Rogério Medeiros e Nerter Samora
Depois de muitos arranjos nos bastidores, a campanha eleitoral para o governo do Estado foi para as ruas. Neste fim de semana,o governador Renato Casagrande (PSB) foi para a região norte, enquanto o seu principal adversário, o ex-governador Paulo Hartung (PMDB), rumou para o sul. Entre apertos de mão, abraços e fotos ao lado dos eleitores, uma pergunta toma conta dos observadores políticos: quem vai decidir a eleição, a rua ou tapetão? O Papo de Repórter analisa os primeiros movimentos da corrida ao Palácio Anchieta e traça um diagnóstico sobre a disputa.
Nerter: A campanha parece que começou para valer neste fim de semana. Depois de muitas armações, principalmente essa que o ex-governador Paulo Hartung fez antes de ir para rua – o que ocorreu nesse fim de semana –, passando a impressão de que estava tudo resolvido antes do início. Mas informações dão conta que Casagrande passou esse sábado (26) em São Mateus e o povo foi para a rua. O que mostra que essa eleição vai dar uma esquentada. Enquanto isso o Paulo foi para o sul, mas ele é menos efusivo neste movimento corpo a corpo com o eleitorado. Ele sempre muito arredio com as ruas.
Rogério: Olha, a sua percepção é absolutamente correta. Ele cria essa sensação de jogo ganho e o que parece é que o Renato quer atraí-lo para a rua para ver quem se dá melhor. E o Renato também não está brincando com a situação, pelo menos com essa situação de quem chega melhor na rua e que vai fazer da rua palanque. Ele também não deixou por menos, deu boas cutucadas no Paulo Hartung, principalmente na questão da Segurança Pública, fazendo uma comparação do que o Paulo não fez e ele fez, como a reposição do efetivo das policias e a criação de um programa de combate à violência: o Estado Presente.
Nerter: E o Paulo vai para esse confronto? Eu mesmo sempre entendi como um político de fórmulas, de gabinete. Ele quer ganhar a eleição na aparência de que ele é o imbatível e não precisa ir para a rua. Enquanto o Renato sempre teve facilidade com esse contato mais próximo com o eleitor…
Rogério: Olha, mas tem o seguinte: isso não fica por aí, porque as armações que o Paulo fez, a relação que tem com o Tribunal Regional Eleitoral (TRE) já começa a surtir efeitos. A pesquisa do Instituto Futura, manipulada por sinal, dá essa ideia de vitória. Aquela pose do Paulo como libertador do Espírito Santo tem seus efeitos, até porque o Casagrande contribuiu muito para construí-la. Eu quero dizer, em síntese, a coisa não fica por aí, somente na rua, muito embora essa mesma rua seja o reflexo do candidato. A central de boatos do Paulo funciona com uma força impressionante, aliás, central essa que deve ter feito bodas de prata… Eu quero ver se o Renato tem coragem de colocar os podres do Paulo para fora. Como nós sabemos, não é pouca coisa.
Nerter: O problema do Paulo é como ele vai manter esta ideia de que a eleição está ganha. A imprensa corporativa está toda com ele. Ele alimentou com verbas nos seus oito anos e a mamata continua com o Casagrande também. Mas quem sempre distribuiu o dinheiro das campanhas foi o Paulo. Na eleição de Renato para o governo, ele que colocou dinheiro. Da mesma forma como na campanha do Ricardo Ferraço, dos deputados estaduais. Tudo saindo dos cofres das transnacionais, os famigerados grandes projetos, que se fartam com os incentivos fiscais do Estado. São bilhões e bilhões que entram – ou deixam – de sair do caixa dessas empresas. Depois vem a paga.
