição. Ele sabia disso.



– Mas para o grande público a impressão era de que Solange continuava na frente.



– Não saía pesquisa de Viana.  A Futura fez umas dez pesquisas em Viana, mas não saía porque estávamos na frente. Toda semana estavam na rua diagnosticando onde Solange estava bem e onde estava precisando caminhar. Mas não saía pesquisa de Viana.



– Porque havia o interesse de criar esse cenário artificial de que Solange estaria na frente.



– Isso. Só depois que saiu a pesquisa Visão/Século Diário [encomendada e publicada pelo jornal Século Diário] é que a realidade apareceu. Quando me passaram as informações, eu disse que os números eram o reflexo das ruas, porque eu não conseguia achar os votos da Solange. Havia esse sentimento de mudança, e também quando as pessoas conheciam meu currículo, eu mostrava que estava preparado para administrar a cidade.



– A sua vitória em Viana é colocada na cota da onda de mudança que imperou nessa eleição. Mas é também um novo, não inédito, como aconteceu em outros municípios, já que o senhor tem um mandato de vereador. O senhor acredita que foi apenas esse embalo do discurso de mudança ou houve outros fatores que contribuíram para a sua vitória?



– Eu acredito que foram vários fatores que influenciaram na nossa vitória. A questão do novo; a questão do vice da prefeita Ângela Sias [PMDB], que veio a ser o mesmo de Solange; a questão da gestão do mandato da Ângela Sias não ter sido bom; a questão de Solange ser deputada estadual e largar um mandato na metade, o que o pai [Nonô Lube] já tinha feito no passado e não deu certo, isso também influenciou. Também tiveram outros fatores, como o  nosso trabalho de rua, conversar com o morador, fazer uma campanha  humilde, mas com muita energia. O fato de ser vereador também me ajudou. Eu tive o apoio dos agentes de saúde, que estavam comigo. Imagine 200 agentes de saúde, na casa das pessoas, fazendo campanha. Minha capacitação técnica, de ser consultor de outros prefeitos, ser servidor da Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes). A pesquisa ter ido para a rua na hora certa; a entrada das lideranças na minha campanha na hora certa, enfim, foram vários fatores que me ajudaram a vencer a eleição.



– Mas o sentimento de mudança também estava na população de Viana, não é?



–  Eu acredito que o sentimento da população é de ter uma administração diferente da que está lá hoje. Eles queriam achar uma pessoa. E eu falo isso desde o início do meu mandato de vereador. A cidade de Viana precisa de uma alternância de poder. Para a cidade crescer, pensar algo novo, tem que haver a alternância, se não acontece o que está acontecendo hoje. A folha de pagamento compromete 54% do orçamento, porque é muito tempo, as pessoas estão lá há muito tempo, não tem como tirar. Então, é preciso a mudança para você pensar em algo novo, na melhoria da infraestrutura, na geração de emprego e renda, uma nova relação política com os deputados, com o governo. Porque Solange todo mundo conhece, mas com um nome novo, como será essa relação? Eu não tenho dificuldade com nenhuma liderança seja em nível municipal, estadual ou federal. Nem com a Solange. Ela acabou de destinar R$ 600 mil para Viana, me chamou para conversar sobre a emenda. Já estive com o governador Renato Casagrande. Acho que isso vai beneficiar a cidade. Essa história de Gilson é candidato do Magno, não existe isso. Tenho boa relação com todos os deputados estaduais, federais, senadores. O que existe é uma relação com o Magno que aconteceu na eleição, não conhecia ele.



– Isso porque o PR estava na sua coligação?



– Isso. Gilson não é o candidato de Fulano. Gilson é candidato do Gilson.



– O senhor vai administrar uma cidade com muitos problemas, que já esteve mergulhada em denúncias de corrupção, que está na Grande Vitória, mas é tida como uma prima pobre da Grande Vitória. E agora existe um ingrediente a mais que são as perdas de recursos federais já para o próximo ano. Como o senhor se prepara para a administrar Viana a partir do dia 1º de janeiro?



– São muitos desafios. Vamos falar primeiro das finanças. Nós sabemos que vamos perder os recursos do Fundap [Fundo de Desenvolvimento das Atividades Portuárias] e dos royalties, mas eu sou formado em finanças e conheço bem finanças públicas. Viana não é pobre. Viana tem um orçamento de R$ 171 milhões. Temos que tirar esse rótulo de que Viana é uma cidade pobre, o que temos de fazer é integrar Viana à Região Metropolitana, e é o que estamos fazendo desde já, conversando com os meios de comunicação, com os demais prefeitos eleitos. É necessário que Viana seja integrada à região  e nós vamos fazer isso. Viana é a bola da vez, é o município que mais vai crescer na Grande Vitória. Nós temos duas rodovias federais que cortam a cidade, rodovias estaduais, ferrovia, gasoduto, dois rios, Furnas, o metro quadrado mais barato da Grande Vitória. Vamos fazer uma política de atração de empresas para a cidade, oferecendo emprego e renda para os moradores. Vamos copiar e trazer políticas boas que acontecem em outros municípios, pela experiência que tenho. Estou com muita disposição e energia para administrar a cidade.



– Quais são os maiores desafios?



