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Menina estuprada pelo tio pode ser incluída em programas de proteção

Nésio Fernandes informou, em pronunciamento, abertura de sindicância para apurar vazamento de informações sobre a criança

O secretário estadual de Saúde, Nésio Fernandes, informou em pronunciamento nas redes sociais nesta segunda-feira (17), que a menina de 10 anos de São Mateus, norte do Estado, que interrompeu gravidez fruto de estupro do próprio tio, poderá ser incluída em programas de proteção para pessoas que sofreram violência e estão em risco por conta de ameaças, garantindo “seu desenvolvimento como pessoa humana, livre de mais violências”. 

Nésio destacou que a Sesa acompanha o quadro da menina, que realizou o procedimento de interrupção da gravidez em Pernambuco, nesta segunda, e prepara as condições para seu retorno ao Espírito Santo após a reestabilização. 

O secretário garantiu, ainda, que houve sigilo por parte da secretaria em relação às informações sobre a criança, inclusive a respeito do seu destino após negativa de ser atendida no Hospital Universitário Cassiano Antônio de Moraes (Hucam). Entretanto, mesmo assim, dados sobre a menor, como nome e local de moradia, vazaram nas redes sociais por meio da bolsonarista e integrante do Movimento Pró Vida, Sara Giromini, exigindo, portanto, uma abertura de sindicância para apurar o ocorrido. 

O vazamento das informações causou tumulto em frente ao Centro Integrado de Saúde (Cisam), em Pernambuco, onde a menina foi fazer o procedimento para interrupção da gestação. Grupos contrários ao aborto, como os de igrejas católicas e evangélicas, chegaram a tentar invadir o local, sendo impedidos pelos seguranças e por grupos favoráveis à interrupção da gravidez, entre eles, o Fórum de Mulheres de Pernambuco. 
Para a integrante do Fórum de Mulheres do Espírito Santo (Fomes), Edna Martins, a fala do secretário sobre a possibilidade de inclusão da menina em programas de proteção mostra que as vidas da criança e da avó, que cria a neta, estão ameaçadas devido ao vazamento das informações. Edna destaca que grupos fundamentalistas religiosos que estavam em frente ao hospital chamavam a menina e sua responsável de “assassinas”. 


‘Não tem preparo’

No pronunciamento desta segunda, a superintendente do Hucam, Rita Checon, afirmou ao lado de Nésio Fernandes, que o Hucam não fugiu a sua responsabilidade diante da decisão judicial que determinou a interrupção da gravidez. Ela justificou que o hospital não interrompeu a gestação por “não ter capacidade técnica para fazer o procedimento”. A interrupção, segundo Rita, deveria seguir outro protocolo para o qual “o Hucam não tem preparo”.
A superintendente disse, ainda, que o Hucam segue uma nota técnica do Ministério da Saúde para abortamento humanizado que estabelece uma idade gestacional entre 20 e 22 semanas e peso fetal de até 500 gramas para interrupção da gravidez. Entretanto, afirma, após a menina passar por avaliação médica e ser submetida a ultrassom, constatou-se que estava com 22 semanas e quatro dias de gestação, e o feto, com 575 gramas. “A decisão não teve viés religioso, ideológico ou influência externa. Tinha evidências para abortamento legal, mas não com base na nota técnica do Ministério da Saúde”, apontou.
Por isso, afirma, o hospital entrou em contato com a Secretaria Estadual de Saúde (Sesa) para encontrar alternativas. Segundo o secretário Nésio, a rede estadual de saúde nem a iniciativa privada no Espírito Santo tinham condição de fazer o procedimento, sendo então providenciada a ida para o Cisam. 

‘Mudança no discurso’

O Fórum de Mulheres, diante do pronunciamento do secretário e da superintendente, aponta que houve mudança de discurso. Segundo Edna Martins, a primeira informação foi de que a equipe técnica do Hucam não queria fazer o procedimento. “Reconhecemos que o secretário se empenhou nesse processo, sua atuação foi fundamental, mas dizer que o Hucam não tem condição de fazer o procedimento é algo que não ficou bem esclarecido”, afirma. 
Para Edna, o ocorrido com a menina trouxe a público um problema que estava invisível para a sociedade, requerendo estrutura e organização para enfrentá-lo. Ela destaca que evidenciou-se, por exemplo, dados que mostram que em oito meses 150 meninas entre 10 e 14 anos tornaram-se mães no Espírito Santo. “Isso mostra que a política pública não é eficiente, não é resolutiva”, pontua.

Investigação 
O Ministério Público Federal do Espírito Santo (MPF/ES), em ofício enviado à superintendente do hospital e ao reitor da Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes), Paulo Vargas, solicita informações a respeito de eventual vazamento do nome e endereço da criança e dados médicos sigilosos e dos respectivos responsáveis; e a respeito de eventual constrangimento, ameaça ou qualquer outro tipo de pressão a médicos ou equipe auxiliar, no sentido de não realização do procedimento.
O MPF também quer saber por que o Hucam se negou a realizar o procedimento de interrupção de gravidez mesmo após decisão judicial. Pergunta ainda se o hospital realiza procedimento de interrupção de gravidez, conforme determina a Portaria GM/MS nº 1.508/2005. O MPF/ES deu prazo até as 17 horas desta quinta-feira (20), para o recebimento da resposta do Hucam e da Ufes.
A Defensoria Pública do Estado do Espírito Santo (DPES) conseguiu, na noite desse domingo (16), uma decisão liminar para que o Google Brasil, o Facebook e Twitter retirem as informações da criança divulgadas em suas plataformas. Caso as empresas descumpram a medida, será aplicada uma multa diária de R$ 50 mil.

Segundo a defensora da Vara da Infância e Juventude de São Mateus, Daniela Machado Sesioso Borgo, a decisão serve também para postagens futuras sobre a menina. “A preservação da criança e da família é importante. E respeitar a criança para que possa retomar a vida independentemente das opiniões sobre o tema. A imagem dela precisa ser preservada”, destaca.

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