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???Ninguém nunca viu a presidente no supermercado, mas a gente está sempre ali???

Rogério Medeiros e Renata Oliveira
Fotos: Leonardo Sá / Porã
 
Eleito em 2012 com 60% dos votos no município de Baixo Guandu, Neto Barros foi o primeiro prefeito do PCdoB no Espírito Santo. Com a proximidade da eleição do próximo ano, ele faz um balanço positivo de sua gestão, mas não mostra muita empolgação com a disputa à reeleição em 2016, embora a impressão seja de que o pleito seja mais fácil do que o anterior.
 
Em entrevista a Século Diário, o prefeito fala sobre os avanços de sua gestão e a atração de empreendimentos e melhorias na qualidade de vida da população. Fala, ainda, sobre o pleito do próximo ano e a tendência de não haver novidades no horizonte para a disputa. Além disso, ele prevê uma diminuição do número de candidaturas.
 
Para Neto Barros, este cenário se deve à desconfiança do eleitor em relação à classe política, o que tem afastado as novas lideranças do debate político. Ele fala ainda sobre o cenário majoritário, em que o eleitor terá também pouca novidade no pleito.                                                                     

 
Século Diário – Com dois anos e meio de governo, como é uma liderança que vem do PCdoB ser prefeito de um município extremamente conservador? 
 
Neto Barros – É desafiador. Se eu for aplicar a ideologia, já é complicado por si só no Brasil, mas tem que diferenciar as coisas. Uma coisa é ser do Partido Comunista, outra é ser prefeito de uma cidade em uma realidade posta. 
 
– E um país cada vez mais conservador. As manifestações de domingo mostraram isso, com pessoas pedindo a intervenção militar…

 

– Mas eu achei muito baixa a participação. Isso é sinal de que quem votou na Dilma está tranquilo em casa, e quem não votou está revoltado e foi para a rua. 

– Em relação a março, sim…

 

– Ali tinham pessoas reacionárias, mas também tinham pessoas da massa, que estão revoltadas com o aumento da energia, com as mudanças nas regras do seguro desemprego. Mas achei  muito baixa, é o Brasil. Então, não dá para colocar em prática a ideologia. 

 

– Até porque foi eleito em um processo democrático, não tomou o poder de assalto, não é? Em um cargo majoritário fica difícil fazer isso…

 

– Difícil não, é impossível, porque você tem que jogar o jogo. Mas por outro lado, a visão social, de respeito às classes mais baixas da população, aí sim, fica fácil. Por exemplo, as carências que Baixo Guandu tinha quando eu assumi diminuíram bastante.

 

– Que tipo de carências?

– A pavimentação de ruas dos bairros mais carentes, eu fiz em dois anos e meio quase 50% do que precisava. Isso é muita coisa. Tem bairro lá que tinha 50,60 anos que esperava alguma benfeitoria, pavimentação, drenagem. Temos uma média de mais de uma obra por mês e não é tampa de bueiro, como eu vejo por aí. Minhas obras são creches, praças, pavimentação de um bairro inteiro. Em 32 meses, 44 obras concluídas. 

 

– E como conseguir recursos, já que estamos falando de um município do interior?

 

– Estamos na contramão da crise. Além das obras, tivemos melhorias nos serviços prestados à população na educação, saúde… tem coisa que melhora muito e tem coisa que melhora pouco. Na saúde, por exemplo, tínhamos um transporte sanitário muito ruim, de baixa qualidade, que vinha para Vitória. Hoje temos ônibus novos, com lanche. Mas temos o Sistema Único de Saúde (SUS), que tem participação dos três entes federados e todos deixam a desejar, porque há muita confusão sobre o que é responsabilidade de cada um. Deveria ser mais especificado. A Lei Geral do SUS é que divide a bola. Quem faz a triagem é o município, mas quem faz o agendamento é o Estado. Então, temos dificuldades nesta área, mesmo assim, conseguimos aporte financeiro. Na área de educação, melhoramos muito a merenda e a base de concursados hoje é maior do que a de contratados. A base da pirâmide da prefeitura é de concursados.

– Isso melhorou o serviço prestado?

