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No império da violência

O Brasil mudou para pior desde o elogio público feito pelo então deputado federal Jair Bolsonaro ao torturador Carlos Alberto Brilhante Ustra, um de seus ídolos, na vergonhosa sessão da Câmara Federal que depôs a presidente Dilma Rousseff, em agosto de 2016, abrindo o caminho para que ele chegasse à Presidência.  

A partir de então, a história registra, entre outros retrocessos, o crescimento extremo dos níveis de insegurança em todas as áreas e, o mais grave, acentuada participação de policiais em casos de violência contra o cidadão, segundo dados do Mapa da Violência divulgado na semana passada. 

O aumento dos casos com mortes em operações policiais chega a 18%. Em contrapartida, o número de policiais mortos em ação registrou redução de 13%. Nesse contexto sombrio e assustador, as declarações do deputado Capitão Assumção, do PSL, se encaixam de forma perfeita. 

Ao tornar público da tribuna da Assembleia Legislativa a pretensão de pagar R$ 10 mil a quem matar o autor da morte de uma mulher ocorrida em Cariacica, o parlamentar abandona o papel de defensor da sociedade e assume uma  postura oposta às leis vigentes no país, incluindo o Código Penal e o Regimento Interno do Poder Legislativo.  

Demonstra, com o estranho convite, estar inteiramente inserido na onda de militarização que explodiu no golpe de 2016 e se desenvolve por meio de ações do governo central em assembleias e câmaras de vereadores, envolvendo áreas essenciais à vida do cidadão, como a da educação, por exemplo.  

Os projetos em andamento para militarizar escolas públicas, inclusive uma em Linhares, no Espírito Santo, trazendo de volta o clima da ditadura  de 1964, tudo em nome da disciplina, da moral e dos bons costumes, comprovam a afirmativa.

Um discurso que soa falso, a partir do momento em que o único meio de mudança nesse contexto é o autoritarismo, nocivo por desconhecer a aplicação correta da lei para punir violações cometidas, inclusive crimes de homicídios, por intermédio de um julgamento justo.

Nesse aspecto, quem assim procede ultrapassa doutrinas religiosas confessadas, exibindo um triste retrato da falência, do ponto de vista da sociedade, de prósperos sistemas construídos com base na Bíblia, segundo afirmam seus seguidores. Na prática, porém, eles desnudam a indumentária da misericórdia e exibem a face de lobos cruéis.  

Empunham fuzis e a Bíblia ao mesmo tempo, descontextualizados da mensagem do perdão, que deveria se adotada sem que isso funcione como impedimento à punição de infratores depois de um julgamento justo e dentro das ordenanças nas leis. 

Nesse império de autoritarismo, em vigor no Brasil, há lugar para todo tipo de violência, além da que manda matar por dinheiro, um estímulo à pistolagem, prática de milicianos, banalizados em círculos políticos. De onde surge uma competição com outros grupos socialmente colocados mais abaixo pela posse de territórios nas periferias das grandes cidades. 

Existe violência no corte de recursos financeiros para a educação, a pesquisa e outras áreas do conhecimento; há o retorno da censura, como a imposta ao filme Marighela e ao documentário sobre Chico Buarque, impedidos de serem exibidos; e ainda o preconceito, o entreguismo de riquezas nacionais, as prisões injustas, o massacre dos jovens negros, a corrupção sinalizada e exposta, inclusive na família presidencial, a estagnação da economia, a perda de direitos sociais, os retrocessos cruéis como a reforma da Previdência, o desemprego, o descalabro da fome. 

A relação é enorme e gera um cenário de banalização do mal, para lembrar a filósofa Hannah Arendt, que transforma a vida em coisa sem valor algum. A fala do Capitão Assumção não é um fato isolado e se encaixa nas várias formas de violência que tomaram conta do país. Para reflexão, vale a pena ver o excelente filme Bacurau,em cartaz nos cinemas locais, e ler A Peste, de Albert Camus, para comprovar que o vírus que incendiou a Europa em 1938/45 e o Brasil a partir de 1964 não morre, está vivo e bem ativo e só a sociedade pode dar um basta.  

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