Rogério: Vamos pousar na economia do Espírito Santo, é bom fazer esse pouso. A economia capixaba é de especulação: Fundap, as empresas que tem origem no café que não deixa de ser especulação… A rigor, aqui não tem indústria, aqui é base industrial – que não pode ser entendida na essência da palavra porque são semielaborados. Aqui o grande negócio está exatamente nos deferimentos fiscais. Agora mesmo o jornal Valor mostrou que a Aracruz Celulose, que veste hoje uma roupagem nova de Fibria para não ser identificada pelos crimes cometidos de toda ordem (financeira, ambiental, da posse da terra de índios e quilombolas). O Valor mostrou que os preços caíram, a produção diminuiu e o lucro hoje veio dos créditos fiscais. As empresas vêm para cá, usam esses créditos à vontade, como é o caso da Votorantim, para empregar nas empresas dela país afora. A empresa no Espírito Santo não precisa produzir nada. É o paraíso dos exploradores. Neste momento, a situação ficou tão evidente que vai ficar complicada para aparecer dando dinheiro em caixa dois. Esse é o empresariado daqui e que está aqui, é a famosa elite capixaba. Agora tem muita gente de olhos neles…
Nerter: Tanta gente de olho, gerou certa intimidação dessas empresas em fornecer dinheiro para campanha neste primeiro momento. Já que elas acabaram se tornando reféns de um mecanismo, a nota fiscal. Mas olhando para o nosso atual momento. Eles são tão criativos, que depois do Fundap, eles tiraram da cartola o Sincades (Sindicato das Empresas do Comércio Exterior e Atacadista do Estado). O setor atacadista que era acanhado, acabou se tornando o principal filão de negócios, tanto que até a Suzano – que só opera na produção de celulose – virou no Espírito Santo uma empresa atacadista.
Rogério: Ora, um atacadista que sempre pagou 12% de ICMS, agora paga 1% e fica com 11%. O Fundap está acabando, mas está todo mundo migrando para o setor atacadista. Quem não quer uma mamata dessa? Primeiro porque se trata de um diferencial de alíquota entre os estados, é só papel para meter a mão no cofre do Estado e “apanhar” os 11%. O Espírito Santo é isso, o empresariado daqui é isso, com algumas exceções, naturalmente. O Paulo é o gestor desse esquema, que o Casagrande não interrompeu…
Nerter: Esse talvez tenha sido o grande gargalo dessa pré-eleição. Na hora que eles se dividem, colocam em risco a tal unanimidade que não é política, ela vem desse área que tinha nos dois a segurança da continuidade dos seus bons negócios.
Rogério: Vamos pousar e ver como essa eleição vai acabar. O que eu vejo é o Paulo com a sua relação com o TRE, evidentemente com suas exceções, Tribunal de Justiça também com suas exceções. Ele já demonstrou que quer ganhar a eleição no tapetão. Imagina a coisa do apartamento dele, que é um escândalo, uma pessoa que compra um imóvel por R$ 48 mil e depois vende no mesmo dia por R$ 2,1 milhões. Se bem que o apartamento não valia R$ 48 mil, assim como não valia os dois milhões, vale muito mais e só você ver. Há três anos nos publicamos uma reportagem desnudando a operação e ninguém contestou. Ficou todo mundo quetinho, esperando a tormenta passar. Eles ficaram calados porque era incontestável. Agora o que aconteceu, o blog do Elimar Côrtes e o jornal ES Hoje, mal publicaram, o Paulo foi na Justiça e tirou o conteúdo do ar. Ninguém desconhece a relação do Paulo com o presidente do TRE, Álvaro Bourguignon. Eles estiveram juntos na época do Naufrágio, em Brasília, para apagar incêndio. Agora o Paulo pegou dois bons juristas – o ex procuradores da República, Henrique Herkenhoff e José Roberto Santoro. Montaram uma equipe de blindagem muito robusta para o Paulo para ganhar a eleição no tapetão.
Nerter: Como é que o Renato vai reagir a isso?
Rogério: Não sei. Outro dia eu ouvi uma coisa muito interessante sobre o Renato. Dizem que ele tem de ir para cima do Paulo com vontade. Se ele não for, vai morrer na rua apertando mãos. Achando que a rua sorri para ele e não para o Paulo. E vai se dar mal. Mas como dizia uma figura política que conversei recentemente: “É, o Renato tem de botar uma picanha no prato para virar bicho”.