– Sim, em todas as áreas. Fizemos ainda, a partir de 2013, a revisão geral da remuneração dos servidores, com a correção de 8,5% em 2013, 6,5% em 2014, e 5,5% este ano. Também acertamos o cronograma de pagamento, que foi uma novidade no município. Outra coisa importante é que as gratificações não passam mais pelo crivo do prefeito, é automático. Então, essas mudanças gerenciais também trouxeram uma movimentação na economia local. Guandu aumentou em 92% o número de empregos formais, nesses dois anos e meio. Acho que nenhum município tem essa média. Aumentamos 25% o número de empreendimentos. Até eu entrar eram duas mil em 78 anos e, hoje co 80 anos, temos 2,5 mil empresas. No último semestre, o Estado perdeu quase 15 mil postos de trabalho, nesta crise, o setor que mais desempregou foi o de confecções. Mais uma vez estamos na contramão, porque estamos levando para lá a PW Brasil, que vai ser a maior empresa de confecção do Estado.

 

– Então a questão da crise está ligada à dinâmica da gestão para dar suporte ao desenvolvimento?

– Cada município tem uma realidade. A realidade do meu município talvez se some à questão da energia acumulada. Eu disputei a eleição em 2000 para vereador, depois em 2002 para deputado. Em 2004 disputei novamente para vereador e fui o mais bem votado do município, depois em 2006 para deputado. Em 2008 disputei para prefeito, em 2010 para deputado, e em 2012 para prefeito. São sete eleições e aí, como é uma cidade média, com 31 mil habitantes, e eu faço campanha de rua, casa por casa, praticamente conheço todo mundo. Quando cheguei à prefeitura, já tinha na cabeça o que a população precisava, só distribui o que eu ouvia. Claro que eu tenho uma equipe competente, pessoas que me ajudam, e a gente tem tido o foco no desenvolvimento social e econômico. As coisas têm dado certo, apesar da crise, apesar de agora estarmos enfrentando certa dificuldade com o governo do Estado, por causa das paralisações de convênios e diminuição no número de exames. Tínhamos 500 exames por mês na área da saúde e agora temos 50.

 

– E como está a interlocução com o governo do Estado? 

 

– Ainda está muito ruim. Só através dos secretários. 

 

– Essa é uma questão com Baixo Guandu ou de outros prefeitos? 

– Não sei, mas muitos prefeitos estão reclamando. Nem todos conseguiram ainda agenda com o governador [Paulo Hartung, PMDB] Eu tinha uma agenda com ele, através do deputado Da Vitória [PDT], mas eu tive que ir à China na mesma data e perdi a agenda. Estou esperando. Acho que vai ter uma desaceleração dos recursos até 2017 para a próxima leva de prefeitos. Tomara que não. 

 

– Muitos prefeitos têm demonstrado desempenhos ruins com a população, o que indica problemas para a disputa do próximo ano. O prefeito está no primeiro mandato, podendo disputar a reeleição no ano que vem. Como vê a sua realidade no município para eleição 2016?

– A minha realidade política é a seguinte: eu tenho índices claros nas mãos. Se reeleição pressupõe continuidade e eu tenho os melhores índices da história da cidade, então vou para a reeleição pensando nisso. Vai ser debatido o projeto de governo atualizado. Aquelas carências que eu tinha em 2012, para ganhar as eleições, eu estou dando conta da maioria delas. No ano que vem haverá um novo projeto de governo, com as novas carências, que terão que ser resolvidas nos próximos quatro anos. Mas tudo isso tem sido feito com muita tranquilidade. Antes eu tinha muita vontade  de ser prefeito e não tinha nada para mostrar. Hoje eu tenho tudo para mostrar e não tenho muita vontade de ser prefeito. 

 

– Por quê?

– Porque não está mais prazeroso participar da atividade política. Você quase não tem mais pessoas de bem na política. A grande maioria dos políticos é desonesta mesmo e isso afasta a população de bem. Quando tem uma notícia negativa sobre a política na televisão, isso afasta pessoas de bem e atrai pessoas do mal que querem estar no lugar do outro.

 

– Essas constantes notícias sobre corrupção em nível nacional afetam a imagem dos gestores municipais? Afetam quem está no município e não tem nada a ver com a história? 

 

– Afeta muito. A gente tem proximidade com o eleitor. Ninguém nunca viu a presidente no supermercado, mas a gente está sempre ali, vai às ruas, fazer compras, vai comprar um jornal, vai à igreja, e tem essa realidade na lata. Eu tenho parentes que já foram políticos também, meu pai foi prefeito, meu tio foi deputado federal, e a gente conversa. Há 30 anos,  as pessoas já tinham asco da política, hoje além do asco tem também o desrespeito. Isso está muito presente, em todos os âmbitos, parece que deu uma amortecida no respeito, em todas coisas. E aí fica difícil, porque a gente acaba pagando o preço dos maus.

