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Conta mais, Delcídio

O engenheiro eletricista Delcídio do Amaral, 61 anos recém-completados, fazia uma bela carreira técnica na área energética (Eletrobrás, Petrobras) quando derivou para a política. Sua estréia em cargos públicos foi como ministro de Minas e Energia por um semestre no final do governo Itamar Franco (1992-1994).
 
Quando o presidente Fernando Henrique Cardoso inaugurou a subestação do Gasoduto Brasil-Bolívia em Biguaçu (SC), em 2000, lá estava Delcídio como diretor de gás da Petrobras. Afável, boa pinta, era aparentemente um tucano no governo do tucano-mór.
 
De repente, com a vitória de Lula em 2002, Delcídio se converteu, aparentemente, num pintassilgo, chegando a trabalhar no governo estadual de Zeca do PT. Duas vezes tentou eleger-se governador. Por duas vezes foi eleito senador. Ultimamente era líder do governo Dilma no Senado. Preso em novembro de 2015 sob a acusação de obstruir o trabalho da Justiça, abriu o bico para reduzir sua pena.
 
Com 400 páginas, seus depoimentos dariam um livro. Sobrou acusação para todo mundo, Dilma, Aécio Neves, Lula, FHC, parlamentares e ex-ministros, mas a impressão que fica é que Delcídio não disse tudo que sabe. Se relatar tudo que viveu nos bastidores do sistema energético e na cúpula da Petrobras, prestaria um bom serviço à república. É o que lhe resta fazer, se quiser sobreviver na política com um resto de decência.
 
Pintassilgo ou tucano, Delcidio foi o primeiro senador preso no exercício do mandato por agir nos bastidores em defesa dos seus chefes – coisa que todo mundo faz em partidos, empresas, sindicatos, cooperativas, universidades e ministérios.
 
Ainda que possa ser acusado de estar na política para encher os bolsos (prática arraigada no Brasil e em outros países) – foi acusado pelo delator Nestor Cerveró de ter recebido uma polpuda propina (US$ 10 milhões) da Alstom, fornecedora da Petrobras –, Delcídio é um dos poucos brasileiros em condições de abrir o bico sobre algo esquecido pela mídia tradicional: a campanha para internacionalizar a exploração do pré-sal, riqueza que permitiu ao Brasil se tornar autossuficiente na produção de petróleo, mais de 60 anos depois da fundação da Petrobras. Aliás, parte desse plano de “abertura” já foi aprovada quase na moita no Senado, graças a projeto do senador José Serra, ex-vice-presidente da UNE que acaba de colar à sua biografia o selo de entreguista.
 
Por mais sujas que tenham sido as últimas administrações da Petrobras, o Brasil não merece que o patrimônio nacional seja oferecido às petroleiras internacionais.
 
Mesmo sendo o principal causador do efeito-estufa e das mudanças climáticas, o petróleo continua na ordem do dia como o principal insumo energético e assim continuará por mais algumas décadas. O Brasil se tornou a bola da vez na geopolítica do petróleo após descobrir o pré-sal, num lance que muita gente atribui ao pé quente de Lula.
 
A verdade é que as petroleiras internacionais nunca largaram o pé do Brasil. Perderam para Getulio Vargas em 1953 (fundação da BR), mas conseguiram marcar um gol com a abertura do monopólio pelo general-presidente Ernesto Geisel (1977) e mais outro com a privatização parcial da companhia no final do século XX sob a presidência de FHC.
 
Agora, sob a presidência de Dilma Rousseff, o Brasil abre a guarda para o avanço das petroleiras do Tio Sam & Cia. Toda essa onda em torno da corrupção na cúpula da Petrobras ajuda na orquestração global visando enfraquecer a defesa da estatal brasileira e abrir o pré-sal para a exploração privada internacional.
 
A “cooperação internacional” tornou-se uma peça da geopolítica norte-americana, visando impedir o crescimento da concorrência contra as americanas. Para alcançar seus objetivos, as instituições ianques mantêm aliados e espiões em todo o mundo. Por isso que vale a pena pedir:
 
– Fala mais, Delcídio.
 
LEMBRETE DE OCASIÃO
 
“Em breve, a Lava Jato deixará de ser estudada meramente como uma imensa operação anticorrupção para se transformar em um case sobre as estratégias geopolíticas norte-americanas na era das redes sociais e da globalização”
 
Luis Nassif, jornalista
 

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