– Temos muitos problemas na cidade. Temos localidades em estado de calamidade pública. Nesse momento de transição, estou visitando os equipamentos públicos e eu não consegui encontrar um equipamento público que esteja funcionando em condições de atender à população. Vou em unidade de saúde que a parede está caindo, está insalubre para os médicos trabalharem. Tem uma escola chamada Tancredo Neves, que tem 1.300 alunos e está destruída, não tem condições de atender nem a 10 alunos. É um desafio para a nós a saúde da cidade porque temos apenas um PA funcionando precariamente, temos unidades de saúde sem médicos. E esse é o desafio que vamos atender, essa questão da saúde. Hoje um preso com tuberculose é atendido no mesmo local que os demais pacientes. O presídio tomou conta do aparelho público de Viana. Temos que abrir um diálogo com o governo do Estado sobre isso. Nós temos o maior complexo penitenciário do Estado, inclusive, o do Xuri, que o pessoal fala que é Vila Velha, mas está em Viana. Todos os transtornos estão dentro de Viana. Vamos conversar com o governo porque Viana tem que ter uma compensação, porque muitas empresas deixam de ir para Viana por causa do presídio. O governo tem que estudar uma forma, que pode ser pelo Índice de Participação dos Municípios (IPM), melhorando o ICMS da cidade. E não só isso, um preso que tem uma pena de 20 anos, a família vai morar em Viana. Temos muitos problemas com relação a isso. Temos que fazer desse limão uma limonada. Utilizar a mão de obra do presídio, ajudando a socializar o preso.



– O orçamento é de R$ 171 milhões. E a despesa?



– É o equilíbrio. Estamos fazendo um levantamento e o município está muito endividado. São dívidas fundadas de longo prazo e isso atravanca a cidade. Temos uma dívida gigantesca com o Instituto de Previdência, com INSS, com Pasep [Programa de Formação do Patrimônio do Servidor Público]. Eu vi uma entrevista da prefeita dizendo que vai deixar a cidade no azul, quero ver. Eu vou ficar muito feliz se ela conseguir fazer isso, mas vai ter que fazer mágica. O município deve ter de R$ 10 a R$ 12 milhões de dívida pública corrente para pagar. Se ela parar tudo hoje, não conseguirá arrecadar o dinheiro que precisa para pagar as dívidas até dezembro. Então ela vai ter que deixar alguma coisa sem pagar, porque não tem como. E outra: eu deixei R$ 10 milhões de dinheiro e R$ 10 milhões de dívidas...





– Então não deixou dinheiro...



– Aí você tem de um lado dívidas, e muitas delas são dívidas de tesouro, de recurso próprio, e nós temos dinheiro que são vinculados. Por exemplo, vou pegar o município com R$ 1,8 milhão para construir o Centro Tratamento de Tóxicos (CTT). Eu tenho R$ 1,8 milhão na conta, posso pagar dívida do INSS? Tem o equilíbrio, mas o dinheiro em caixa não paga as dívidas. Esse equilíbrio vai ser de fontes alternativas, por exemplo, tem o recurso do governo do Estado para pavimentar ruas, para construção de creches. É um dinheiro que não está na conta, que está vinculado.



– E há também os gastos permanentes...



– Vamos reduzir custeio. Eu sou contador e vou levar uma equipe de contadores, especialistas em custo, e vamos ser o primeiro município do Estado a fazer um controle de custo muito forte para ter condição de reduzir custeio e ter capacidade de investimento. Só vamos ter condições de investir na cidade se reduzirmos o custo. Tenho que reduzir custo de folha, tenho que reduzir custo da máquina, acabar com esse monte de aluguel que a prefeitura tem. A ideia é reduzir sem comprometer os serviços essenciais, mas para garantir a capacidade de investimento.



– Prefeito, como será sua relação com a Câmara, já que a maioria dos vereadores foi eleita no outro grupo?



– Mas eu sou vereador e sei conviver com os vereadores e hoje 90% da Câmara são de aliados. Até porque, como o vereador vai ficar contra 20 mil eleitores? Como um vereador que quer o desenvolvimento da cidade vai ficar contra o governo? A minha relação com os 11 vereadores eleitos na Câmara de Viana é de muita tranquilidade. Eles querem fazer um bom mandato e se o prefeito faz um bom mandato, automaticamente, o vereador também faz. O período eleitoral já passou e agora o objetivo é governar a cidade. Até porque vamos fazer um governo participativo, com a população podendo opinar sobre suas necessidades. Nossa intenção não é fazer orçamento participativo, é levar um novo modelo, porque esse modelo está desgastado, o morador pede a obra e ela não é executada.



– Ninguém mais acredita no Orçamento Participativo.



– É um novo modelo que estamos criando, de gestão participativa. Vamos para as comunidades ouvir a demanda da sociedade e em cima disso captar recursos para resolver. Aquilo que for pequeno, vamos resolver de imediato. Hoje as pessoas vão para o Orçamento Participativo, mas a intenção é fazer a canalização de um córrego, fazer uma coisa pequena, mas lá no Orçamento Participativo ele é levado a escolher uma obra maior e aquele serviço, que é pequeno, que é da área dele, ele não consegue pedir porque não vai ter voto. No nosso modelo, a pessoa vai ter condição de fazer essas obras pequenas. Aí vamos bairro a bairro, fazendo um relatório, e em cima disso saber o que podemos resolver de imediato, o que vamos precisar captar recursos e o que não cabe mesmo ao município executar, mas posso pedir a ajuda de um deputado estadual, um deputado federal. Quem sabe da realidade da comunidade é quem mora nela.



– Como vai lidar com os adversários, porque o município está acostumado com aquelas lideranças...



– Eu não tenho adversários políticos. Solange foi minha adversária, foi minha adversária na eleição, mas eu não tenho nenhum problema com a Solange. Tanto é que apoiei ela para deputada estadual. Não tenho nenhum problema de relacionamento, sou muito jeitoso com isso. Eu lutei na eleição, agora eu não estou pensando mais em política, estou pensando no município. O senador, o deputado estadual ou federal que quiser ajudar a cidade, a porta está reaberta. Eu ganhei a eleição sem fazer compromisso. Tenho uma situação com o Magno, porque foi lá, me ajudou, mas estar comprometido... meu compromisso é com os 66 mil eleitores de Viana.

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