 

– O município de Baixo Guandu não é pequeno, tem muita extensão territorial, voltado para a pecuária, mas há empresas indo para o município.

– Baixo Guandu tem uma peculiaridade: é o município que menos chove no Estado. Temos o menor índice pluviométrico. Isso, claro, reflete na agricultura, talvez por isso, a maior facilidade seja para a pecuária.  Por outro lado, desde menino ouvi dizer que o poder público deveria levar emprego na iniciativa privada para a sociedade e estamos conseguindo. Eu ganhei a eleição, com um projeto claro, que pela primeira vez foi protocolizado em cartório, e como fruto dessa energia acumulada nesses encontros que eu tenho há mais de 10 anos, tínhamos aquele planejamento para a industrialização. 

 
– Quais as indústrias que tinham na cidade? 
 
– Olarias, um curtume, que tem 70 funcionários, e o resto só empresas pequenas: uma serralheria, marcenaria, sapataria. Agora está indo a primeira grande indústria, que é a maior do Estado, a mais moderna do Brasil, que vai geral cerca de 600 a 700 empregos, 350 nas obras e de 160 até 300 na operação. Vai ser uma virada de página na economia, porque vai incentivar a vinda de outras empresas para o município. Foi o que aconteceu em Colatina, que é um polo nacionalmente conhecido de confecção. Cerca de 180 empresas saíram de dentro desta que estou levando para lá, que é a PW Brasil. Acho que daqui a cinco e 10 anos vamos ser conhecidos nacionalmente também, e aí a nossa economia deslancha. Os empresários conversam, trocam informações, e vão querer saber por que os outros foram para Baixo Guandu e vão saber que lá tem uma administração desenvolvimentista, acho que isso vai levar a uma situação de pleno emprego na cidade.  
 
 – Voltando à questão política. Como observa o cenário de disputa eleitoral para o próximo ano no município?

 

– Acho que vai faltar candidato, bons candidatos. Infelizmente, são sempre os mesmos. Quais as novidades que vamos ter para o ano que vem tanto na Capital quanto no interior? São praticamente os mesmos. 

 

– Tem o seu grupo, o grupo do deputado Dary Pagung (PRP), e mais quem?

 

– Do ex-prefeito Lastênio Cardoso, do PMDB, mas que está com dificuldade porque saiu muito desgastado da prefeitura e rompeu com o deputado Dary

 

Dary Pagung pode disputar?

– Pode disputar, não sei se quer. Tirando isso, qual a novidade que vamos ter? Nenhuma.

 

– E quanto à disputa pela Câmara de Vereadores?

– Vamos ter a repetição do que acontece em todo o País. A pessoa não tem status para ser outra coisa, vai ser vereador. Poucos são aqueles que pensam em começar como vereador para ganhar uma experiência e depois buscar outro espaço. A maioria está lá porque não tem voto para ser prefeito. A verdade é essa. Alguns têm uma associação, é uma liderança regionalizada, mas não sai daquilo ali. 

 

– Como é sua relação com a Câmara?

 

– É boa, na medida do possível. Nós elegemos a maioria, troquei alguns pelos outros, porque no percurso do caminho, a pessoa vai pedindo muita coisa e você acaba não cedendo, e ela passa a ser da oposição. Aí você tem que ganhar outro. É do jogo democrático. 

 

– As forças políticas do município já começam a se reunir para conversar? 

 

– Eu me reúno constantemente nas comunidades. Mas eu sinto uma dificuldade muito grande em atrair novos valores para a política. O número de candidatos a vereador, por exemplo, vai ser muito menor do que o da eleição passada. Não sei se essa é uma realidade só nossa lá, mas vai ser menor. 

 

– Tudo isso é fruto de tudo o que está acontecendo em nível nacional…

 

– Tudo vem disso. Não tem uma empolgação com a política mais. Nem eu, que estou fazendo muita coisa, não estou mais empolgado. A empolgação que tinha de ser prefeito não tenho mais, passou. Já não é uma novidade para mim. Estou pela obrigação. Se eu achasse alguém para continuar o trabalho, alguém sério, de bem, eu aceitaria conversar para apoiar. Até para não ter o carreirismo. Aquela coisa do político profissional. Eu sou advogado, então não tenho nenhuma obrigação de ser prefeito para alcançar um sonho. Eu já cumpri o meu papel, e cumpri bem. 

 

– E o PCdoB no Estado? Como vê as movimentações do partido para o próximo ano?

