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Casos de hanseníase podem aumentar na próxima década

Isolamento e redirecionamento dos trabalhadores devido à Covid-19 são algumas causas, aponta Patricia Deps

A pandemia da Covid-19 pode aumentar os casos de hanseníase na próxima década, informa Patricia Deps, dermatologista, hansenóloga, e chefe do Departamento de Medicina Social da Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes), onde também atua no Programa de Pós-Graduação em Doenças Infecciosas. A possibilidade é por causa da necessidade de isolamento social, fechamento de alguns serviços de saúde e redirecionamento dos trabalhadores da saúde, o que dificultou o diagnóstico de muitos casos, aumentando as chances de transmissão.

No Espírito Santo, por exemplo, segundo dados do Programa Estadual de Controle da Hanseníase, em 2019 foram registrados cerca de 482 novos casos, em 2018 totalizaram 467. Nesta terça-feira (3), foram divulgados dados correspondentes aos anos de 2020, 2021 e até novembro de 2022, ou seja, contemplando os três anos de crise sanitária. Em 2020 foram 325 novos casos. No ano seguinte, 326. Os números correspondentes ao ano passado foram 341, havendo um ligeiro aumento em comparação aos dois primeiros anos de pandemia, nos quais a crise sanitária estava mais agravada.

Os dados, portanto, mostram uma redução no diagnóstico de novos casos a partir da pandemia, o que, de acordo com Patrícia, pode ter relação com a mudança de rotina das pessoas e dos serviços de saúde. A dermatologista afirma que, de acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS), mundialmente houve 37% de queda nos diagnósticos durante a pandemia. No Brasil, o índice foi de cerca de 47%. “Isso é preocupante. Quer dizer que de cada 100 novos casos 37 não foram diagnosticados e as pessoas estão transmitindo a doença porque não receberam tratamento”, diz.
A hanseníase é causada pela bactéria Mycobacterium Leprae. De acordo com Patrícia, o período de incubação é de 3 a 7 anos. Portanto, pessoas que tiveram contato com infectados durante a pandemia, principalmente dentro de suas casas, em isolamento, podem vir ainda a manifestar a doença. A professora da Ufes explica que o contágio é feito por meio de contato contínuo com a pessoa infectada. A doença pode causar, por exemplo, dano neural e perda da visão, irreversíveis, incapacitando a pessoa rapidamente, de 6 a 12 meses.
Patrícia informa que a OMS doa medicamentos para países endêmicos, entre eles, o Brasil, fabricados na Índia. Entretanto, em 2020, por causa da pandemia, houve paralisação de três meses na produção, portanto, os pacientes tiveram que paralisar o tratamento nesse período, o que pode ter também vir a contribuir para acentuar a transmissão em todo o país, inclusive no Espírito Santo.
Patrícia aponta algumas iniciativas para prevenção e tratamento precoce. Uma delas é incentivar a busca ativa, ou seja, diante de um diagnóstico de hanseníase, chamar aqueles que tiveram contato contínuo com a pessoa, como familiares e colegas de trabalho para fazer os exames necessários. A dermatologista aponta que nos anos de 2020, 2021 e 2022 não houve, por parte do Ministério da Saúde, campanhas para fazer com que a população compreenda o que é a hanseníase, por exemplo, devendo ser retomadas.
Patrícia diz ainda que há poucos profissionais capacitados para lidar com questões relacionadas à doença e que é preciso educação em saúde nas escolas. O Espírito Santo, afirma, conta com profissionais capacitados, mas que precisam de mais treinamento, principalmente para se organizar para o pós-pandemia. A quantidade pequena de profissionais não é somente no Estado e, conforme explica, vem da ideia de que a doença foi erradicada, o que aconteceu em alguns países, mas não no Brasil. A crença na erradicação, destaca, surgiu após a Campanha de Eliminação da Hanseníase. “Na academia, por exemplo, paira essa ideia e não se debruça sobre isso”, lamenta.

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