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Censo fará mapeamento sociodemográfico de mulheres lésbicas

Advogada capixaba Renata Bravo acredita que iniciativa poderá garantir acesso às demandas urgentes do grupo nas regiões do País

Nesse domingo (29), Dia Nacional da Visibilidade Lésbica, foi lançado o Mapeamento Nacional de Lésbicas e Sapatão. O levantamento tem o intuito de coletar informações sociodemográficas de mulheres lésbicas em diversas partes do País, diminuindo o contexto de subnotificação e apagamento desse grupo social. Para ativistas e especialistas ligadas ao movimento LGBTQIA+ no Espírito Santo, a iniciativa é mais um passo em direção à construção de políticas públicas específicas para este público.

Nomeado LesboCenso, o levantamento é uma iniciativa da associação lesbofeminista Coturno de Vênus e da Liga Brasileira de Lésbicas (LBL), mas conta com o apoio de mais de 80 organizações em todo o Brasil. Por meio de um formulário online, o projeto irá coletar informações sobre autoidentificação, trabalho, educação, saúde, relacionamentos, relações familiares e redes de apoio de mulheres lésbicas de diversas regiões.

A advogada Roberta Goronsio, vice-presidente da Comissão de Gênero e Diversidade Sexual na seccional Espírito Santo da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB-ES), acredita que a iniciativa é o caminho para que se possa ter acesso às demandas urgentes das mulheres lésbicas. “Levando-se em consideração que o governo federal desmontou o ministério dos direitos humanos, que englobava a pasta de Diversidade sexual e gênero, não há fontes governamentais que nos levem até essas mulheres”, destaca.

Segundo ela, a coleta de dados que existe até então, seja com números de violência contra a mulher ou quaisquer outras informações, é subnotificada e focada nas mulheres cisgênero e héteros, que possuem demandas diferentes das mulheres lésbicas. “Com essa coleta de dados reunida pelo LesboCenso, é possível mapear onde e qual a faixa etária das lésbicas que estão sendo vítimas de feminicídio, estupro corretivo, lesbofobia [crime reconhecido pelo STF desse 2019, em analogia à Lei do Racismo], e ainda, compreender quais as demandas faltam a determinadas regiões brasileiras, como casas de acolhimento, necessidade de amparo assistencial, jurídico e psicológico”, ressalta.

Renata Bravo, também advogada e mestre em Direitos e Garantias Fundamentais, lembra que, apesar de todo tempo perdido sem um mapeamento do tipo, o censo poderá nortear políticas públicas específicas para determinadas situações. “A gente só começou a ter dados sobre o feminicídio em 2015, quando se criou a lei. Antes, os casos eram tratados como assassinatos de mulheres sem recorte específico. Só que a gente não pode pensar a mulher como uma única mulher. Temos a mulher negra, trans, lésbica, várias mulheres que precisam ser vistas”, aponta.

Ela acredita que, com o mapeamento, será possível ter um apanhado das medidas voltadas para atender este público até o momento, tendo uma análise do que foi feito, do que foi extinto e o que é necessário melhorar daqui em diante, principalmente em um contexto de apagamento da temática LGBTQIA+ por parte do governo federal. “Quando a gente pensa em política pública, não se pode tirar do achismo. É necessário contar com profissionais de diversas áreas, entendendo o que está acontecendo e que, às vezes, os dados são pequenos porque há uma subnotificação”, enfatiza.

É o que reitera a psicóloga Iasmyn Cerutti, vice-presidente do coletivo Resisto-ES, que espera que a iniciativa dê frutos nas áreas da Saúde, Cidadania e Segurança. “Não se faz políticas públicas sem dados. Dentro de uma sociedade como a nossa, hetoronormativa, violenta e patriarcal, a relação entre mulheres muitas vezes é invisibilizada. Algumas pessoas têm dificuldade até mesmo de conceber essa como uma forma de relação. Invisibilizam nossas vidas, nossas relações, nossas famílias, nossa forma de viver”, alerta.

Essa invisibilização se traduz em dados. Um levantamento da revista Gênero e Número identificou que, em 2017, em média, seis lésbicas foram estupradas por dia, de acordo com dados do Sistema de Informação de Agravos de Notificação (Sinan/Ministério da Saúde). “Fazer esse tipo de mapeamento é uma forma de dar início a um trabalho que já deveria ser feito, de nos proteger, ouvir, e pensar na especificidade de toda uma gama de indivíduos”, reforça Iasmyn.

Dossiê da violência

Em 2018, um grupo de pesquisa da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) lançou o Dossiê sobre Lesbocídio no Brasil. O levantamento reúne casos de morte de lésbicas por motivo de lesbofobia ou ódio, repulsa e discriminação, que ocorreram entre os anos de 2014 e 2017.

Segundo o dossiê, uma lésbica foi morta em 2016 no Espírito Santo e três em 2017, não havendo ocorrência em 2014 e 2015. A morte ocorrida em 2016 foi em Venda Nova do Imigrante, na região serrana. Em 2017, uma foi na Serra, na região metropolitana; e duas em Linhares, no norte, onde um casal de lésbicas foi assassinado por um vizinho que confessou que o crime foi motivado pela orientação sexual das vítimas.

Entidades como o Conselho Estadual LGBTQIA+, no entanto, apontaram para a subnotificação dos números, que pode ser provocada pela recepção dessas mulheres em espaços institucionais. Roberta Goronsio acredita que, com a nova coleta de dados, também será possível saber se os profissionais da segurança pública, como os policiais, e os profissionais de saúde estão habilitados para atender às demandas da mulher lésbica pelo Brasil a fora.

“Fato é que muitos profissionais ainda se encontram com o pensamento errôneo que entre duas mulheres não existe de fato uma relação afeto-sexual completa e, por puro preconceito, ignoram a orientação sexual da mulher lésbica, o que prejudica na investigação do problema apresentado por essa pessoa em determinado espaço público, tanto jurídico quanto de saúde, ou de assistência social”, enfatiza.

O questionário do LesboCenso já pode ser respondido e está disponível no site do projeto: https://lesbocenso.com.br/

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