 

– O PCdoB é um partido pequeno. Era menor. Agora eu fui o primeiro prefeito, elegemos 12 vereadores na eleição passada, houve um salto de qualidade. O vereador da Capital, Namy Chequer, é o presidente da Câmara. Então, é também um salto de qualidade. O partido tem todas as dificuldades dos pequenos partidos, com um item a mais: é um partido comunista. A falta de conhecimento da população e a despolitização leva a alguns fenômenos engraçados, por exemplo, temos vários partidos que seguem a linha socialista. O PSB, em sua origem, hoje não; o PPS, que veio do Partidão e hoje está na direita. Temos outros partidos, tidos como mais radicais que PCdoB aí, como o PSTU, o PCO, e outros. Até mesmo o PT, que tem uma miscelânea de ideologias, tem uma ala mais radical à esquerda. Alguns partidos da base do governo de Lula e Dilma conseguiram crescer muito mais do que o PCdoB. O PDT, o PSB são exemplos de partidos que cresceram com o governo federal do PT, mas o PCdoB, como carrega no nome o comunismo, fica prejudicado. É aquela marca registrada, pregada na mídia durante a ditadura militar, de que tudo que era ruim era comunista. Isso pegou. Hoje tem gente que nasceu ontem e é anticomunista sem saber por quê. Então, tem essa dificuldade, mas hoje temos senadores, deputados federais, o governador do Maranhão, o primeiro governador comunista do País, e representatividade em Assembleias Legislativas e Câmaras de Vereadores de todo o País. O partido cresceu. 

 

– Mas essa dificuldade do rótulo comunista para uma eleição municipal, e de interior, continua bem forte, não é?

 

– Sim. Eu tive algumas coisas a meu favor. Sou filho de prefeito e isso dá uma amenizada. “Ah! É o Neto, vi nascer, peguei no colo. Ele é filiado ao Partido Comunista, mas eu conheço”. Isso deu uma amenizada, mas a propaganda anticomunista correu solta. Os jornais de oposição lá publicavam na capa o Livro Negro do Comunismo e eu indo para a rua. Foi uma campanha duríssima. Quando você olha o resultado, 60% dos votos, não imagina, mas foi uma eleição muito difícil. Os fazendeiros se juntaram para financiar campanha contra mim. Eu disputei contra um ex-juiz, que mandou 20 anos, disputei contra a máquina pública. Mas eu consegui fazer uma eleição bonita do ponto de vista popular. O pessoal ia de bicicleta para os encontros nas ruas, as carreatas. Foi um movimento muito bonito, não sei se consigo repetir. 

 

– Mas, aparentemente, a eleição do próximo ano será mais fácil, não?

 

– Não sei se mais fácil. Ela vai ser menos concorrida. Eleição nunca é fácil, porque ela muda toda hora. Mas acho que menos concorrida pelo desinteresse da classe política e da população. Não está mais fácil você contaminar alguém com a positividade que a eleição requer. É difícil fazer política. Você convencer a pessoa a votar em você é uma coisa, agora fazer a pessoa andar com você para cima e para baixo e ainda ouvir todas aquelas coisas, pela falta de politização, não. É difícil conseguir aquele batalhão de voluntários para fazer campanha. É claro que tem aquele que está lá por interesse porque quer algo depois. Tem o eleitor também que dá o voto querendo algo depois, aí você não dá o que ele quer, que é o emprego imediato ou outra coisa. Mas quem pensar o voto no social, na coletividade, o ganho que a comunidade teve, aí sim, vai ser uma eleição tranquila. 

 

– E pode ser uma eleição dura?

 

– Eu consegui fazer uma ruptura daquela velha política da porradaria, da violência, para uma coisa mais no campo das ideias. A política pegava fogo em Baixo Guandu. Eram dois lados se matando. Hoje está mais tranquilo. Tem eleitores que hoje votam em mim e me defendem, que votaram contra a minha família há 30 anos. Aos pouquinhos temos quebrado isso com trabalho, conversa. Eu tenho conversado até com o DEM lá. Eu tenho discutido a cidade. Nunca foi tão debatida a cidade, com planejamento, meta, pesquisa de opinião. Estamos  no rumo certo e a cidade crescendo. Se eu tivesse feito tudo que eu falei e não tivesse substância para mostrar, seria em vão. Conseguimos levar o Sesc para lá, que é um aparelho que só tem em cidades grandes. A Cacau Show está também indo para o município. É um empresário de Resplendor (MG), que está indo para Guandu. Por isso é que estamos conseguindo agregar ainda, porque em muitos lugares por aí, o barco já afundou.

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